O mercado de ETFs cresce consistentemente tanto em oferta de fundos quanto em número de cotistas no Brasil. E essa é uma boa notícia. Quanto mais fundos de índices houver à disposição dos investidores, mais simples e acessível se torna diversificar uma carteira.
Para quem não está familiarizado, ETF é a sigla para “Exchange Traded Fund” – fundo negociado em bolsa. São fundos que replicam algum índice, como o Ibovespa ou o americano S&P 500. Replicar, no caso, significa que ele adquire as mesmas ações ou ativos que compõem a carteira do índice. Na mesma proporção. Compre uma cota por mais ou menos R$ 100 e leve 87 ações (no caso de um ETF do Ibovespa), ou 500 papéis (no caso de um do S&P 500).
Com pouco mais de 20 anos de existência no país, esse segmento oferece hoje 380 opções de ETFs – com uma miríade de índices por trás. A quantidade de cotistas do segmento ainda é relativamente baixa – 603 mil cotistas, ou um décimo da quantidade de pessoas físicas na B3. Mas mostra uma avanço consistente. Há cinco anos, a base reunia só 240 mil investidores. Temos aí um crescimento de 162% no período.
Um grande salto ocorreu entre 2020 e 2021. Esse movimento ocorreu com ajuda da regulação. Em setembro de 2020, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) autorizou todos os perfis de investidores, inclusive o chamado varejo, a aplicar nos BDRs de ETFs – ou seja, os fundos hospedados em bolsas de fora, com ativos extrangeirtos. Assim os pequenos aplicadores passaram a ter acesso a fundos de índice que até então estavam restritos aqueles com mais de R$ 1 milhão em patrimônio financeiro.
O patrimônio líquido dos ETFs também cresceu de maneira sólida de 2020 até maio de 2025. O valor dos ativos nas carteiras saíram de R$ 38 bilhões há cinco anos para oa atuais R$ 62 bilhões. Trata-se de um aumento de 63% no período.
Apesar de significativos, os números mostram que a indústria de ETFs no Brasil ainda engatinha se comparada ao exterior. Nos Estados Unidos, os 3,6 mil fundos de índice disponíveis reúnem cerca de US$ 10 trilhões dentro das carteiras e contam com 17 milhões de investidores.
Para o diretor executivo e de investimentos da Nu Asset, Andres Kikuchi, os movimentos que ocorreram lá fora costumam chegar com atraso no mercado brasileiro. E, potencialmente, o Brasil tem tudo para passar pelo mesmo crescimento dos EUA, que registrou um avanço médio de 20% ao ano nas últimas duas décadas. Ou seja, 3.700% em 20 anos.
O executivo acredita, inclusive, que esse movimento já começou por aqui e aponta indícios de que a indústria deve ganhar impulso daqui para a frente. “O volume de negociação, por exemplo, cresceu muito mais rápido nos últimos três anos, além disso, no Google Trends, as buscas por ETFs já são maiores do que por fundos de investimentos.”
Diversidade da diversificação
Mas o que os ETFs têm para atrair tantos investidores lá fora? O ponto mais importante desses fundos é que hoje em dia existem índices que casam praticamente com qualquer tese de investimento. Por meio desses veículos, você pode incorporar a sua carteira uma variedade de estratégias, mercados, classes de ativos, geografias e moedas sem precisar comprar diretamente uma ação, título de renda fixa, commodity ou mesmo fazer câmbio.
Se a ideia é ter exposição ao mercado acionário americano existem vários ETFs atrelados ao S&P 500, ao Índice Nasdaq e a outros referenciais. O mercado cripto também tem diversos representantes, como um fundo indexado que acompanha os 10 maiores criptoativos do mundo ou outros que seguem apenas a variação do Bitcoin.
Há ainda possibilidade de aplicar em estratégias muito específicas, como em um índice que reúne apenas empresas globais de semicondutores, ou outro que acompanha os setores de gamming e e-sports.
“Há diversas megatendências, como inteligência artificial e transição energética, e os fundos de índices são um das melhores formas para capturar esses movimentos seculares”, diz Paulo Silva, co-fundador da Advisory 360.
Existem ainda fundos com carteiras que espelham índices de renda fixa, de commodities, como o ouro e petróleo, e até carteiras especializadas em dividendos, que distribuem renda todos os meses.
Quais os riscos?
Os ETFs têm as taxas de administração mais baixas da indústria de fundos, entre 0,1% e 0,5% ao ano, calculadas sobre o patrimônio do fundo. Com um custo reduzido e a facilidade de serem negociados, os ETFs têm se tornado uma ferramenta útil para diversificação de longo prazo. Mas também muitos investidores utilizam os veículos para aproveitar um momento de mercado, como a recente valorização das empresas americanas ligadas à onda de inteligência artificial e até aproveitar taxas historicamente elevadas na renda fixa nacional.
Vale lembrar que ETFs de índices pouco conhecidos podem ter restrição de liquidez, ou seja, apresentar um volume de negociação muito baixo na bolsa. Nesse caso, se você precisar se desfazer da posição poderá ter de vender as cotas com um bom desconto.
O maior potencial para os ETFs, na verdade, está menos na possibilidade de comprar um índice e mais na de servir para a montagem de uma carteira diversificada. É como se fosse um “lego” no qual você pode moldar seu portfólio de acordo com seu perfil. Por exemplo, os mais arrojados podem acrescentar índices de ações de vários mercados no exterior, como EUA, China e Europa. Os mais conservadores podem recorrer aos referenciais de renda fixa – daqui mesmo ou lá de fora.
Kikuchi, da Nu Asset, considera que com 5 a 7 ETFs já dá pode ter um portfólio diversificado e eficiente, que inclui renda variável local e internacional, além de renda fixa. “O ETF traz muita eficiência em alocação de longo prazo, porque você não precisa ficar trocando os ativos, o próprio fundo faz isso para se ajustar às mudanças segundo as metodologias dos índices.”
Renda fixa sem fim
Na classe de investimentos mais popular do Brasil, a renda fixa, os ETFs trazem uma característica que pode ser um trunfo na diversificação da parcela do portfólio dedicado aos títulos públicos ou privados: a possibilidade de aplicar recursos sem se preocupar com o vencimento dos papéis. Há fundos de índice que replicam cestas de títulos públicos, como Tesouro Selic ou Tesouro IPCA+. Quando o investidor vira cotista de um ETF de renda fixa, na prática, está aplicando em uma cesta variada, mas que não vence nunca, conforme explica o fundador da T2 Educação, Tiago Feitosa.
Isso acontece porque, na medida em que os títulos vão chegando ao prazo final, o fundo faz a troca de ativos para manter o chamado “duration” da carteira, um conceito que combina tanto o prazo médio quanto a sensibilidade dos preços ao longo do tempo.
Há, por exemplo, ETFs que usam como referência o índice IMA-B 5+, calculado pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Esse referencial acompanha a variação de uma carteira teórica (cesta) de títulos públicos atrelados à inflação com vencimentos acima de cinco anos.
Essa característica dos ETFs de renda fixa pode ser um coringa em termos de estratégia. Isso porque o processo de rebalanceamento vai agregar novos papéis à carteira com periodicidade. Ao longo de um período mais longo, esses novos papéis podem trazer um ganho extra. Isso acontece se, por exemplo, o Banco Central iniciar no meio do caminho um ciclo de alta de juros. A lógica inversa também vale. Ou seja, quando o BC passa a reduzir as taxas, os novos títulos tendem a puxar a rentabilidade para baixo após o rebalanceamento.
É possível verificar esse efeito no índice de títulos atrelados a inflação com prazos até cinco anos da Anbima, chamado de IMA-B. Esse indicador registrou uma valorização de 33,68% nos últimos cinco anos. Se você tivesse comprado uma cota de ETF de IMA-B em julho de 2020 obteria essa rentabilidade atualmente. Por outro lado, quem revender na plataforma do Tesouro Direto um título Tesouro IPCA+ com prazo de 10 anos adquirido na mesma época, período em que a Selic estava em 2% ao ano, terá embolsado um ganho em torno de 14%.
Não tem come-cotas, mas tem IR
A ideia de eficiência para os ETFs vai além da taxa de administração baixa. Um exemplo é a tributação do come-cotas paga pelos fundos de investimentos de renda fixa tradicionais. Trata-se de uma antecipação de cobrança do imposto de renda (IR) sobre o rendimento recolhida duas vezes ao ano. O ETF não tem come-cotas – isso aumenta marginalmente o rendimento, já que a antecipação do IR atrapalha o tráfego dos juros compostos.
Por outro lado, não tem como escapar do IR quando negociar as cotas. Esses investimentos pagam imposto sobre o lucro, assim como as ações. A alíquota é de 15% para a maioria dos ETFs, mas sobe para 20% no caso de ETFs de fundos imobiliários.
Os ETFs, porém, não contam com a isenção de IR para quem vende até R$ 20 mil por mês na bolsa, como acontece com as ações. Ou seja, qualquer lucro obtido com a venda de cotas de ETF deve ser declarado e tributado, mesmo em operações pequenas.
Outro ponto que gera dúvidas é sobre quem faz o pagamento do imposto. Nos ETFs de renda variável (como os que acompanham o Ibovespa, por exemplo), o imposto não é descontado automaticamente. O próprio investidor é quem deve calcular o valor do IR, gerar uma DARF no site da Receita e pagar até o último dia útil do mês seguinte à venda.
Já nos ETFs de renda fixa, o processo é mais simples. O imposto de 15% é retirado automaticamente na hora da venda, e a corretora se encarrega de repassar o valor à Receita Federal.