Economia

Do cupom ao cashback: ofertas mudam para atrair público do e-commerce

Como as compras coletivas se mostraram uma estratégia insustentável para empresas como Peixe Urbano e Groupon e deram vez a outras modalidades.

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As vendas do e-commerce brasileiro registraram um aumento de 75% em 2020 em comparação a 2019, de acordo com o Mastercard SpendingPulse, índice que mede os gastos dos consumidores em todos os tipos de pagamento. O crescimento exponencial representa a nova realidade do varejo, com o distanciamento social imposto pela pandemia da covid-19 e a necessidade do consumidor de comprar sem sair de casa.

Porém, muito antes da pandemia se instalar e do e-commerce atingir seu ápice, a engenheira mecânica Fadylla Maron já dominava as compras online graças à febre dos cupons e das compras coletivas. Em 2015, ela encontrou nos clubes de descontos uma forma de fazer seu pouco dinheiro do estágio render e bancar novas experiências.

A engenheira mecânica Fadylla Maron, adepta de clubes de descontos.

“Eu comecei a conhecer plataformas de desconto, como Peixe urbano e Groupon, e sempre buscava no próprio Google se as empresas ofereciam cupons on-line também. Acabou virando uma rotina: eu só abastecia no posto que me dava pontos e que eu pudesse trocá-los por promoções”, relata a engenheira.

Fadylla conta que o hábito foi especialmente útil quando ela foi estagiar na Europa. “Eu e meu namorado viajamos por 8 países, sempre com passagens em promoção e hospedagens bem em conta. Em cada país que eu ia, eu baixava os aplicativos de cupons. Isso nos rendeu, por exemplo, um brunch num navio pelo Rio Sena por menos da metade do preço cobrado no site da empresa, além de várias outras refeições muito mais em conta”, relembra a profissional.

O auge dos cupons

Em 2010, Júlio Vasconcellos, um economista brasiliense, voltou dos Estados Unidos decidido a montar uma empresa similar ao Groupon – uma das primeiras no mundo em vendas coletivas. Assim surgiu o Peixe Urbano, com a ideia de ofertar cupons de desconto em restaurantes, cinemas, spas e outros programas de lazer, desde que muitas pessoas comprassem vários vale-descontos de uma vez.

O apelo irresistível da oferta, que, em geral, não durava mais de 24 horas, fez com que o pioneiro do modelo no Brasil crescesse de maneira extraordinária. No primeiro ano da empresa, o site já havia vendido mais de 6 milhões de cupons e atingido uma receita de cerca de R$ 350 milhões.

Em 2013, o apresentador Luciano Huck foi anunciado como sócio da plataforma que recebeu duas rodadas de investimentos e já contava com 15 milhões de usuários cadastrados, incluindo as operações no México, Argentina e Chile.

Na época, havia cerca de 2 mil sites semelhantes aos Peixe Urbano no país.

Febre passageira

Apesar do sucesso meteórico, no mesmo ano o mercado começou a entender que o modelo de negócios não era tão lucrativo assim, e o cardume foi ficando cada vez menor com as demissões em massa.

Em 2014, o controle majoritário do Peixe Urbano foi vendido ao chinês Baidu, junto com uma dívida de R$ 60 milhões. Até que, em 2017, a companhia chinesa optou por focar em inteligência artificial e vendeu a startup brasileira para o fundo de investimentos latino-americano Mountain Nazca, responsável pela operação do Groupon América Latina.

Nos anos seguintes, o Peixe Urbano até tentou diversificar seus negócios, sendo menos dependente das vendas de cupons de descontos e se posicionando mais como uma “prateleira de ofertas” para serviços locais. Porém, nem mesmo a aquisição por um grande grupo foi suficiente para salvar o negócio. Hoje, faz quase dois meses que o site da empresa está fora do ar, deixando investidores, clientes e os últimos 20 funcionários a nadar sem rumo.

Fadado ao fim

Em 2012, as reclamações no Procon envolvendo sites de compra coletiva já haviam  aumentado 506% em relação ao ano anterior. Além disso, as margens de lucro do modelo de negócio eram muito reduzidas e isso foi se tornando um grande problema para as empresas do ramo. As empresas anunciantes já não viam vantagem em anunciar seus produtos e serviços nas plataformas.

Para Victor Bueno, analista de Investimentos da TV Top Gain, o modelo de negócio do Peixe Urbano se tornou insustentável, e a situação se agravou com a chegada da pandemia. “O Peixe Urbano não conseguiu adequar o seu modelo de negócios para um período tão grave quanto o da pandemia, ainda mais porque trabalhava com a oferta de experiências físicas, como cinemas, teatros e restaurantes”, explica o analista.

Os cupons ainda têm muito espaço no e-commerce, mas com prazos limitadíssimos e sem descontos tão atraentes quanto os das compras coletivas.

Cashback é a bola da vez

Depois da era dos grandes descontos, o cashback (“dinheiro de volta”) é a modalidade de compra que tem ganhado cada vez mais força no país. O cashback funciona como um programa de fidelidade em que o usuário se cadastra, faz compras em sites parceiros e, depois de acumular certo valor gasto, o dinheiro volta para a conta-corrente do comprador como crédito para compras futuras.

O redator Lucas de Moura estava em busca de uma nova TV quando se deparou com a oferta de cashback oferecida diretamente pelo aplicativo do cartão de crédito. “Monitorei os preços por meses e consegui o melhor preço no aplicativo do meu banco, graças ao cashback”, relata o profissional.

Ao contrário das compras coletivas, que não garantiam a fidelidade dos clientes às empresas, como idealizado pelos empresários, o cashback tem o poder de fazer o cliente voltar a comprar nas lojas em que possuem o crédito.

Algumas redes já estão administrando diretamente os descontos, sem precisar de aplicativos como intermediários e com políticas de concessão cada vez mais criteriosas.

O grande desafio da nova estratégia de vendas é se tornar sustentável, para que não tenha o mesmo fim do Peixe Urbano e de seus contemporâneos.

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