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Mercado Livre escala disputa com farmácias no Cade: “tentam proteger reserva de mercado”

Meli acusa associações do setor de tentar erguer barreiras regulatórias; já as entidades veem atalho para entrada de big tech no comércio de medicamentos

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O embate entre o Mercado Livre e as redes de farmácias ganhou corpo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O que começou com a compra discreta de uma drogaria de bairro em São Paulo virou uma disputa entre o marketplace e as associações do setor, com acusações de ambos os lados sobre barreiras regulatórias, concentração de mercado e concorrência digital.

O caso teve início em setembro, quando o Cade aprovou, sem restrições, a aquisição da Cuidamos Farma, uma pequena farmácia localizada no bairro do Jabaquara, na zona sul de São Paulo. A compradora foi a K2 Intermediações, empresa ligada à Kangu, plataforma de logística adquirida pelo Mercado Livre.

A Cuidamos Farma pertencia à Memed, startup de prescrição digital controlada pela gestora DNA Capital, da família Bueno, e funcionava como a farmácia física que dava lastro regulatório às operações da empresa.

A aprovação parecia rotineira, mas acendeu um alerta no setor farmacêutico.

As associações Abrafarma — que reúne grandes redes como Raia Drogasil, DPSP, Pague Menos e Panvel — e ABCFarma, que representa farmácias independentes, recorreram da decisão alegando que a operação poderia servir como atalho regulatório para o grupo argentino ingressar no comércio de medicamentos online, um mercado estimado em mais de R$ 200 bilhões por ano e sujeito a forte regulação da Anvisa.

Por sua vez, o Mercado Livre afirma que o varejo farmacêutico brasileiro é “altamente concentrado” e acusou as associações de tentarem “tumultuar o processo” e “erguer barreiras regulatórias para proteger uma reserva de mercado”.

Uma big tech no mercado

As entidades que representam as farmácias argumentam que o Mercado Livre poderia usar a farmácia adquirida como base jurídica para vender remédios pela internet, integrando sua malha logística e de pagamentos a um ecossistema de saúde que incluiria prescrições digitais via Memed, a antiga dona da Cuidamos Farma.

A Abrafarma classificou a operação como o primeiro passo de uma “estratégia de penetração no mercado farmacêutico”, enquanto a ABCFarma disse que o Cade errou ao aprová-la por rito sumário, sem uma análise mais profunda dos efeitos da entrada de uma big tech em um setor sensível.

O Mercado Livre sustenta que a entrada de novos agentes digitais “é saudável, amplia a concorrência e beneficia o consumidor”, e argumenta que as entidades tentam preservar o controle de um setor tradicionalmente resistente à competição.

A empresa afirma ainda que não há qualquer parceria com a Memed, que a compra envolveu apenas a farmácia física, e que não vende medicamentos nem permite esse tipo de anúncio em sua plataforma. “A operação não altera a estrutura do mercado e tampouco gera qualquer sobreposição horizontal ou vertical”, diz a defesa do grupo.

A Abrafarma rebate afirmando que o caso “não se limita a uma simples farmácia de bairro”, mas à “primeira compra física do grupo no Brasil desde 1999, com potencial de engatar a estrutura do maior marketplace do país no mercado farmacêutico”. As entidades também defendem que o Cade deveria ouvir a Anvisa e a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) antes de confirmar a aprovação.

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Na semana passada, o presidente do Cade, Gustavo Lima, rejeitou o recurso apresentado pela ABCFarma, encerrando o pedido de revisão feito pela entidade. A decisão considerou que a associação não ingressou no processo como terceira interessada no prazo legal e, por isso, não tem legitimidade para recorrer.

Com isso, a aprovação da operação segue válida até segunda ordem — o Cade ainda precisa se manifestar sobre o pedido da Abrafarma, que continua em análise.

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