Finanças
Fim do overhedge: por que o BC quer impedir que o dólar dispare no fim de 2020?
Mudança na tributação obrigou bancos a comprar a moeda americana até a virada do ano, o que pode pressionar a cotação sobre o real.
Uma mudança na tributação sobre investimentos que os bancos fazem no exterior pode acabar pressionando o dólar para cima no final de 2020. Para impedir que isso aconteça, o Banco Central se antecipou e está agindo para intervir no câmbio, aumentando a rolagem de swaps cambiais (entenda abaixo como eles funcionam).
Pela nova regra, a tributação para os bancos fazerem este tipo de operação ficou desvantajosa, o que acabou desencorajando a prática, conhecida como “overhedge”. Ela é um mecanismo de proteção cambial que gera distorções na cotação do dólar, devido ao alto volume das operações com contratos futuros e cupons cambiais.
MP mudou a regra para os bancos
Após a mudança instituída em março pelo governo por uma medida provisória (MP), os bancos correram para desfazer suas operações de “overhedge” e, para isso, precisam comprar dólares no mercado. Eles têm até a virada do ano para fazer isso sem pagar imposto. Segundo especialistas, isso vinha ajudando a valorizar ainda mais a moeda americana frente ao real ao longo de 2020.
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A partir de 2021, a variação do câmbio gerada nestas operações deverá ser computada na base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) na proporção de 50%. Já a partir de 2022, ela passa a ser de 100%.
A MP tenta eliminar distorções no câmbio causadas pelo overhedge, em meio à forte volatilidade do mercado provocada pela crise da pandemia. Entre janeiro e março, o dólar chegou a acumular valorização de mais de 30% em relação ao real, alcançando o patamar recorde de R$ 5,90 no dia 13 de março.
O papel dos swaps cambiais
No final de novembro, o Banco Central aumentou o volume ofertado em seus tradicionais leilões de rolagem de swaps cambiais com vencimento em 4 de janeiro de 2021, passando de 12 mil contratos diários para 16 mil, o equivalente a US$ 800 milhões. A operação vem sendo feita desde 17 de novembro.
Segundo a agência Reuters, se o órgão mantiver o ritmo de 16 mil contratos por dia até o final do ano, a expectativa é que ele negocie US$ 21,4 bilhões, o que equivale a US$ 9,602 bilhões acima do estoque que vence em 4 de janeiro, em torno de US$ 16 bilhões.
“O BC tem condições de controlar com mais facilidade este volume porque [o fim do overhedge] é uma demanda de mercado não especulativa”, explica, Sidnei Nehme, especialista em câmbio da NGO. Se houver mais pressão, o órgão ainda pode vender dólares à vista e usar parte das reservas internacionais, que estão em torno de US$ 355 bilhões, acrescenta ele.
Nehme aponta que, inclusive, a operação do BC pode ajudar o Tesouro Nacional a fazer caixa, em um momento no qual a situação fiscal do país pressiona a “caixa registradora” do setor público. “Ele ganha com a venda da moeda estrangeira e pode amortecer a dívida pública com reais, o que ajudaria na situação fiscal”, avalia.
ENTENDA O QUE É SWAP CAMBIAL
O swap cambial é um instrumento usado pelo Banco Central para controlar as variações do real em relação ao dólar, considerado a moeda mais forte do mercado. O objetivo é fazer enfraquecer o dólar frente à moeda brasileira. Para isso, o BC vende moeda dos EUA no mercado futuro (derivativos), com o compromisso de entregá-la na data de vencimento do contrato. Neste dia, o investidor paga uma taxa de juros e recebe do BC a variação do dólar no período.
Um exemplo prático: uma empresa que possui dívidas em moeda estrangeira (muito comum entre as importadoras de matérias-primas) pode ter prejuízo se o dólar subir demais em determinado período. Para evitar que isso aconteça, ela tem a opção de pagar uma taxa ao Banco Central e, em troca, receber uma garantia de que estará protegida contra a variação cambial. É uma espécie de troca de risco entre as duas partes.
Pode surgir a seguinte dúvida: mas o BC não perde recursos com essas operações? Pode perder. No entanto, o objetivo do órgão ao fazer estas intervenções não é lucrar, mas controlar as oscilações da moeda no mercado, já que elas têm potencial, inclusive, de impactar a inflação do país.