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Por que a eficiência energética não é a solução perfeita para diminuir as emissões de carbono

Dados históricos mostram que o aumento da eficiência energética andou de mãos dadas com o aumento do consumo de energia

Por Carey King The wall street Journal
Publicado em
5 min
traduzido do inglês por investnews

Carey King (@CareyWKing) é cientista pesquisador e diretor assistente do Instituto de Energia da Universidade do Texas, em Austin. Ele escreveu “The Economic Superorganism: Beyond the Competing Narratives on Energy, Policy, and Growth”.

Muitos governos veem a eficiência energética como uma estratégia-chave para a descarbonização da economia. De fato, sob o acordo climático de Paris, alguns cenários assumem que a eficiência pode reduzir as emissões em até 40%.

Para os formuladores de políticas, a suposição é clara: melhorar a eficiência reduzirá o consumo de energia, o que, por sua vez, reduz as emissões de gases de efeito estufa. E muitas organizações proeminentes apoiam essa suposição.

Porém, é possível que as estratégias que dependam fortemente da eficiência energética para reduzir as emissões sejam apostas ruins. Dados históricos mostram que o aumento da eficiência energética andou de mãos dadas com o aumento do consumo de energia no longo prazo, e não com a diminuição. Por isso, eu diria que qualquer abordagem de descarbonização que não leve isso em consideração corre o risco de dar errado.

O paradoxo

A ideia de que mais eficiência pode gerar mais consumo em vez de menos é conhecida como Paradoxo de Jevons. Batizado em homenagem ao economista britânico William Stanley Jevons — que descreveu o dilema, em seu livro de 1865 “The Coal Question” —, o paradoxo desafia a crença intuitiva de que os ganhos de eficiência levam automaticamente à economia de energia.

Os críticos que descartam a ideia de Jevons geralmente se concentram no comportamento do consumidor. Por exemplo, é difícil imaginar que um motorista dirigiria 50% mais quilômetros se comprasse um carro que gasta 50% menos combustível por quilômetro. Eles podem dirigir um pouco mais, mas não seria o suficiente para fazer a diferença.

Contudo, quando você analisa a economia global, vê que a indústria reage de maneira muito diferente ao aumento da eficiência. Empresas mais eficientes geram maiores lucros, o que leva a mais investimento, mais produção e, crucialmente, maior consumo de energia para apoiar a ampliação da produção de alimentos e da população. A eficiência torna economicamente viável extrair e consumir recursos energéticos mais difíceis de alcançar, como o petróleo da fratura hidráulica ou o vento de áreas onde venta pouco, o que alimenta a produção de mais máquinas, veículos e processos industriais.

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Considere estas duas perguntas:

Primeira: desenvolvemos continuamente máquinas e processos mais eficientes em termos de energia? A resposta é sim.

Segunda: o consumo global de energia continuou a aumentar junto com esse aumento na eficiência? Novamente, a resposta é sim, inequivocamente nos últimos dois séculos.

Esses dois pontos geralmente ajudam os céticos a entender o paradoxo. Embora a eficiência não seja a única impulsionadora do crescimento econômico, ela tem um papel significativo.

Suposição imperfeita

O verdadeiro desafio surge quando a eficiência energética é a única proposta apresentada como uma solução climática para toda a economia. Quando os formuladores de políticas usam a eficiência como pedra fundamental da política ambiental sem reconhecer seu impacto econômico mais amplo, eles constroem suas estratégias com base em suposições imperfeitas.

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Felizmente, pesquisas recentes estão começando a avaliar adequadamente a relação entre energia, eficiência e crescimento. Estudos mostram que “efeitos rebote em toda a economia” podem corroer mais da metade da economia de energia prevista com melhorias de eficiência, prejudicando sua eficácia como estratégia de mitigação climática. Minha própria pesquisa mostra que leva cerca de seis anos, em média, para que as melhorias na eficiência energética levem a um maior consumo geral de energia. Além disso, um crescente corpo de trabalho sugere que a “produtividade” econômica pode ser explicada em grande parte por ganhos na eficiência energética.

Então, qual é a lição para os formuladores de políticas?

Se o crescimento é o objetivo e você deseja estimulá-lo, continue promovendo o investimento em eficiência energética sem outras políticas para restringir os lucros e o investimento. Mas se o objetivo é equilibrar o crescimento com menores emissões de gases de efeito estufa, você precisa direcionar os investimentos para tecnologias de pouca emissão e para longe de tecnologias alta emissão, penalizando as emissões. Afinal, uma razão para os governos incentivarem a captura e armazenamento de carbono em usinas de combustíveis fósseis é que o processo químico de captura indefinida de CO2 direciona parte da energia para longe da geração de eletricidade, reduzindo assim a eficiência.  

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A eficiência energética é uma tática valiosa para melhorar o bem-estar, expandindo o acesso aos serviços de energia. No entanto, devemos enfrentar suas consequências não intencionais. Ao não levarmos em conta o efeito rebote, corremos o risco de “nos surpreendermos” com o fato de que a eficiência acaba gerando mais emissões. As conclusões de Jevons, com mais de 150 anos, ainda são válidas hoje. É hora de incorporá-las em estratégias climáticas que reduzam genuinamente as emissões — antes que outros 150 anos passem.

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traduzido do inglês por investnews