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Tesla já foi sobre mudanças climáticas, carros autônomos, IA. E agora?

A mudança de prioridades pessoais de Elon Musk levanta questões sobre os rumos da montadora

Por Tim Higgins The wall street Journal
Publicado em
7 min
traduzido do inglês por investnews

[Publicado originalmente em 10 de fevereiro de 2024]

A Tesla há muito vende aos investidores a ideia de um futuro melhor. Mas hoje, qual é sua missão?

No início, a montadora de veículos elétricos, fundada há 20 anos, foi para muitos investidores e fãs a resposta às mudanças climáticas, especialmente quando Elon Musk mostrou ao mundo que um veículo com emissão zero poderia ser legal e lucrativo. Em determinado momento, ele disse que ajudar a reduzir o risco de mudanças climáticas catastróficas era o motivo pelo qual a Tesla “existe”.

À medida que o tempo passava e outros começavam a perseguir o sonho dos veículos elétricos, Musk posicionou a Tesla de modo diferente: uma porta de entrada para a inteligência artificial passar do mundo digital para o mundo físico por meio de carros autônomos e, depois, robôs humanoides. 

A Tesla, ao que parece, tinha um potencial ilimitado. 

Contudo, ultimamente, Musk parece menos envolvido com as mudanças climáticas. E no mês passado, colocou os investidores em uma situação difícil. Aquele futuro brilhante de IA de que ele fala há tanto tempo? Bem, ele não se sente confortável em fazer isso na Tesla — a menos que receba outro salário gigantesco que lhe dê mais controle. 

Tais ameaças imediatamente levantam uma questão existencial para os investidores da montadora: o que torna a empresa especial em um mundo onde Musk não vê a mudança climática como um risco de curto prazo e está vacilando em seu compromisso da Tesla com a IA?

As ações da Tesla, que já valorizaram a empresa muito além de qualquer outra montadora, caíram mais de 28% este ano até quinta-feira (7 de fevereiro), enquanto outras gigantes da tecnologia, como Microsoft e Nvidia, viram enormes ganhos alimentados pela empolgação em torno de seu trabalho com IA. 

Em janeiro, Adam Jonas, conhecido analista do Morgan Stanley, atribuiu 22% de seu preço-alvo para as ações da Tesla ao valor futuro criado por uma frota de carros autônomos de cerca de 220 mil veículos até 2030. Mas também recuou algumas de suas expectativas após o comentário de Musk sobre controle. 

“A Tesla é a única ação verdadeiramente envolvida com IA sob nossa cobertura”, disse Jonas aos investidores em nota. “Qualquer mudança de estrutura organizacional ou legal que impeça a empresa de participar do desenvolvimento de IA pode ser prejudicial para a …tese de investimento.” 

O sucesso do lançamento de um veículo elétrico (VE) lucrativo como o sedã Model 3 ajudou a tornar a Tesla a primeira montadora a ser avaliada, por um tempo, em mais de US$ 1 trilhão. Depois de anos de luta, Musk cumpriu uma de suas promessas mais ambiciosas, dando-lhe nova credibilidade para o que mais viesse pela frente.

Durante esse período de 2020, Jonas comentou que o “poder da esperança” estava ajudando a alimentar a ascensão dramática da Tesla, que desafiou as avaliações automotivas tradicionais. 

Na época, Musk já vendia o futuro da empresa como algo mais do que apenas carros elétricos. 

Em 2016, por exemplo, projetou o futuro da montadora com a tecnologia de veículos totalmente autônomos evoluindo a partir do desenvolvimento do piloto automático de assistência ao motorista. Sua meta era apresentar um carro sem motorista cruzando o país até o final de 2017. Até agora, nada. 

Em 2019, enquanto alguns investidores questionavam se o Model 3 poderia cumprir os objetivos de Musk, este realizou uma apresentação especial para os investidores para elogiar os esforços da empresa no desenvolvimento da tecnologia autônoma visando uma frota de táxis robôs até o final de 2020. Nada. 

Então, há quase um ano, Musk pediu aos investidores da Tesla que acreditassem que o futuro da empresa estava todo voltado para o desenvolvimento de software de IA para habilitar carros autônomos, já que seu volume de entregas outrora explosivo vinha dando sinais de desaceleração e era preciso recorrer a cortes de preços em uma linha mais velha.

“Acreditamos que estamos preparando as bases aqui, e que é melhor entregar um grande número de carros com uma margem menor e, posteriormente, colher essa margem no futuro com o aperfeiçoamento da autonomia”, disse Musk a investidores em abril passado, após resultados trimestrais decepcionantes.

Os investidores aparentemente acreditaram. O valor das ações mais do que dobrou no ano passado após um 2022 ruim, em parte graças às preocupações de investidores com o fato de Musk estar muito distraído com sua aquisição da plataforma de mídia social agora conhecida como X.

Logotipos das próprias empresas de Elon Musk (Madurai, Índia, maio/2022) Foto: Adobe Stock

Essas distrações só se multiplicaram à medida que ele assume posições cada vez mais controversas na rede social que preocupam os fãs da Tesla. Essa questão voltou à tona no mês passado, quando alguns fiéis seguidores, incluindo um apoiador chamado Chuck, pediram que ele mostrasse mais moderação. 

“Chuck trabalha sob a ilusão de que a civilização ocidental não está em risco, quando claramente está. Se os EUA caírem, nada mais importa, nem ações, nem propriedades, nada”, respondeu Musk. “Todas as civilizações acabam caindo, como mostra a história, mas queremos que esta dure o máximo de tempo possível.”

Este era o tipo de paixão que Musk trouxe para a missão da Tesla. 

“A mudança climática é a maior ameaça que a humanidade enfrenta neste século, exceto pela IA”, disse Musk a um jornalista em 2017. “Continuo dizendo isso às pessoas. Odeio ser Cassandra aqui, mas é tudo diversão e brincadeira até que alguém acaba seriamente ferido.”

Atualmente, o tom de Musk mudou. Ele tem criticado valores corporativos como ESG (governança ambiental, social e corporativa), que visam incentivar investimentos nos tipos de metas que antes promovia. “ESG é o diabo”, disse Musk.

Além disso, parece estar se distanciando de parte do movimento verde que o abraçou anos atrás. Em um evento público em dezembro, ele descreveu o alarme sobre as mudanças climáticas como “um pouco exagerado no curto prazo” e pediu uma abordagem pragmática para reduzir o carbono nas “próximas décadas”. 

“Aspectos do movimento ambientalista estão fazendo as pessoas perderem a esperança no futuro”, disse Musk. “Então, o que quero dizer é que devemos ter esperança no futuro. Devemos estar entusiasmados com o futuro e devemos construir o futuro que queremos.”

Esse futuro, segundo Musk, envolve robôs humanoides, apelidados de Optimus, que ele diz que a Tesla está desenvolvendo com a tecnologia de seus carros autônomos. 

“O Optimus, obviamente, é um produto muito novo, mas extremamente revolucionário e é algo que acho que tem o potencial de exceder em muito o valor de todo o resto na Tesla combinado”, afirmou Musk a analistas em janeiro. 

“Acho que”, acrescentou, “temos uma boa chance de vender algumas unidades do Optimus no ano que vem”.

Escreva para Tim Higgins at [email protected]

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