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‘A Arte de Pensar Claramente’: um livro sobre as armadilhas do pensamento

Rolf Dobelli explica nesta obra como tomar decisões de forma eficaz.

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O livro que recomendo nesta semana é A arte de pensar claramente – como evitar as armadilhas do pensamento e tomar decisões de forma eficaz, de Rolf Dobelli, que fiz a leitura e anotações há quase 4 anos e que moldura o contexto atual.

Creio que as ideias abordadas no livro estão muito adequadas para o período da longa pandemia que vivemos provocadas pela covid-19 e suas perversas mutações e variantes que nos acometem. E, mais do que nunca, medidas são necessárias para conter a inconsciência das pessoas sobre contaminação pelo vírus. 

Diz o autor, neste livro, que “falsas armadilhas do pensamento levam as pessoas a tomarem atitudes de insensatez que prejudicam o bem comum”. Aí, faço uma breve parada e lembro-me de reflexões oportunas que nos traz o historiador israelense Yuval Harari, em artigo recente publicado no Financial Times, onde coloca as seguintes perguntas:

Por exemplo, ao decidir se devemos impor um bloqueio, não é suficiente perguntar: “Quantas pessoas ficarão doentes com covid-19 se não impormos o bloqueio?”. Devemos também perguntar: “Quantas pessoas sofrerão de depressão se impusermos um bloqueio? Quantas pessoas sofrerão de má nutrição? Quantos vão faltar à escola ou perder o emprego? Quantos serão espancados ou assassinados por seus cônjuges?”.

O autor lembra que trafegam pela nossa mente uma quantidade enorme de pensamentos todos os dias, que dificultam a nossa compreensão do que é mais importante e muitas vezes nos imobilizam na tomada de decisões que quebram as regras da racionalidade. 

Cuidado com excesso de intuição 

Para Rolf Dobelli, costumamos escolher intuitivamente e depois justificar nossas escolhas. “Muitas decisões (carreira, cônjuge, investimentos) acontecem em nível subconsciente. Uma fração de segundo depois, construímos uma razão para que tenhamos a sensação de que foi uma escolha consciente”, pontua.

A mente intuitiva é ágil, espontânea e consome pouca energia. O pensamento racional é lento, exigente e grande consumidor de energia neuronal. Lembra o autor, que desde que começou a coletar erros cognitivos, costumam perguntá-lo como consegue viver uma vida sem erros. “A resposta é: não consigo. Na verdade, eu nem mesmo tento. Como todo mundo, tomo decisões instantâneas consultando não os meus pensamentos, mas os meus sentimentos. Na maioria das vezes, troco a pergunta: “O que penso disso?”, por “Como me sinto em relação a isso?”. Falando francamente, antecipar e evitar falácias é uma tarefa custosa”, acrescenta.

Tomar decisões é uma arte 

Em situações com consequências pouco significativas (por exemplo, Pepsi normal ou diet, água normal ou gasosa), o autor diz que esquece da otimização racional e deixa a intuição assumir o controle. “Pensar é se cansar. Assim, se o potencial de dano é pequeno, não esprema o cérebro, pois os erros não vão causar um desastre permanente. Você vai viver melhor assim. A natureza não parece se importar com a perfeição das nossas decisões, desde que consigamos nos virar ao longo da vida, e desde que estejamos prontos para ser racionais quando chegar a hora das grandes decisões.”

Descubra sua perna boa para definir seu círculo de competência 

A outra área em que Dobelli declara que a intuição assume o controle é o “círculo de competência”. Exemplificando, diz o autor, quando pratica um instrumento, você aprende as notas e diz a seus dedos como tocá-las. Com o tempo, os acordes e as cordas são internalizados. Você lê uma partitura e as suas mãos tocam as notas quase automaticamente. Warren Buffett lê balanços patrimoniais como músicos profissionais leem partituras. Esse é o círculo de competência dele, o campo que ele entende e domina intuitivamente. 

Descubra seu círculo de competência 

Descubra, então, qual é o seu círculo de competência. Tenha uma exata noção dele e vai verificar que é menor do que você pensa. “Se você tiver que tomar uma decisão séria fora do círculo, use o lento e difícil pensamento racional. Para todo o resto, dê carta branca à intuição”, discorre o autor. 

Selecionei algumas armadilhas descritas no livro como uma referência entre 100 outras para ajudar a pensar melhor nesse momento de crise pandêmica:

1. Por que você deveria visitar cemitérios

Um índice de ações não é representativo para a economia de um país. Assim como a imprensa não relata de maneira representativa a maioria dos jogadores de futebol. A enorme quantidade de livros e treinadores de sucesso também deveria deixá-lo desconfiado: afinal, fracassados não escrevem livros nem dão palestras sobre seus fracassos. Aí mora o perigo. “O viés de sobrevivência significa: como no dia a dia o sucesso produz maior visibilidade do que o fracasso, você superestima sistematicamente a perspectiva de sucesso.”

2. Estudar em Harvard deixa você mais inteligente? 

Essa é mais uma clássica armadilha da ilusão. Os nadadores profissionais têm esse corpo perfeito não porque treinam muito. É o oposto. São bons nadadores porque são feitos assim. Sua constituição física é um critério seletivo, não o resultado de suas atividades. 

Os modelos femininos fazem propaganda de produtos de beleza. Assim, muitas consumidoras pensam que os produtos as deixarão mais bonitas. Porém, não são os produtos que as fazem bonitas. Elas são bonitas. Na verdade, elas nasceram bonitas, e somente por isso são levadas em conta para fazer propaganda de produtos de beleza. 

Como no caso dos nadadores, aqui, a beleza é um critério de seleção, não um resultado. Quando se confunde critério de seleção e resultado, caímos na ilusão do corpo de nadador ou na beleza das modelos. 

Moral da história, não caia na armadilha da ilusão: onde quer que se preconize algo pelo qual valha a pena esforçar-se — músculos de aço, beleza, salário maior, vida longa, aura, felicidade —, analise bem. Antes de entrar na piscina, dê uma olhada no espelho. E seja sincero consigo mesmo.

3. Uma besteira sempre é uma besteira

A armadilha da prova social. A prova social é o mal por trás da bolha e do pânico na bolsa de valores. Encontra-se prova social na moda, em técnicas administrativas, no comportamento nas horas de lazer, na religião e nas dietas.

 A prova social pode paralisar culturas inteiras — pense em mais essa situação no suicídio coletivo em algumas seitas. Simples assim. Quanto mais pessoas acharem uma ideia correta, mais correta essa ideia será — o que, naturalmente, é absurdo. A grande armadilha das provas sociais. 

4. Fique atento quando ouvir a expressão ‘caso especial’

Essa é uma perigosa armadilha que engana o nosso pensamento: o viés da confirmação. 

O viés de confirmação é o pai de todos os erros de pensamento — a tendência de interpretar novas informações de modo que sejam compatíveis com nossas teorias, visões de mundo e convicções. Em outros termos: filtramos novas informações que estão em contradição com nossas visões. Isso é perigoso. “Os fatos não deixam de existir só porque são ignorados”, disse Aldous Huxley.

Na gestão das empresas, o viés de confirmação é especialmente devastador pois indícios contrários não são absolutamente notados ou são desconsiderados sem “dificuldades imprevistas”. 

O gestor fica cego em relação à evidência de não confirmação do seu pensamento. Muitas vezes, por trás dela esconde-se uma evidência de desconfirmação totalmente normal.

5. Faça uma pesquisa das armadilhas 

E tem mais de 95 outras armadilhas do pensamento na leitura do livro de Rolf Dobelli. Por isso recomendo que faça uma pesquisa rápida no livro e identifique, entre as dezenas de armadilhas do pensamento apresentadas, aquela que tem maior impacto para você.

Boa leitura.

*Aloísio Sotero é professor e mentor em Precificação e Gestão de Negócios. Vice-diretor da Faculdade Central do Recife e membro do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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