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Relatórios de sustentabilidade precisam ser detalhados contra desconfiança

Segundo estudo da BR Rating em da Grant Thornton, há inconsistências nos relatórios de sustentabilidade das companhias que prestam contas.

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A constatação de que apenas 44% das empresas de capital aberto do Brasil divulgam anualmente seus Relatórios de Sustentabilidade é impactante por mostrar que ainda há um longo caminho a ser percorrido para que nossas corporações sejam geridas verdadeiramente dentro dos conceitos ESG (Ambiental, Social e Governança). Afinal, mais da metade, 56%, nem ao menos formulam relatórios, indício de que não se preocupam com o tema. Os dados são referentes a um estudo feito pela BR Rating em parceria com a Grant Thornton e divulgado no final de maio.

O problema é que, segundo o estudo, mesmo no grupo dos 44% que prestam contas de suas iniciativas sustentáveis, há muitas inconsistências que reduzem a confiabilidade do material apresentado. Por exemplo, do total de relatórios publicados, apenas 31% apresentam os temas materiais e, desse percentual, somente 8% informam as metas relacionadas ao tema. Ora, uma política de gestão baseada nos conceitos ESG precisa, necessariamente, ter metas a serem alcançadas.

E mesmo que o desempenho não tenha sido o desejado, a divulgação tem de ser feita com transparência para que acionistas, possíveis investidores e a sociedade como um todo possam mensurar o esforço da companhia e até mesmo contribuir com ideias e sugestões para que os objetivos sejam alcançados. Não dá para ser sustentável sem ser transparente. Uma coisa está ligada a outra. E só com informações claras é possível desenvolver métricas consistentes para análise e acompanhamento dos projetos envolvidos.

Sem um objetivo claro sobre onde se quer chegar, as ações divulgadas dão a impressão de estarem mais próximas do discurso do que da prática para os stakeholders. Antes de continuar, é importante deixar claro que a pesquisa citada não teve como objetivo avaliar o comprometimento das empresas com as práticas ESG em si. A ideia era saber qual percentual de companhias realmente faz a divulgação anual para o mercado e qual o grau de detalhamento das informações.

E é justamente o grau de detalhamento que preocupa porque, como já dito, não se trata apenas de mais da metade simplesmente não divulgar nada. Quem divulga também o faz de forma incompleta, colocando em risco a credibilidade do material apresentado. Há outro ponto que merece destaque. Apenas 8% dos relatórios são auditados por entidade independente.

A exigência de relatórios bem detalhados, com temas materiais e metas devidamente apresentados e divulgados após serem auditados não é mero preciosismo. É a forma de o mercado se certificar de que o material não é fruto de greenwhashing, prática bastante comum, infelizmente, para passar uma imagem positiva da empresa para a sociedade.

Greenwashing é um termo em inglês que significa “lavagem verde” ou “banho verde”. É empregado para designar falsos discursos sobre sustentabilidade ou ações que agridem o meio ambiente ou a sociedade e são maquiadas para parecerem sustentáveis

Para ficar mais fácil entender, na sociedade existem grupos que trabalham pela inclusão de minorias no quadro de funcionários das empresas em geral, incluindo cargos de gestão. Para se mostrarem alinhadas a esses anseios algumas companhias podem incluir em seus relatórios metas fictícias somente para agradar o público-alvo. Mas isso não significa que elas verdadeiramente se esforcem para atingir o objetivo traçado.

Na verdade, a diversidade é um discurso que tem ficado também só no papel, como demonstra levantamento feito pela BR Rating em 2021. Os dados mostram que apenas 3,5% das empresas brasileiras têm mulheres atuando como CEOs. Então, quando corporações dizem se preocupar com está e com qualquer outra questão ESG vale ficar atento às decisões que ela toma para saber se há coerência entre discurso e prática.

Então, cobrar relatórios mais bem elaborados não é nenhum exagero. A existência de metas é essencial para que haja uma gestão efetivamente voltada para as práticas ESG. E elas não precisam ser mirabolantes, principalmente para quem está no início da implantação do modelo ESG. O que se recomenda é que a adoção da meta seja feita somente após uma consideração cuidadosa do benefício de longo prazo para a estratégia corporativa, sempre com transparência. E quando o relatório de sustentabilidade for divulgado, que ele seja completo e represente a realidade sem deixar margem para desconfianças.

*Marcos Rodrigues é co-fundador da BR Rating e da MRD Consulting

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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