O melancólico fechamento de uma fábrica da Nissan que virou símbolo do declínio industrial japonês

Oppama, inaugurada em 1961, será encerrada em 2028 após queda nas vendas aumento da concorrência com as montadoas da China

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A fábrica Oppama da Nissan, inaugurada em 1961, já foi uma joia da coroa na ascensão do Japão do pós-guerra como potência industrial.

Hoje, simboliza os riscos de ser pego de surpresa em uma indústria em rápida transformação.

Localizada a cerca de 50 quilômetros ao sul de Tóquio, a planta será fechada até março de 2028 — parte da ampla reestruturação da Nissan após uma queda nas vendas que desencadeou sua pior crise financeira desde que a Renault salvou a montadora da falência há um quarto de século.

Antes sinônimo de tecnologia de ponta, as marcas tradicionais japonesas agora lutam para se adaptar a mudanças no gosto do consumidor, cedendo participação primeiro para empresas como a Tesla e, mais recentemente, para uma onda de montadoras chinesas lideradas pela BYD. O destino de Oppama — e dos milhares de moradores que dependem dela — servirá de alerta para fabricantes japoneses, já que a concorrência crescente provoca um doloroso processo de consolidação que pode, ao mesmo tempo, abrir caminho para uma necessária renovação.

Trata-se também de uma nova era para a economia japonesa, marcada por uma onda de falências entre pequenas e médias empresas que desafia a ideia de shushin koyō — emprego vitalício.

Como em qualquer cidade-fábrica, os laços da Nissan com Oppama são profundos. A companhia emprega diretamente quase 10% dos 29.700 habitantes da cidade. Visitas escolares à planta são um rito de passagem, e a empresa até reviveu seu time de beisebol após 16 anos, embora tenha perdido a semifinal para a Toshiba.

Para Yuji Fujita, dono de uma mercearia fundada pela família, o fechamento é “o pior cenário possível”. Ele lembra a perda da planta de Zama em 1995, o primeiro fechamento de fábrica no Japão no pós-guerra, e teme pelo futuro.

Ainda não está claro quantos dos 2.400 funcionários de Oppama serão transferidos para a unidade da Nissan em Kyushu, a mil quilômetros dali, ou quando. O sindicato pressiona por garantias de realocação.

Também não há definição sobre o futuro do terreno de 1,7 milhão de m² (metade do Central Park). Há rumores de que possa virar resort, parque temático ou até ser usado pela indústria de defesa. A imprensa japonesa noticiou que a Nissan teria discutido alternativas com a Foxconn.

O CEO Ivan Espinosa, no entanto, afirma que não considera terceirizar produção. Já o prefeito de Yokosuka pressiona para que o uso futuro do espaço ajude na revitalização da região e na criação de empregos.

O anúncio do fechamento não foi totalmente inesperado. A fábrica já vinha perdendo protagonismo: em 2007, fabricava sete modelos; hoje, apenas dois. O Leaf, lançado em 2010 como primeiro elétrico de massa, perdeu espaço para Tesla e, mais recentemente, para montadoras chinesas.

A Nissan pretende cortar sua produção anual de 3,5 milhões para 2,5 milhões de veículos, reduzindo fábricas de 17 para 10 e cortando 20 mil postos de trabalho. A reestruturação deve gerar um prejuízo contábil de US$ 1,1 bilhão neste ano fiscal.

As dificuldades já atraíram interesse de grupos como Foxconn e KKR, após o fracasso das conversas com a Honda. Ao mesmo tempo, cresce a pressão sobre fornecedores menores, dos quais 32 já faliram no último ano fiscal — o maior número em uma década.

Para analistas, a indústria vive uma “seleção natural”: só sobreviverão empresas com capital ou tecnologia para competir em elétricos, direção autônoma e motores eficientes.

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