Na reta final: as oportunidades (e os riscos) das debêntures incentivadas

Vários desses títulos estão oferecendo IPCA+7% – algo fora da curva no mundo dos ativos isentos de IR

As debêntures incentivadas têm sido um hit entre os investidores. Mas a oportunidade para contratar um título isento de imposto de renda – e que hoje oferecem retornos históricos – pode estar chegando ao fim. Isso porque o governo pretende começar a taxar esse e todos os demais produtos isentos a partir de 2026.

“Vai existir uma corrida ao ouro”, diz o sócio fundador da Yards Capital, Roberto Marinho, sobre o período até dezembro de 2025, em que o benefício tributário ainda vai existir. É que, diante da iminência de o custo de financiamento subir e o retorno cair, os emissores têm acelerado as captações, ao mesmo tempo em que os aplicadores buscam avidamente esses papéis.

Essa corrida ao ouro tem origem na medida provisória (MP) 1.303, que institui uma taxa de 5% sobre os ganhos dos títulos que atualmente conta com isenção de IR. A tributação, se o projeto for aprovado no Congresso, começa a partir de janeiro de 2026. É por isso que tanta gente está correndo para garantir essa alternativa de diversificação.

Oportunidades em alta

Hoje, existem diversos papéis no mercado oferecendo taxas de 7% acima da variação do IPCA, emitidas por companhias de setores como energia, saneamento, mineração, óleo e gás, telecomunicações e concessionárias de rodovias e aeroportos. A debênture com vencimento em setembro de 2044 da empresa de transmissão de energia Taesa, por exemplo, tem sido negociada com remuneração de inflação mais um spread de 7,32% ao ano. Outra companhia do setor energético, a Cemig, tem um papel com prazo até março de 2040 e remuneração atual em IPCA+7%.

A grande vantagem das debêntures incentivadas atualmente é que você pode travar uma remuneração no maior patamar em quase 10 anos por um período muito longo. Além disso, esse mercado oferece uma variedade muito maior de prazos de vencimentos, de taxas e perfis de risco do que a encontrada no Tesouro Direto. Isso sem considerar que o capital estará protegido da inflação durante o período de aplicação.

Quer ver o quanto seu dinheiro pode se beneficiar no longo prazo? Por exemplo, num horizonte de 15 anos, o valor real do dinheiro pode triplicar. Esse é o poder dos juros compostos atuando por um intervalo grande de tempo.

Veja quanto um investimento de R$ 10 mil vai se comportar de acordo com taxas de papéis ofertados no mercado em 14 de julho:

Quanto vale a isenção

A maior parte das debêntures isentas usa a fórmula de remuneração IPCA + “spread”. Essa parcela acima do índice de inflação é chamada de juro real. Para entender esse modelo, vamos considerar a inflação estimada para este ano no boletim Focus do Banco Central, de 5,18%.

Um papel que pague, por exemplo, IPCA + 7% ao ano renderia 12,18% em 2025 – os 5,18% mais os 7%. E pelos períodos seguintes até o vencimento continuará a render o IPCA do ano mais o spread e se beneficiando do efeito dos juros compostos.

O CEO da Sparta, Ulisses Nehmi, calcula que o IR chega a tirar quase um ponto percentual de um papel sem benefício fiscal, se for considerada a alíquota de 15% sobre o rendimento. Então, para competir com o título isento, é preciso que o título público ou a debênture comum de prazo equivalente pague ao menos um ponto percentual a mais de spread.

Um exemplo: o título Tesouro IPCA+ 2040 estava sendo negociado na plataforma do Tesouro Direto com um retorno de inflação mais 7,12% ao ano em 16 de julho. Descontado o IR, o retorno líquido desse papel público cai para IPCA+ 6,3%. Existem diversas opções de debêntures incentivadas pagando mais do que isso.

Títulos privados são mais voláteis

O ponto de atenção desse mercado é, antes de mais nada, os prazos. É que, quando você compra uma debênture incentivada, você está financiando projetos de infraestrutura. Estamos falando da modernização ou construção de rodovias, implantação de redes de transmissão de energia ou construção de usinas de geração elétrica, além de expansões de portos e aeroportos e muitas outras obras.

São projetos caros e que levam tempo para ficarem prontos. E é por isso que essas debêntures são tão longas: a média de vencimentos desses títulos, segundo o Ministério da Fazenda, supera os 11 anos. Entrar nesse mercado exige, portanto, tempo e sangue frio. Primeiro, por causa da chamada marcação a mercado: o preço dos títulos varia diariamente conforme as visões dos investidores sobre os juros, o cenário econômico e até o noticiário político.

Essa oscilação pode causar uma percepção de perda quando o ambiente está desfavorável. Mas esse prejuízo só vai acontecer mesmo se você vender a debênture antes do prazo e nessas condições desfavoráveis: se segurar até o vencimento, a remuneração será exatamente aquela que você contratou.

De qualquer modo, a volatilidade dos preços das debêntures, em geral, é mais intensa do que a de títulos públicos equivalentes. Isso porque os papéis privados são sensíveis não apenas aos fatores macroeconômicos, mas também ao que acontece com as próprias empresas que captaram os recursos.

Essa oscilação reflete o risco de crédito, ou seja, as chances de algo dar errado e o emissor do título ficar inadimplente. A possibilidade de uma companhia dar calote é maior do que a do governo. Isso porque os negócios precisam lidar com mais variáveis potencialmente impactantes, desde a concorrência no setor até questões legais ou regulatórias. Além disso a própria qualidade da gestão da companhia vai afetar o desempenho e, portanto, a capacidade de honrar os compromissos, bem como o perfil de risco percebido pelo mercado.

Apesar do retorno, em geral, maior do que o do Tesouro Direto, o crédito privado exibe outras desvantagens além da maior volatilidade. Uma delas está relacionada à liquidez. No caso, a facilidade de comprar e vender o papel antes do vencimento. Se o volume de negociação é baixo e o investidor precisar se desfazer da debênture antes do prazo, pode ter dificuldade em negociar ou ter de oferecer um grande desconto.

No meio do caminho até o vencimento dos títulos, haverá muitas variáveis com potencial de afetar os preços na marcação a mercado. Logo teremos eleições, em 2026, mas que já vão começar a afetar os humores dos investidores antes mesmo de 2025 terminar. Ao mesmo tempo, nos próximos meses veremos mais das polêmicas tarifas de Trump. Além disso, os ciclos de política monetária do Banco Central brasileiro e do Federal Reserve, o BC americano, podem mudar até o fim do ano. Isso sem contar com as sagas da busca pelo equilíbrio fiscal por aqui e do aumento do nível de endividamento mos EUA. Haja coração.

Exit mobile version