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Tchau, mercado: por que a bolsa está perdendo empresas?

Apesar do volume histórico de ofertas de ações em 2019, mais companhias saíram do que entraram na B3; entenda.

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No ano em que a bolsa superou marcas históricas, o número de empresas de capital aberto continuou encolhendo. A B3 somava, até novembro de 2019, 390 companhias listadas no país – 16 a menos que em dezembro de 2018. Ainda assim, foi um ano de recordes em ofertas de ações e de pontuação do Ibovespa, o principal indicador da B3.

A quantidade de empresas de capital aberto vem encolhendo desde o pico de mais de 400 atingido em 2008. A surpresa é que nem o cenário mais favorável para os investimentos de risco, com a taxa básica de juros em 4,5% ao ano, ajudou a mudar este quadro. Na última década, foram 55 chegadas e 63 partidas. 

Quem entrou e quem saiu

O número de empresas que fecharam capital este ano foi maior que o de estreantes. Enquanto cinco fizeram IPOs em 2019 (Centauro, Neoenergia, Vivara, C&A e BMG), sete cancelaram o registro na CVM (Comissão de Valores Mobiliários)l. Entre elas, a elétrica paulista Eletropaulo e a rede de moda Hering.

Para sair da bolsa, as companhias precisam fazer as chamadas OPAs (Ofertas Públicas de Aquisição). Mas até chegar a esse ponto, o custo para operar em bolsa ficou muito alto ou as ações, baratas demais. Assim, fica mais fácil comprar os papéis dos investidores.

Entre as empresas que esperam o aval da CVM para deixar o mercado, estão a empreiteira Andrade Gutierrez e a companhia de tecnologia Itautec.

A bolsa é uma das portas de entrada para as empresas captarem recursos, mas elas vêm buscando outros caminhos, como a emissão de títulos de dívida ou empréstimos.

Abrir capital, para quê?

Para o presidente executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Eduardo Lucano, as regras que regem o mercado brasileiro são um obstáculo a novas aberturas de capital. As previsões de novos IPOs vem sendo frustradas ano a ano, como aconteceu em 2019.

Outro fenômeno é o crescente interesse de empresas brasileiras listarem suas ações exclusivamente no exterior. Foi o que aconteceu recentemente com a Stone, a Netshoes e a XP, que ignoraram a B3 e abriram capital em Nova York.

“Lá fora as empresas conseguem captar recursos e manter o controle e poder de decisão”, explica Lucano, sobre o mecanismo conhecido como “voto plural”. Pela regra do mercado brasileiro, se o controlador que tiver 51% das ações e quiser emitir novos papéis na bolsa, terá que comprar mais da metade das ações para não perder o controle da companhia.

O alto custo para manter o capital aberto também é um empecilho para novos participantes. Para cumprir a rígida regulamentação, as companhias pagam taxas, publicam balanços trimestrais pontualmente e adotam práticas de governança corporativa.

“Muitas obrigações foram criadas nos últimos anos e isso também cria riscos. Se a companhia infringir uma regra, pode ser penalizada”, explica Lucano.

Já os IPOs (Oferta Pública Inicial, em tradução do inglês) acontecem quando há perspectiva de atrair investidores e valorizar os papéis. Mas essa onda de otimismo vista em 2007, quando 64 empresas abriram capital, ainda não se repetiu. 

Entre janeiro e novembro, a B3 acumulou R$ 78,3 bilhões em volume captado em renda variável, impulsionada pelo apetite de fundos locais que migraram da renda fixa, enquanto os estrangeiros bateram em retirada do Brasil. Foi um volume recorde que superou o pico de 2007, no estouro das aberturas de capital.

Mas dessa vez, o recorde das ofertas de ações não veio dos IPOs. A esmagadora maioria foi de follow-ons, quando companhias que já possuem ações emitem novos papéis. Das 31 ofertas na B3 entre janeiro e novembro, apenas cinco foram aberturas de capital (IPOs, em inglês).

Fenômeno global

A redução no número de empresas de capital aberto não é um fenômeno isolado no Brasil. A bolsa americana Nasdaq, que reúne em grande parte empresas de tecnologia, só voltou a ganhar novos participantes de dois anos para cá, segundo a Federação Mundial de Bolsas (WFE, em inglês). Hoje, o número de companhias listadas por lá está em torno de 3,1 mil.

“Existe um movimento global de redução de empresas listadas em bolsa”, aponta Lugano. “Há uma novo perfil de investidor na indústria de venture e private equity que faz aportes em companhias emergentes, ocupando o lugar do mercado”, acrescenta.

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