Economia
‘Caneta azul’: Ozempic abre debate sobre consumo após pandemia
Fabricante do produto, frmacêutica Novo Nordisk desbanca dona da Louis Vuitton e é a mais valiosa da Europa.
A Novo Nordisk tornou-se no início deste mês a empresa mais valiosa da Europa, com um valor estimado em mais de US$ 430 bilhões, superando a LVMH. Talvez você nunca tenha ouvido falar da farmacêutica dinamarquesa e esteja se perguntando como a empresa desbancou a varejista de luxo que tem em seu portfólio as marcas Louis Vuitton e Dior.
O segredo da empresa de Lars Jørgensen está na “caneta azul”, como é conhecido o Ozempic. O remédio surgiu com o propósito de combater o diabetes tipo 2, mas o medicamento auto injetável tornou-se popular devido aos efeitos de perda de peso, viralizando entre as pessoas que querem emagrecer.
Embora a prescrição médica não seja essa, um dos efeitos colaterais da semaglutida, o princípio ativo do Ozempic, é a perda de apetite. Daí então porque o uso fora da recomendação da bula (off label) se popularizou. Seja como for, o sucesso do remédio entre o público geral agrada os investidores e desponta no mundo pós-pandemia.
Ozempic x covid-19
Só em 2023, as ações da Novo Nordisk subiram 40%. Em cinco anos, já dispararam cerca de 300%. Para se ter uma ideia, a farmacêutica que mais se valorizou durante a pandemia da covid-19 foi a Moderna, com valorização de 495%.
O período oficial vai desde 11 de março de 2020 até 5 de maio de 2023, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). A segunda ação que mais se valorizou nesse intervalo foi a BioNTech (B1NT34), com quase 230%, seguida da AstraZeneca (A1ZN34), que subiu “apenas” 67,05% em pouco mais de três anos.
Já a Pfizer (PFIZ34), que desenvolveu até a dose pediátrica contra a covid-19, e a Johnson & Jonhson (JNJB34), dona da vacina da Janssen, tiveram alta inferior a 20% entre o início e o fim do contágio global do novo coronavírus.
Ou seja, a variação da ação da dona do Ozempic se compara ao desempenho dos papéis de empresas diretamente ligadas à vacina contra a covid-19 durante a pandemia. Fica claro, então, porque o Ozempic tornou-se um dos principais assuntos, sobretudo com o fim das medidas restritivas, quando as pessoas tiveram de voltar aos escritórios.
Disrupção no mercado
O sucesso se dá até mesmo na China, onde os consumidores preocupados com a imagem estão deixando de comprar bolsas e perfumes caros, passando a recorrer a cambistas e prescrições falsas em busca da caneta azul. Até por isso a LVMH é agora a segunda empresa europeia mais valiosa, com um valor de mercado abaixo de US$ 410 bilhões.
Com isso, aqueles que realmente dependem do medicamento para controlar o nível de açúcar no sangue estão tendo dificuldades em encontrar o remédio. Mesmo quem encontra o produto de forma regular tem que desembolsar uma grande quantia. No Brasil, uma caixa de Ozempic custa em torno de R$ 1 mil nas principais redes de varejo.
Assim, o aumento da demanda pelo remédio não é uma questão apenas de saúde pública, com a quebra de patentes tornando-se uma queda de braço entre a farmacêutica e a indústria de genéricos. Basta olhar o que o Ozempic está fazendo com a indústria de alimentos, em especial a dietética.
E se…?
O alerta vem do professor de relações internacionais da Universidade de Harvard, Stephen M. Walt. Em coluna na Foreign Policy da semana passada, ele indaga se a indústria está preparada às mudanças de hábito dos consumidores, em meio às transformações no mundo, com a Inteligência Artificial (AI) e outras inovações tecnológicas criando disrupções de grande alcance no mercado. Afinal, quem aqui se lembra de como costumava fazer as coisas na era pré-digital?
“E se as mudanças climáticas tornarem as viagens a jato proibitivamente caras, ambientalmente insustentáveis ou simplesmente demasiado perigosas devido ao aumento da turbulência atmosférica? E se grandes áreas do planeta – que atualmente abrigam dezenas de milhões de pessoas – se tornarem inabitáveis?”, indaga.
“Estaremos preparados para o dia em que os satélites dos quais dependem as comunicações globais sejam destruídos por uma colisão em cascata de lixo espacial, por um hacker malévolo ou pela ação deliberada de uma potência hostil?”, continua. Para Walt, é preciso dedicar mais tempo e esforço para se preparar para um mundo que será radicalmente diferente daquele conhecido no passado – e mais cedo do que se pensa.
“O que quero dizer é que, em um mundo de disrupções cada vez mais rápidas e interligadas, algumas das verdades, princípios e hábitos podem não ser tão úteis”
professor de relações internacionais da Universidade de Harvard, Stephen M. Walt
Nestas circunstâncias, o que importa é a capacidade de abandonar ideias antigas e de inventar novas formas de satisfazer as necessidades públicas.
Leia a bula
Até porque as investidas da farmacêutica com sede na Dinamarca não param por aí. Outro medicamento da Novo Nordisk que vem chamando cada vez mais a atenção do mercado é o Wegovy. O remédio funciona da mesma forma que o Ozempic. A diferença é que foi desenvolvido especificamente para tratar a obesidade.
O Wegovy foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em janeiro deste ano e a expectativa é de que o produto seja comercializado no Brasil até o próximo ano. No entanto, nos países onde já circula, como Estados Unidos e em parte da Europa, o remédio já é bastante requisitado e ganhou os holofotes entre celebridades.
Neste caso, o medicamento de uso subcutâneo não é contra indicado para quem quer emagrecer. Basta consultar um médico e ler a bula.
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