Talvez você não tenha ouvido falar na Valid. Mas, com certeza, você carrega no seu bolso algum item “produzido” por ela: o RG ou a carteira de motorista que você usa, o cartão de crédito e até o chip do seu celular podem ter sido emitidos pela empresa, fundada por ingleses em 1957 para imprimir papel moeda e que hoje é uma corporação – aquelas companhias com o controle pulverizado.
Como o avanço tecnológico é inevitável, a empresa tem demonstrado que não estacionou. Uma prova disso é que, no trimestre mais recente, encerrado em setembro, 11% do faturamento total da Valid (R$ 64 milhões) teve como origem novos produtos – o segmento foi responsável por 22% do lucro operacional da companhia (R$ 29 milhões) no período.
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A lógica é que, se os documentos do futuro forem totalmente digitais, a empresa já terá a estrutura pronta para absorver a demanda. “A essência do nosso negócio é o backoffice [processos internos], que é o de garantir a integridade do processo e a veracidade das informações”, afirma Ilson Bressan, CEO da Valid. “A nossa ideia é ter uma esteira única de processamento que seja capaz de entregar os diferentes produtos [sejam digitais ou físicos] na ponta final.”
Mas o desafio para o futuro da Valid é lidar com as transformações de tecnologias que ainda estão fora de suas dependências. Uma delas é a blockchain, tecnologia que se tornou uma referência para validação de transações e do Drex desenvolvido pelo Banco Central. O CEO da Valid diz que a blockchain pode ser um dos caminhos para a empresa construir suas plataformas, mas diz que não é a única opção para isso. “A tokenização, a Web 3.0 e a blockchain, apesar de promissores, ainda levarão tempo para se tornarem hegemônicos.”
Como ainda há um caminho a ser percorrido, prossegue Bressan, as pessoas ainda se mostram adeptas aos produtos físicos. Ele usa como exemplo um banco digital que é cliente da Valid. A instituição relatou ter uma taxa de ativação maior nos cartões físicos do que nos digitais. “O custo de produção do cartão físico é maior, mas a prioridade é que o cliente ative o serviço”, reforça. Situação parecida vale para a CNH que, por receio de não ter conexão em algum momento importante, muitos motoristas preferem ter o documento em mãos.
“Existe uma frase: ‘the future takes a long time’ [“o futuro leva um longo tempo”], que ilustra bem esse momento de transformação. Nós tínhamos um negócio de emissão de cheques que vendemos, mas ainda hoje são processados mais de 150 milhões de cheques no país. É um mercado que deixamos de atuar, mas que ainda é resiliente”, diz Ilson Bressan, remontando à reorganização promovida pela Valid nos últimos anos. A empresa se desfez de ativos no exterior e centrou foco em três frentes: identidades, pagamentos e mobile.
A reestruturação foi iniciada há mais de cinco anos, quando a gestora Alaska, de Luiz Alves Paes de Barros e Henrique Bredda, tornou-se acionista de referência da empresa e hoje detém 30% das ações da Valid. Nesse processo, a casa trouxe o executivo Ivan Murias para tocar o turnaround da empresa e a reorganização das dívidas.
A Valid encerrou o terceiro trimestre sem nenhuma alavancagem, que é a relação entre dívida líquida pelo Ebitda – em 2018, esse índice estava em 3,2 vezes. Hoje, a empresa entrega um lucro operacional capaz de cobrir em 6 vezes suas despesas financeira líquidas.
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Com a saída de Murias no primeiro semestre deste ano para a Infracommerce, Ilson Bressan, que já era executivo do grupo desde 2020 e comandou a área comercial e de identidade da Valid, passou a liderar o negócio. A mudança de CEO também trouxe um plano de jogo diferente: de um executivo mais ligado aos temas financeiros para um focado em crescimento.
“Eu tenho um perfil mais empreendedor, que o conselho julgou ser o adequado para o momento da empresa. Temos que mover a empresa numa velocidade maior para chegar no crescimento que desejamos”, afirma Bressan, que mira o objetivo de chegar a 14% da receita total da Valid oriunda de novos negócios em 2025.
As apostas da empresa estão nas soluções digitais para validação de cadastros (“digital onboarding”), eSIM, que são os chips para os celulares mais modernos, além de atuar nas iniciativas de governo digital. Teses que são apoiadas pelos principais acionistas, como o próprio Alaska, o fundo de gestão de fortunas (“wealth management”) do BTG, o norueguês Norges Bank e as gestoras Organon Capital e 4UM, da família Malucelli.
De janeiro a setembro deste ano, a Valid registrou faturamento de R$ 1,58 bilhão, recuo de 2,5% em relação a igual período de 2023, queda puxada pela frente de mobile. No mesmo comparativo, o lucro líquido da empresa avançou 80,7%, chegando a R$ 317,7 milhões.
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