Economia
Aliexpress, Shein, Shopee: imposto fica para consumidor, dizem tributaristas
Avaliação vai contra falas de Haddad de que a medida não impacta consumidor, e sim empresas.
Consumidores brasileiros que compram em lojas online estrangeiras como Aliexpress, Shein e Shopee estão acostumados com uma brecha na legislação brasileira para não pagar tributos, uma vez que existe uma isenção do Imposto de Importação para bens de até US$ 50 comercializados entre pessoas físicas (uma pessoa comum no exterior com uma pessoa comum no Brasil). Com sinalizações de mudanças por parte do governo, especialistas ouvidos pelo InvestNews dizem que a taxação agora irá a recair sobre os consumidores.
A avaliação vai contra falas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ele tem afirmado que a medida não impacta o consumidor, e sim as empresas. Nesta quinta-feira (13), ele disse que a decisão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de acabar com a isenção para encomendas internacionais de até US$ 50 tem despertado muita “confusão e desinformação”.
Pela regra atual, as empresas devem pagar o tributo independentemente do valor – como aponta a legislação brasileira. Neste caso, é cobrado uma alíquota de 60% do valor total da compra, que inclui a soma do valor do produto, do frete e do seguro da compra. O percentual se limita até compras no valor de US$ 500. Acima deste montante até US$ 3 mil (que é o limite máximo para compras por pessoas físicas), será cobrado também o ICMS – que varia entre estados – além de uma taxa de R$ 150.
Afinal, quem vai pagar?
O tema tem despertado dúvidas de quem deverá pagar os tributos devidos. E segundo juristas, o imposto recai sobre os consumidores.
Segundo Leonardo Roesler, advogado especialista em Direito Tributário e Empresarial, sócio-fundador da RMS Advogados, a cobrança de 60% do valor é de obrigatoriedade sempre de quem compra. E quem não paga é sujeito a multa.
“O que preza a normativa da Receita é da obrigatoriedade de quem compra. Quem vende de lá [exterior] já vende sabendo dessa regra e impondo essa regra ao consumidor. Existem casos em que você recebe na hora da compra o imposto a ser tributado e pago. Mas a obrigatoriedade [do imposto] será sempre do consumidor”
Leonardo Roesler, advogado especialista em Direito Tributário e Empresarial
A advogada tributarista Sandra Lopes, sócia da Lopes & Castelo Sociedade de Advogados, também reitera que o imposto deverá ser pago pelo consumidor, antes da liberação da mercadoria pelos Correios.
“Caso a isenção seja retirada pelo governo, as pessoas vão entrar na regra geral, em que compras que não ultrapassem o valor de US$ 50 podem ser declaradas por declaração simplificada onde o tributo será calculado em uma alíquota de 60% sobre o valor da importação”.
Sandra Lopes, advogada tributarista
A norma atual determina que, nos despachos aduaneiros de bens importados por pessoas físicas ou jurídicas, com ou sem cobertura cambial, cujo valor não ultrapasse US$ 3 mil, a mercadoria poderá ser apresentada ao Fisco em forma de Declaração Simplificada de Importação (DSI).
Ministério da Fazenda queimou a largada?
O Ministério da Fazenda fez questão de esclarecer que não será criada uma nova taxa para compras on-line, mas sim, que será reforçada a fiscalização de varejistas que importam seus produtos para o Brasil.
No centro da discussão estão e-commerces asiáticos, uma vez que ganharam mercado no país ao oferecer produtos mais baratos que companhias nacionais. Logo, há uma pressão por parte das varejistas brasileiras contra a concorrência desleal.
Foi criada uma Medida Provisória que deve ser colocada em prática em 1º de julho, com a qual a Receita Federal vai acabar com a isenção sobre remessas internacionais de até US$ 50 entre pessoas físicas. A partir daí, o exportador vai ter que prestar declaração antecipada com seus dados, de quem compra, além das informações do produto.
Sendo assim, a Instrução Normativa da Receita Federal 2124 aponta que os Correios terão que encaminhar à Receita, dois dias antes da chegada da remessa, um formulário com informações do comprador. Estes dados serão fornecido antes pelas companhias de e-comerce (Shein, Shopee, Aliexpress, entre outras). A medida visa rastrear quem utiliza da brecha da isenção para compras até US$ 50.
De quem é a obrigação de informar os tributos?
Segundo a advogada Luciana Roberto di Berardini, da Berardini Sociedade de Advogados, as empresas nacionais ou estrangeiras têm o dever de informar se os impostos estão inclusos ou não no valor do produto.
“Se a companhia não falar nada, presume-se que os impostos estão incluídos no preço, pois este é o padrão brasileiro. As empresas que não avisam nada estão tentando incluir o risco do negócio para o cliente, o que é proibido”, disse.
Já o advogado Leonardo Roosler reitera que nem todos os vendedores [estrangeiros] avisam sobre a cobrança de imposto após o produto ser taxado na chegada ao Brasil, “uma vez que a tributação é calculada pela Receita e pelo controle aduaneiro, que usam uma estimativa segundo o quanto aquele produto custa no Brasil”. Logo, cabe ao consumidor se certificar da possibilidade do pagamento de tributos.
Impactos no consumo
De acordo com a advogada Sandra Lopes, o entendimento é de que tais medidas apenas buscam aumentar a fiscalização para aplicar regras que já são regulamentadas e, mesmo que venham a revogar a isenção até então concedida, será no sentido de favorecer o comércio local.
A jurista acredita que, caso venha a ter uma alta nos preços dos produtos importados, o consumidor pode vir a deixar de comprar no e-commerce internacional para comprar no mercado nacional, “que já é tributado”.
O advogado Leonardo Roesler faz coro e diz que o que deve ser discutido é se os preços vão subir ou o consumo de importados deve cair.
Medida do governo é legal?
Sobre o tema, é especulado que o governo não poderia deliberar em relação a este assunto, o que os advogados consultados pela reportagem negam.
“O governo apenas aumentou a fiscalização, as regras de tributação continuam as mesmas”
Sandra Lopes, advogada tributarista
No entanto, Lopes reitera que não é de agora que se questiona a legalidade da medida que determinou a isenção de compras até US$ 50 entre pessoas físicas.
“Já caso a isenção seja revogada, quem mais será afetado será o consumidor final, ou aqueles que tentam burlar a legislação tributária e penal, já que o caso se enquadra como prática de contrabando e simulação (das empresas que se passam por pessoa física)”.
Quanto às varejistas estrangeiras, a advogada entende que nada poderão fazer a respeito, pois são empresas sediadas no exterior e não têm legitimidade para questionar as leis fiscais nesse caso.
Como os sites driblam a fiscalização?
Os produtos são enviados ao consumidor como se o remetente fosse uma pessoa física. Além disso, um mesmo pedido pode ser enviado em vários pacotes a fim de evitar a tributação de compras acima de US$ 50 (ou R$ 250, na cotação do dólar a R$ 5).
A respeito de notícias que têm circulado em redes sociais mencionando o “fim da isenção de US$ 50 para compras on-line do exterior”, o Ministério da Fazenda esclarece que a regra não era de insenção.
“Nunca existiu isenção de US$ 50 para compras on-line do exterior. Portanto, não faz sentido afirmar que se pretende acabar com o que não existe. Nada muda para o comprador e para o vendedor on-line que atua na legalidade”.
Ministério da fazenda, em nota
Segundo a pasta, o que se pretende fazer é reforçar a fiscalização, o que deve beneficiar o consumidor que vai receber suas compras on-line mais rápido, uma vez que os produtos terão o processo de liberação agilizado, a partir das informações prestadas pelo vendedor legal, enquanto ainda estiverem em trânsito para o país.
O Ministério reitera que as empresas brasileiras, sobretudo as pequenas, também se beneficiam, já que “são as que mais empregam e pagam corretamente os seus tributos”.
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