entrevista – InvestNews https://investnews.com.br Sua dose diária de inteligência financeira Fri, 11 Oct 2024 21:21:27 +0000 pt-BR hourly 1 https://investnews.com.br/wp-content/uploads/2024/03/favicon-96x96.ico entrevista – InvestNews https://investnews.com.br 32 32 ‘Não existe varejo forte em país fraco’, diz Sergio Zimerman, da Petz https://investnews.com.br/negocios/nao-existe-varejo-forte-em-pais-fraco-diz-sergio-zimerman-da-petz/ Fri, 11 Oct 2024 10:00:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=621564

Foi visitando uma loja da Cobasi que o empresário Sergio Zimerman decidiu, em 2002, investir no mercado de animais de estimação. Na ocasião, o empresário enfrentava a falência de um negócio – uma distribuidora de alimentos e bebidas. E viu na mega loja de produtos para pets, no bairro da Vila Leopoldina, um bom modelo a ser aplicado em um imóvel de sua família, localizado na zona Leste de São Paulo.

Assim foi feito: Zimerman inaugurou o Pet Center Marginal, loja que deu origem ao que é hoje a rede Petz. E, 22 anos depois, está prestes a se fundir com a Cobasi, negócio que deve dar origem a uma gigante de R$ 7 bilhões em faturamento.

A fusão, assinada pelas duas empresas em agosto deste ano, ainda aguarda a aprovação pelo Cade: segundo Zimerman, juntas, Petz e Cobasi terão aproximadamente 11% do mercado. Ele acredita que a operação vai trazer benefícios para as empresas e também para o consumidor. Hoje, explica, a forte concorrência, inclusive de pet shops de menor porte, tem jogado os preços para baixo. E para quem tem estruturas grandes e caras como Petz e Cobasi, fica muito mais difícil competir.

“A junção vai provocar competitividade dos preços no mundo físico. Quando os custos são mais racionais, tem espaço para melhorar a margem, ,mas também tornar-se mais competitivo”, afirma.

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Na Petz, cerca de 95% do faturamento vem de produtos e 5% de serviços – fatia que inclui também os 15 hospitais da rede Seres.  “É totalmente estratégico e vai ser um objetivo claro de ampliar a atuação de serviços, que acaba fidelizando o cliente também para o consumo de produtos”, explica.

O mercado de animais de estimação vem mostrando taxas fortes de crescimento nos últimos anos. Hoje, o Brasil tem a terceira maior população pet do mundo – 149 milhões -, perdendo apenas para China e Estados Unidos, segundo dados do instituto Quaest. Em cada 10 lares do país, sete têm um animal.

Segundo Zimerman, três fatores explicam esse crescimento: o aumento populacional de pets a uma taxa maior do que a da população de humanos; o fenômeno da humanização do pet; e o acesso à informação sobre as necessidades do animal.

“Somos um país latino, que tem a característica de amor incondicional. Quanto mais estressada estiver a vida, quanto mais o dólar sobe, mais o pet vira um ponto de fuga. Afinal o pet não lê jornal, não sabe como está a guerra no Oriente Médio”, afirma.

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Trajetória

O empresário sempre foi amante de animais. Mas acabou entrando nesse negócio quase sem querer. Um cunhado, que fabricava shampoo para cachorro no quintal de casa, falou sobre a Cobasi e convenceu Zimerman a conhecer uma das lojas. E foi aí que o empresário viu uma possibilidade de iniciar um negócio que replicasse o modelo da megaloja localizada na Zona Oeste da capital paulista, em um local que atendesse aos públicos da Zona Leste e da Zona Norte da cidade.

“Egresso de uma falência e com quatro filhos, eu tinha um único objetivo: sustentar a minha família”, conta. A escolha do nome – Pet Center Marginal – foi uma solução para o baixo orçamento da inauguração. “Quando você não tem dinheiro para investir em marketing , você tem que ter um nome simples. Só não coloquei o telefone no nome porque não deixaram”, brinca.

Nove meses depois, a loja já atingia o breakeven, que é o momento em que o faturamento passa a cobrir as despesas integralmente. Com a empresa rentável, o empresário decidiu iniciar um processo de expansão – o que foi, inicialmente, visto como uma má ideia pela família, que sentiu na pele todo o processo da falência anterior. Nos dez anos primeiros anos, a empresa abriu 27 lojas. Hoje, são 257 unidades no Brasil.

Hoje, a Petz vem enfrentando desafios para manter o ritmo de crescimento. Razão pela qual a fusão com a Cobasi é tão relevante. No segundo trimestre, a companhia registrou  lucro líquido ajustado de R$ 4,968 milhões, 79,8% menor do que a reportada no mesmo período de 2023, de R$ 24,548 milhões. A receita líquida da companhia foi de R$ 817,5 milhões, uma alta anual de 3,3%.

O cenário de juros altos é um dos fatores que explicam o desempenho mais fraco registrado no último trimestre. “O Brasil vem se especializando em produzir problemas adicionais aos que são inevitáveis”, afirma. “O Banco Central está falando em subir os juros, como se a gente estivesse em um cenário de super demanda, que só existe no cenário hipotético dele, porque aqui no varejo a gente não está vendo isso”, afirma.

O fenômeno das bets, que acaba drenando recursos que poderiam estar voltados par ao varejo, e a competição com produtos vindos da Ásia reforçam esse ambiente desafiador.

Zimerman é membro do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV) e do Conselho de Desenvolvimento Econômico do governo, o Conselhão. E tem levado ao governo sua visão sobre o efeito das políticas públicas sobre o varejo. “Vejo um pouco de miopia empresarial quando se acha que não temos nada a ver com politicas públicas”, diz.

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Brava Energia, fusão de 3R e Enauta, embaralha o jogo das ‘junior oils’ https://investnews.com.br/negocios/com-pressa-brava-energia-traca-plano-para-embaralhar-jogo-das-junior-oils/ Fri, 13 Sep 2024 10:00:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=613664 Criada com o potencial de ser a maior petroleira independente (“junior oil“) do país, posição hoje ocupada pela Prio, a Brava Energia tem pressa. A empresa, que é resultado da combinação de 3R Petroleum com Enauta, finalizada há pouco mais de um mês, está em um intenso trabalho de integração dos negócios e de definir suas prioridades para os próximos cinco anos. 

O objetivo é conseguir entregar US$ 1,5 bilhão em eficiências da operação, também chamadas de sinergias, que foram estimadas pela empresa no anúncio da fusão – a maior parte disso em até um ano. O Itaú BBA tem uma estimativa bem mais conservadora: entre US$ 800 milhões e US$ 1,2 bilhão.

“Tem sido uma integração intensa – e é bom que seja assim mesmo”, diz Décio Oddone, o CEO da Brava Energia, em conversa com o InvestNews na sede da B3, em São Paulo. 

Décio Oddone, CEO da Brava Energia
Décio Oddone, CEO da Brava Energia (Ilustração: Daniela Arbex)

Para entregar o prometido, prossegue o executivo, o desafio será o extrair valor de seu portfólio de seus 12 campos de exploração de óleo e gás ao menor custo. E isso pode significar, inclusive, a venda de alguns ativos, como a empresa vem sinalizando ao mercado.

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“Estamos olhando os nossos ativos e avaliando se existem campos que alguém possa conduzir melhor do que a gente”. Para definir o que faz ou não sentido no portfólio da empresa, a rentabilidade será o indicador chave. “O nosso jogo não será apenas de volume.” A previsão é que tudo esteja definido no plano estratégico que a Brava vai apresentar até o fim deste ano.

Os movimentos ocorrem ao mesmo tempo em que também busca regularizar dois ativos importantes para sua operação: o Papa Terra, campo que entrega 15 mil barris por dia e que está paralisado por determinação da Agência Nacional do Petróleo (ANP), e o início das atividades da plataforma Atlanta, que poderá entregar 50 mil barris diários.

Ganho de escala

Oddone diz que não vê sentido em ter um número expressivo de produção de barris de petróleo por dia a qualquer custo. Mas reconhece que o incremento de volume será uma das vantagens da empresa combinada, especialmente na obtenção de financiamentos mais competitivos – uma coisa e tanto para empresas de capital intensivo.

Antes da fusão, a Enauta entregava mensalmente cerca de 5 mil barris por dia, mas com potencial no longo prazo de passar dos 50 mil barris diários. Já a 3R produzia pouco mais de 45 mil barris por dia ao longo de um mês (veja dados recentes de produção abaixo).

“Nossa indústria é de escala, e ter escala te permite conseguir um custo de capital competitivo. Quando falamos na indústria do petróleo, tudo é grande. Se você não entrega 75 mil barris por dia, você não existe para as agências de rating”, exemplifica Décio Oddone.

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Seguindo essa lógica, a Brava Energia ainda “não existe” para as empresas que avaliam o crédito corporativo – pelo menos por enquanto. Com produção diária de 54,9 mil barris em julho, a expectativa de analistas do Itaú BBA é que a empresa produza mais de 110 mil barris por dia já no ano que vem, encostando na Prio (ex-PetroRio) que tem capacidade para produzir 100 mil barris diários. 

“Nós não damos guidance [orientação]. Mas estamos trabalhando para entregar o máximo possível com rentabilidade. Existe ansiedade [do mercado] para os resultados aparecerem, mas estamos em uma indústria de longo prazo.”

O longo prazo

Não é só com o futuro da produção e dos resultados que analistas e investidores têm demonstrado interesse. Há ansiedade também em relação ao futuro da base acionária da Brava Energia. Com acionistas de referência majoritariamente ligados ao setor financeiro, como o Bradesco e a gestora JiveMauá, existem dúvidas no mercado sobre por quanto tempo esses investidores seguirão dando as cartas no negócio. 

Além da dupla, as famílias Bartelle (fundadores da Grendene) e Gerdau, além de Vinci, BNDESPar e Santander, possuem posições na companhia. A falta de um prazo que trave a venda de ações (“lock-up“) ajudou a alimentar dúvidas sobre se há pressa ou não desses investidores para que a nova empresa siga seu plano estratégico de longo prazo sem solavancos.

Como o InvestNews mostrou recentemente, o Bradesco tornou-se o maior acionista da Brava por ocasião. Em meados de março, o banco converteu dívidas do Grupo Queiroz Galvão em ações da Enauta e deu impulso extra para que a fusão com a 3R ocorresse em tempo recorde. Na proposta encaminhada para a concorrente, a Enauta salientou o potencial de valorização rápida da empresa combinada. 

“Nossos acionistas e o conselho sabem que o negócio de óleo e gás é de longo prazo. A diretoria tem total liberdade para maximizar o valor da companhia”, afirma Oddone. “Pode ser uma percepção do mercado essa questão de curto prazo dos acionistas, mas isso não se reflete no dia a dia da companhia.”

Petróleo em queda

A Brava Energia nasce também com o desafio de gerar rentabilidade em um momento em que os preços do barril do petróleo estão pressionados por uma menor demanda da China e dos Estados Unidos, o que vem gerando a sobreoferta do produto no mercado.

A cotação do barril tipo Brent, a referência internacional, está caindo cerca de 20% neste ano, após atingir o pico de US$ 90 por barril. E a tendência é que o valor da commodity siga nos patamares de US$ 70 por barril nos próximos meses, na avaliação de grandes tradings do óleo, como Gunvor e Trafigura.

Plataforma Atlanta, da Brava Energia
Plataforma Atlanta, da Brava Energia (Divulgação)

Oddone diz que a volatilidade de curto prazo nos preços não afeta a empresa – e nem a indústria como um todo. Para o executivo, no horizonte de longo prazo, o valor de referência é de US$ 70 por barril. Com isso, diz o CEO da Brava, a empresa conseguirá manter seu nível de investimento.

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A postura mais conservadora em relação aos preços se reflete na gestão do endividamento da companhia. Antes da fusão, o nível de alavancagem da 3R Petroleum, de 2,8 vezes a dívida líquida pelo lucro operacional (Ebitda), era uma preocupação do mercado.

Já a Brava nasceu com um índice estimado em 1,9 vez, considerado um nível aceitável. Oddone avalia que, com o crescimento das operações e maior entrega de barris, a alavancagem deverá deixar de ser uma preocupação. “A gente espera no ano que vem ter uma alavancagem bem ‘comportadinha’”, completa o CEO.

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Alex Szapiro, do SoftBank, prevê fechar oito novos investimentos ainda este ano https://investnews.com.br/negocios/ninguem-mais-fala-em-unicornio-para-softbank-isso-e-bom/ Mon, 26 Aug 2024 10:00:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=608843 É difícil encontrar alguma coisa que tire o otimismo de Alex Szapiro com o futuro das empresas de tecnologia da América Latina.

Executivo paulistano conhecido por abrir caminho no Brasil para as chegadas da Apple, em 2007, e da Amazon, em 2012, o hoje homem forte do grupo japonês SoftBank no país só perdeu a tradicional positividade quando notou que os empreendedores da região estavam mais preocupados com “quanto” seu negócios valiam do que com “o que” as operações entregavam. 

“Faz mais de um ano e meio que não ouço essa conversa de unicórnio e tenho achado isso muito bom”, diz Szapiro em conversa com o InvestNews no escritório do SoftBank em São Paulo.

Alex Szapiro, executivo que comanda as operações da SoftBank no Brasil (Ilustração: João Brito/ Foto: Divulgação)

A ansiedade de tornar a própria startup em uma empresa avaliada em mais de US$ 1 bilhão chegou a tirar o foco dos empreendedores latino-americanos, mas Szapiro vê que a correção de rota foi feita rapidamente. “Hoje, vejo as empresas falando em geração de caixa e em ter lucro operacional”, diz. O executivo acrescenta ainda que a conversa hoje com os empresários saiu da ideia de crescimento a qualquer custo para a racionalidade do lucro. “Eles entenderam que esse é o caminho.”

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A arrumação de casa rápida, na avaliação de Szapiro, tem muito a ver com a característica da região. Acostumados aos solavancos da economia, como inflação alta e juros idem, os empreendedores assimilaram rapidamente a mudança de cenário e se anteciparam. Nos últimos 18 a 24 meses, fizeram cortes, reduziram despesas, redefiniram prioridades. Agora, as empresas estão mais leves e prontas para retomar o crescimento.

Das 75 companhias que compõem a carteira regional do grupo japonês na América Latina, 94% têm caixa para mais de 12 meses – no fim do ano passado, esse índice estava em 88%. “A execução foi bem feita”, prossegue Szapiro.

Um exemplo de arrumação está na Rappi, plataforma de entrega investida pelo SoftBank. Ao InfoMoney, o CEO da empresa, Felipe Criniti, disse que a empresa terá neste ano Ebitda [lucro operacional] positivo. “Temos gerado caixa e utilizado isso para crescer. “

Com o caixa em dia, as startups começam a tatear novamente o mercado para uma eventual abertura de capital na Bolsa. Pelo menos 10 investidas do SoftBank estariam em condições de uma oferta pública inicial de ações (IPO, em inglês), mas Szapiro não revela os nomes.

Também abriu-se a possibilidade para mais operações de fusão e aquisição (M&A, na sigla em inglês). No início da operação do Softbank, a expectativa era de que o desinvestimento (saída do grupo japonês das operações) ocorreria mais pela via das ofertas em bolsa do que com fusões. E, no caso dos M&As, as empresas norte-americanas seriam as maiores interessadas.

Isso mudou. Szapiro espera uma divisão mais equilibrada entre operações de IPO e de M&As e vê empresas asiáticas bastante interessadas nas startups latino-americanas. A expectativa é de que pelo menos metade dos próximos exits seja por meio de venda direta para outra companhia.

Além da Rappi, fazem parte dos investimentos do SoftBank na região nomes que certamente você já ouviu falar: Loggi, Unico, Petlove, Wellhub (antigo Gympass), Descomplica, entre outros. Startups do Brasil representam cerca de 70% da carteira do grupo japonês na América Latina.

O que faz o SoftBank?

Para quem ainda não conhece, o SoftBank é a referência global em investimentos de risco (“venture capital”) para empresas de tecnologia que estão em fase de crescimento – Alibaba e Nvidia foram algumas das companhias que receberam aportes da casa para pavimentar seu crescimento. E veja no que deu. A instituição não investe em startups no início da vida. Só naquelas que já provaram seu negócio e precisam de um empurrão a mais para ganhar escala.

O grupo não despreza a importância do ambiente macroeconômico, mas entende que isso faz parte de ciclos econômicos e reforça a visão de longo prazo. “Se os juros vão cair nos Estados Unidos ou vão subir no Brasil, isso pouco vai afetar a visão de longo prazo do SoftBank”, diz Szapiro. O SoftBank Latin America Fund I, primeiro a ser lançado na região, em 2019, vence apenas em 2032.

“Como investimos com capital próprio, não temos pressa para ter resultados”, reforça Szapiro, executivo de 54 anos que se juntou ao Softbank de Masayoshi Son em 2021. Naquele momento, o mercado havia passado por uma explosão de IPOs, com muita liquidez. O apetite para o risco, porém, teve uma guinada na sequência com o início do aumento de juro no mundo todo.

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A liquidez para startups diminuiu drasticamente e o mercado como um todo passou a ser mais seletivo, exigindo que as empresas não só mostrassem crescimento, mas também resultado operacional.

“Esse foi um erro de 2020/2021. Muitas empresas foram para a Bolsa e não estavam preparadas”, explica o executivo, acrescentando que essas empresas hoje funcionam como se fossem totalmente privadas, mas com o ônus da volatilidade dos resultados trimestre a trimestre. “Não tem que ter pressa para ir para a Bolsa. Isso tira o foco do longo prazo.”

O unicórnio passou

O primeiro unicórnio no Brasil foi em 2017, com o app de transporte 99, hoje de propriedade da chinesa Didi. Desde então, cerca 30 empresas atingiram esse status, com pelo menos um terço delas obtendo uma avaliação de mercado (“valuation“) de US$ 1 bilhão em 2021, ano em que as operações atingiram o pico.

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Era uma fase de dinheiro fácil para o setor de tecnologia se estendeu até meados de 2022. A partir daí, começou o “inverno” das startups. Prova disso é que, no ano passado, apenas uma startup brasileira conseguiu atingir o patamar de unicórnio: a fintech Pismo, que foi vendida para a americana Visa por US$ 1 bilhão. A empresa era uma das investidas do SoftBank e a operação rendeu uma taxa interna de retorno (TIR) de 52% para o SoftBank em apenas 18 meses, retorno mais rápido que a média da indústria de venture capital.

Novos aportes

O segundo semestre vai ser forte para o SoftBank na região.

A instituição não tem nenhum aporte anunciado neste ano, mas está na fase final de verificação – a chamada “due dilligence” – para investir em duas novas empresas nos próximos meses. Até o fim do ano, segundo a previsão de Szapiro, a casa deve fazer pelo menos oito investimentos, a maior parte deles em empresas ainda não investidas. O SoftBank costuma comprar entre 5% e 10% do negócio.

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Sede do SoftBank no Japão (Reuters)

Os focos seguem para empresas que atuam no Brasil e no México, as economias mais pujantes da América Latina neste momento. O perfil de empresa buscado pelo SoftBank na região são aquelas que já tenham um produto provado e que vão precisar de dinheiro para acelerar seu crescimento, uma fase chamada de “growth” no mercado. O grupo japonês conta com US$ 60 bilhões de seu Vision Fund II, que atua em todo o mundo, para investir nessas companhias.

Para obter um investimento que pode chegar até US$ 30 milhões, o funil do SoftBank é bem estreito. Das 106 empresas analisadas em 2023, 52 passaram por estudos mais aprofundados, 11 foram levadas para o comitê de investimento e apenas 7 receberam, de fato, o aporte.

Com o acesso a dinheiro novo ainda restrito pelos juros altos, o chefe do SoftBank observa que o preço pedido pelos empreendedores voltou “à normalidade” e que os múltiplos pedidos estão mais justos. “É normal cada um puxar para o seu lado. Mas eles caíram na real que os valuations daquela época não cabem mais hoje em dia”, completa Alex Szapiro.

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A brasileira que levou US$ 1 bi da Visa e está colocando bancos mundo afora na nuvem https://investnews.com.br/negocios/a-brasileira-que-levou-us-1-bi-da-visa-e-esta-colocando-bancos-mundo-afora-na-nuvem/ Mon, 19 Aug 2024 10:00:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=609000 Daniela Binatti chega sozinha ao estúdio do InvestNews vestindo calça jeans, camiseta branca, blazer e tênis. Uma diretora da Pismo, a empresa que Daniela fundou em 2016 junto com o marido, a irmã e um ex-chefe, já a esperava. Nada de ostentação, estrelismo ou assunto proibido. O cheque de US$ 1 bilhão que a Visa fez há menos de um ano para comprar a Pismo em nada mudou o jeitão pé no chão de Daniela, uma paulistana nascida na Zona Leste da capital que estudou em escolas públicas, fez faculdade com 80% de bolsa de estudos e que montou sua startup com quase 40 anos de idade.

“Todo mundo fala muito das histórias de sucesso, mas fala-se pouco do quão difícil é o processo e do que é preciso se submeter até chegar a esse ponto”, diz Daniela nessa entrevista exclusiva em vídeo ao InvestNews

Em pouco mais de meia hora, ela explicou o processo de criação da Pismo, a venda à empresa global de pagamentos Visa, o acelerado processo de expansão internacional e o selo de segurança que a empresa acabou recebendo, sem querer, quando o mundo viveu o apagão tecnológico provocado por um erro da firma de cibersegurança Crowdstrike. Mas também abordou as crises de pânico pelas quais passou, as decisões difíceis na pele de empreendedora – como quando o casal vendeu o único carro para pagar a escola das duas filhas –, preconceitos, inseguranças e desafios.

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A Pismo não é super conhecida do brasileiro, embora esteja presente na vida de muitos deles.  Como diz Daniela, a empresa de tecnologia bancária e de pagamentos fica debaixo do capô. Quando alguém usa um cartão emitido por um banco que tem contrato com a Pismo, é a empresa que grava o cadastro do consumidor, registra o saldo, as transações, aprova a operação, monta o extrato e a fatura, por exemplo. Os bancos já faziam isso. O pulo do gato da empresa foi o de levar tudo isso para a nuvem, com sistemas modulares e integrações.

No Brasil, hoje, a Pismo tem como clientes o Itaú (primeiro grande banco a fechar contrato com a fintech), BTG, B3 e, depois de anunciado o acordo com a Visa, já fechou contratos com Stone, a fintech Cora e o banco BV. Importante: no país, ao aprovar o negócio com a Visa, em janeiro deste ano, o Cade (conselho de defesa econômica) deixou claro que por aqui a companhia não pode fazer negócios junto com a Visa – é a regra de neutralidade. 

A empresa segue crescendo em terras brasileiras, mas está no exterior o maior vetor de expansão. A internacionalização começou no fim de 2021, quando foi instalado o escritório em Bristol, no Reino Unido, com apoio do governo britânico. O Citi anunciou no ano passado que usará a plataforma da empresa como seu core bancário em 70 países.

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Na Índia, onde a Pismo também tem escritório, há importantes negociações em andamento, segundo apurou o InvestNews. O país é um dos principais casos mundiais de pagamentos em tempo real – quase 90% dos 1,4 bilhão de habitantes usam alguma forma de carteira digital. Há ainda conversas com grandes players na Europa e na Austrália.

Juliana, Daniela, Ricardo e Marcelo – os quatro fundadores da Pismo/ Foto: divulgação

“No processo de expansão internacional, ter uma empresa de meio trilhão de dólares como a Visa nos apoiando nas questões jurídicas, de contrato e na abertura de portas, facilita muito a nossa chegada em alguns mercados”, diz Daniela, sem revelar os nomes dos novos clientes. 

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Na internacionalização, as negociações mais difíceis são com os bancos tradicionais europeus e norte-americanos, em que os sistemas são complexos, com retalhos e legados. “Nos países menos desenvolvidos, a abertura a testar soluções novas é maior”, diz a cofundadora da Pismo, que diz ver o potencial transformador da inteligência artificial, mas alerta para o gap que ainda há na adoção de tecnologias modernas em instituições tradicionais. “Precisamos preparar a fundação para que o poder da inteligência artificial possa ser usado em soluções mais centrais.”

Vida pessoal

Daniela tem 47 anos e é a mais velha de três irmãs. Os pais vieram da roça. Ela fez faculdade no Mackenzie com 80% de bolsa e trabalhou por 16 anos na antiga Conductor, empresa de processamento de pagamentos. Seu marido, Marcelo Parise, também trabalhou lá, assim como a irmã do meio, Juliana Binatti Motta, e o ex-chefe, Ricardo Josuá – o quarteto se uniu para fundar a Pismo.

Os quatro têm características e habilidades complementares. Daniela é estudiosa, entende muito de arquitetura e estratégia. Marcelo é bom de engenharia, Juliana, de produto, e Ricardo é o professor que sabe os detalhes dos sistemas de pagamento.

Com duas filhas, Júlia e Lívia, hoje com 16 e 14 anos, Daniela deixou a Conductor em 2014 porque estava difícil conciliar a vida de executiva, com responsabilidades sete dias por semana, e a criação das meninas. A ideia era trabalhar com consultoria e ter um pouco mais de flexibilidade. Mas ela foi estudar e acabou vislumbrando o potencial de uma solução de pagamentos na nuvem.

Pouco antes de deixar a Conductor, ela também havia passado por uma fase difícil, com crises de pânico. Em 2011, depois de sair nervosa de uma reunião, teve falta de ar e taquicardia e associou os sintomas a uma certa ansiedade. No hospital descobriu que estava com embolia pulmonar e chegou a ficar na UTI. A partir daí, sempre que sentia algo, não sabia se era ansiedade ou não e passou a ter as crises.

Daniela com as filhas Livia e Júlia em Pismo Beach, cidade na Costa da Califórnia que deu origem ao nome da empresa

“Foi minha fase mais difícil. Às vezes eu ia para o hospital de madrugada, ficava tomando calmante até 6h e às 9h tinha que estar impecável, no salto, como se nada tivesse acontecido”, afirma Daniela. Ela diz que conversar com outras pessoas que tinham passado por aquilo e ver histórias de superação ou de como as pessoas lidaram com o assunto a ajudou no processo. Por isso, fez questão de que o tema fosse tratado abertamente na Pismo.

Os aprendizados são passados também para as filhas. Elas são ensinadas a não desistir nos momentos difíceis, mas também a não se deslumbrarem nos momentos bons. “Tudo passa.”

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Mercados exageram na reação aos dados de emprego nos EUA, diz Solange Srour, do UBS https://investnews.com.br/economia/mercados-exageram-na-reacao-aos-dados-de-emprego-nos-eua-diz-solange-srour-do-ubs/ Fri, 02 Aug 2024 18:42:57 +0000 https://investnews.com.br/?p=605264 Os números de emprego nos Estados Unidos mostram que a economia americana está enfraquecendo, uma resposta natural aos juros altos por lá (entre 5,25% e 5,5% anuais desde julho do ano passado). Mas quem acompanha os dados com mais atenção diz que há um certo exagero na reação dos mercados a esses dados.

Para Solange Srour, diretora de macroeconomia para o Brasil do UBS Global Wealth Management, ainda é cedo para afirmar que há uma recessão ou um cenário de retração abrupta – o que os especialistas chamam de hard landing. E, portanto, ainda não é possível defender hoje que haverá um corte mais forte nos juros pelo Federal Reserve, como o mercado começou a considerar.

A preocupação com uma desaceleração mais intensa da atividade econômica americana começou a crescer na quinta-feira (1) e chacoalhou os mercados financeiros globais. As bolsas americanas amargavam nesta sexta-feira (2) à tarde quedas superiores a 2% pelo segundo dia consecutivo. E o dólar sobe no mundo, respondendo a uma certa fuga de ativos de mais risco. No Brasil, a cotação chegou, no pior momento do dia, a encostar nos R$ 5,80.

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O número de vagas de emprego criadas nos Estados Unidos, dado conhecido como payroll, ficou em 114 mil em julho, muito abaixo da expectativa, de 185 mil. Já a taxa de desemprego subiu para 4,3%, ante 4,1% em junho.

Solange diz que os dados confirmam uma tendência de enfraquecimento do emprego, já observada há três meses. Juntamente com o resultado dos balanços das companhias de tecnologia americanas, relativos ao segundo trimestre, fica claro que há uma desaceleração econômica em curso.

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Em oposição a esses dados, Solange observa que o PIB americano relativo ao segundo trimestre veio forte. Houve um crescimento de 2,8%, acima dos 2% esperados pelos economistas.

Também os dados de vendas no varejo de junho mostraram estabilidade. E o PCE, o índice de preços de gastos com consumo – o índice de inflação mais observado pelo Fed – acelerou para 0,2% em junho, resultado compatível com um quadro de desaceleração suave da economia americana.

Esse quadro, diz Solange, invalida a leitura de parte do mercado de que o Federal Reserve está “atrasado” no corte de juros. “Há dois meses, vimos a inflação medida pelo PCE ainda muito resistente, especialmente na parte de serviços. Não havia como o Fed começar a cortar o juro diante disso”, defende.

Solange Srour, diretora de Macroeconomia para o Brasil do UBS Global Wealth Management
Solange Srour, diretora de macroeconomia para Brasil do UBS Global Wealth Management / Foto: Divulgação

Para ela, a reação exagerada dos mercados tem a ver com outra coisa: a [enorme] valorização recente dos ativos. As bolsas americanas acumulavam ganhos na casa de dois dígitos este ano, mesmo com o juro básico no maior patamar histórico desde julho do ano passado, no intervalo de 5,25% e 5,5%. Algumas companhias de tecnologia viram seu valor de mercado dobrar este ano. Ou até triplicar, como foi o caso da Nvidia.

“É uma questão de valuation. Não acho que esse movimento tenha fundamento”, afirma a economista. “Claro que o payroll é um dado importante, e ele veio fraco. Mas não temos um cenário claro de recessão.”

Caso um cenário de recessão nos Estados Unidos se consolide, o dólar deve se enfraquecer globalmente. Mas não está claro se o real vai conseguir se beneficiar desse movimento. “Temos nossas idiossincrasias”, diz. Ela se refere ao fato de o BC ter sido menos enfático em sua disposição de subir os juros no comunicado da última decisão do Copom, da quarta-feira (31).

Para ela, a recente alta da inflação e também das expectativas seria razão suficiente para que o comitê deixasse “a porta mais aberta” para elevar a Selic em breve. No entanto, no comunicado, o BC revelou que está de olho na inflação de 2026, e não mais na do próximo ano. Na prática, essa é uma tentativa de ganhar tempo para levar a inflação à meta. “Com essa incerteza sobre o BC e também sobre o quadro fiscal, não é claro para mim que o real vá conseguir se valorizar”, conclui.

Na terça (6), o Banco Central divulga a ata da reunião do Copom do dia 31. Há uma expectativa de parte do mercado de que a ata tenha um tom mais duro do que o comunicado divulgado logo após a reunião, o que ajudaria a dissipar o temor de uma postura mais frouxa (dovish) na política monetária.

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Com um grande passado pela frente, Eike Batista só quer falar de futuro https://investnews.com.br/negocios/com-um-grande-passado-pela-frente-eike-batista-so-quer-falar-de-futuro/ Tue, 16 Jul 2024 10:50:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=600244

“O cara tá aqui, tem um tempinho”. Com essa mensagem no WhatsApp, a equipe do InvestNews soube que o empresário Eike Batista havia chegado para a entrevista – com duas horas de antecedência.

Quando este entrevistador chegou ao local da gravação – com uma protocolar antecedência de uma hora, diga-se –, um dos dois assessores que acompanhava Eike logo passou às mãos do ex-bilionário um calhamaço de folhas A3. Começou ali uma das famosas apresentações de slides de Eike Batista, na versão impressa.

Nas folhas, detalhes sobre sua “super cana” com potencial para produzir até três vezes mais etanol e 12 vezes mais biomassa do que as espécies usadas atualmente, segundo Eike. A ideia é vender a cana transgênica para os produtores e substituir aos poucos a cultura plantada atualmente.

Enquanto os técnicos ajustavam os microfones às roupas, ele contornava o emaranhado de fios e braços a fim de sustentar os slides nas mãos e prosseguia na apresentação.

“Serve para misturar no querosene de aviação, serve para fazer papel e celulose, serve para fazer qualquer tipo de embalagem”, listou depois, na entrevista gravada em São Paulo.

Eike Batista em entrevista ao InvestNews Foto: Reprodução/InvestNews

Doze anos depois da espetacular debacle da petroleira OGX, Eike Batista continua sendo, antes de tudo, um vendedor – e um vendedor de si mesmo. Ao mesmo tempo em que refuga a fama de “empreendedor de PowerPoint” – “meus projetos são reais e estão aí para todo mundo ver”, desafia –, o empresário segue reafirmando seu faro para negócios “excepcionalmente eficientes” e anunciando sua “capacidade de gerar novas coisas”.

Aquele que já foi o sétimo homem mais rico do mundo – a fortuna chegou a US$ 34,3 bilhões em 2012 –, agora confessa ter virado persona non grata na Faria Lima, onde ficam as sedes de boa parte do poder econômico do país. Mas Eike diz dar de ombros. “O Brasil da Faria Lima não conhece o Brasil [real], ele conhece o Brasil da telinha ali, da bolsa subindo, descendo, day trade”.

Eike se diz um fazedor serial de empresas que valem mais de um um bilhão de dólares – os “unicórnios” – e conta que, no momento, está ocupado em fazer vingar com “seis ou sete desses animais multichifrudos”, a “super cana” entre eles. Segundo Eike, ele pode exercer a preferência na hora de comprar essas startups.

Se o inferno de Eike como empresário começou nos poços de petróleo da OGX – muito menos produtivos do que se anunciava –, hoje ele aposta seu futuro na energia verde. Aos 67 anos, menciona os filhos do segundo casamento, com a advogada e empresária Flávia Sampaio, como inspiração para trabalhar por “um mundo limpo” e virou defensor contumaz dos carros elétricos – ele mesmo dirige um Yuan Plus, da chinesa BYD.

Eike tem no total quatro filhos, dois com Luma de Oliveira (Thor e Olin, de 32 e 28 anos, respectivamente) e dois com Flávia (Balder, de dez, e a única menina, Tyra, com dois anos).

“Eu acho que Deus não quis que eu mexesse com o mundo sujo do petróleo”, disse Eike ao InvestNews, para depois reconhecer que hoje nutre certo asco por essa indústria.

Nem por isso virou um crítico da Petrobras. E olha que o controlador da petroleira – o Estado brasileiro – já tirou de Eike algumas noites de sono quando 41 blocos exploratórios foram excluídos de um leilão dias antes do certame acontecer. A decisão, tomada em 2007, no governo Lula 2, forçou uma mudança de estratégia por parte da OGX: a petroleira de Eike arrematou áreas menos promissoras – ou mais arriscadas, como queira –, o que foi determinante para sua quebra alguns anos depois.

De acordo com Eike, “se os blocos não tivessem sido retirados, a OGX estaria estaria produzindo mais de um milhão de barris por dia hoje”. “Mas quem descobriu o pré-sal foi o governo, a Petrobras e a ANP. Então o governo tem direito de fazer isso”, sustenta, sem mágoas aparentes.

O empresário Eike Batista fala na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que apura irregularidades no BNDES, em 2017 (Wilson Dias/Agência Brasil)

Agora é a Acelen, da Mubadala Capital, quem sente a pressão do governo ao tentar “se meter” em negócios que interessam à estatal. Neste caso, a refinaria de Mataripe, na Bahia, que pode voltar para as mãos da Petrobras apenas três anos depois de ter sido privatizada.

“Essa refinaria não devia ter saído do portfólio da Petrobras”, opinou Eike. “Para maximizar valor, a Petrobras tem que ter o petróleo e as refinarias, é um hedge. As maiores empresas do mundo são assim”, argumenta.

LEIA MAIS: Como a Petrobras tem pressionado o Mubadala para ter refinaria de Mataripe de volta

Carregando o passado

Apesar do foco no futuro, Eike ainda tem um enorme passado pela frente. Em diferentes processos, foi condenado pelos crimes de uso de informação privilegiada, manipulação de mercado, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. As penas de prisão somam quase seis décadas. Juntas, as multas superam os R$ 2 bilhões.

Seus bens estão bloqueados pela Justiça e é longa a lista de credores e investidores em busca de reparação financeira. A esperança de Eike Batista está nas instâncias superiores do Judiciário brasileiro – e o histórico recente parece favorecê-lo.

Em 2023, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu que as propriedades restantes de Eike – basicamente o restaurante chinês Mr. Lam, no Rio, e as debêntures da mineradora Anglo American, avaliadas em pelo menos R$ 360 milhões – só podem ser vendidas com autorização do Supremo.

Eike Batista e Luma de Oliveira | Reprodução

Já neste ano, Toffoli deu à defesa do empresário acesso às mensagens trocadas por autoridades da Lava Jato e que serviram de base para que condenações no contexto da operação fossem canceladas. Uma dessas anulações favoreceu Marcelo Odebrecht. Multas bilionárias da Odebrecht – hoje rebatizada de Novonor – e da holding J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista, acabaram suspensas.

Eike afirma ter sido vítima do juiz Marcelo Bretas, da Lava Jato do Rio. Para o empresário, sua condenação não passa de uma estratégia de autopromoção para o magistrado, hoje afastado das funções por determinação do Conselho Nacional de Justiça.

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“É uma loucura o que fizeram, foi um processo medieval”, reclamou Eike. “Tenho certeza de que, graças a Deus, nas instâncias superiores, todo mundo enxerga isso com uma clareza absurda.”

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A Casas Bahia tem R$ 4,1 bi em dívidas. Mas o CEO diz que agora já dá pra voltar a dormir https://investnews.com.br/negocios/a-casas-bahia-tem-r-41-bi-em-dividas-mas-o-ceo-diz-que-agora-ja-da-pra-voltar-a-dormir/ Wed, 10 Jul 2024 10:50:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=598992

Renato Franklin voltou a dormir bem. Ele nunca foi de ter problemas para dormir, mas tudo mudou quando o mineiro que completa 43 anos nos próximos dias assumiu o cargo de CEO da Casas Bahia, em abril do ano passado. A empresa tinha acabado de registrar um fluxo negativo de caixa de R$ 644 milhões no primeiro trimestre de 2023. Naquele período, o desempenho tanto das ações quanto dos papéis de dívida refletiam a desconfiança do mercado quanto à sobrevivência da companhia.

“Até outubro [de 2023], a gente estava numa ansiedade muito grande, trabalhando muitas horas. Eu, que sou de dormir bem, estava  acordando à noite, sonhando”, lembra. Foi a partir de novembro do ano passado, quando a empresa começou o processo de reorganização de suas contas, que o executivo diz que conseguiu respirar mais aliviado. Sem a pressão do vencimento de curto prazo de sua dívida, o fluxo de caixa melhorou.

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A empresa ainda enfrenta o desafio de convencer credores e acionistas de que seu plano de reestruturação financeira e operacional vai funcionar. Com R$ 4,1 bilhões em dívidas, a Casas Bahia está em processo de recuperação extrajudicial, recém-aprovado pela Justiça de São Paulo. Além das questões internas, também enfrenta o cenário macroeconômico adverso, que tem dificultado a queda na taxa de juro e complicado a vida de quem depende da venda de produtos no crediário.

Dedicação total

O dia a dia de trabalho do CEO das Casas Bahia é intenso, norteado por um esquema que ele chama de 5 x 2:  cinco dias no escritório e dois nas lojas. Ele diz que a atitude essencial para qualquer um que queira  trabalhar no varejo é “rodar as lojas”. Principalmente aos sábados, dia de muito movimento. 

 “Eu costumo dizer que o escritório emburrece. Os players que estão crescendo são os que estão na rua entendendo o que está acontecendo, adequando o mix de produto, a estratégia”, afirma. “A gente às vezes toma decisões que não são baseadas na cabeça da população. Para entender o consumidor brasileiro, tem que estar nas lojas.”

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É uma mudança e tanto para quem foi forjado no mundo executivo em empresas que trabalham essencialmente no segmento B2B. Depois de trabalhar por dez anos como agente autônomo de investimentos, Franklin passou outros dez na Vale e de lá foi para a Suzano. Voltou a ter contato diretamente com o consumidor quando assumiu o cargo de CEO da empresa de locação de carros Movida, em 2014. Mas nada na carreira do executivo se compara ao trabalho em uma varejista como a Casas Bahia.

No varejo, diz Franklin, o que traz uma dose de adrenalina é saber que qualquer decisão terá efeito imediato sobre as vendas. Se colocar o preço no lugar errado, isso é percebido rapidamente na receita. Sem falar naquele choque de realidade que só uma aproximação de bairros mais distantes pode  trazer.

“Tem muitas famílias  se juntando para dar a primeira máquina de lavar para a mãe. Para eles, a alegria é maior do que a de comprar um carro”, relata o executivo. “Quando você vai para a loja, você volta para o escritório com mais energia, com vontade de trabalhar mais e tentar corrigir as diferenças sociais.”

Just breathe

O que permitiu esse alívio foi, basicamente, a renegociação da dívida com os credores, concluída em abril. A empresa assinou um  acordo de recuperação extrajudicial com Bradesco e Banco do Brasil, principais credores da companhia. Nesse processo, a Casas Bahia conseguiu alongar o prazo e reduzir os custos financeiros de sua dívida.

Antes disso, uma série de medidas operacionais foram adotadas. A primeira de todas foi fazer o que Franklin chama de “back to basics”, ou seja, a volta ao que a empresa sabe fazer bem. Isso envolveu a retomada do nome original e do slogan [“Dedicação total a você”] e a interrupção do modelo de marketplace para voltar a ser uma loja especializada em eletrônicos, linha branca e móveis.

A ideia de voltar às origens foi bem-recebida por todos os stakeholders da empresa, dos acionistas aos funcionários. E o plano de reestruturação também. Mas isso não dirimiu a dúvida: o plano é bom, mas é viável? Franklin diz que a renegociação da dívida é uma demonstração de que há confiança na companhia. Mas ainda é preciso mostrar consistência. “Pra perder a credibilidade é fácil. Mas para conquistar, são vários trimestres consecutivos”, explica. 

Desde seu pico histórico, em outubro de 2020, as ações das Casas Bahia acumulam uma perda de quase 99%. Nos últimos 12 meses, a perda acumulada é de cerca de 87%.

Foco na consistência

Olhando para a frente, Franklin diz que a prioridade de sua gestão é manter resultados consistentes, com melhora do resultado operacional e das margens.  “Não tenho a expectativa de que o mercado de capitais tenha uma percepção diferente da companhia no curto prazo.  Isso demanda alguns trimestres, mas sou otimista com o longo prazo”, afirma.

A ideia é que, a partir de meados de 2025,  os balanços tragam uma fotografia mais clara do resultado da reestruturação. A partir daí a companhia planeja voltar a investir em expansão. Num primeiro momento, esse crescimento deve se concentrar na rede de lojas físicas, que são mais rentáveis –  principalmente, nas regiões Sul, Norte e Nordeste, onde Franklin diz haver muito potencial. No Sudeste, observa, as Casas Bahia já têm uma posição consolidada e, portanto, há menos espaço para crescer.

Já o avanço das vendas online vai ocorrer de forma mais lenta e gradual. Quando Franklin assumiu a companhia, o e-commerce representava 50% da receita da empresa. Mas, para melhorar os resultados, a escolha foi privilegiar o canal onde a rentabilidade é mais alta, que são as lojas físicas. Com isso, o digital encolheu e hoje responde por  40% da receita. O crescimento nesse segmento vai ganhar mais robustez à medida que alguns ajustes sejam feitos para melhorar  a jornada do consumidor, como nos mecanismos de busca, de pagamento e também para a concessão de crédito no ambiente online.

“Hoje é o momento em que eu dou graças a Deus porque eu não sabia exatamente como era [a situação da empresa].  Se soubesse de tudo, teria ficado mais receoso e talvez não tivesse aceitado [o desafio]”, diz. 

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Agora ex-CEO da Suzano, Walter Schalka faz um ‘wake up call’ para executivos https://investnews.com.br/negocios/agora-ex-ceo-da-suzano-walter-schalka-faz-um-wake-up-call-para-executivos/ Tue, 02 Jul 2024 10:50:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=596091 Walter Schalka, o executivo que nos últimos 11 anos comandou a Suzano, maior fabricante de celulose do mundo, teve nesta segunda-feira (1) seu primeiro dia de férias de verdade em muitos anos. Schalka deixou a cadeira para seu sucessor, Beto Abreu, e está assumindo um assento no conselho da companhia. Na semana passada, em meio a despedidas e ao processo de passagem de bastão, ele abriu uma brecha para um desabafo e um wake up call (chamada de atenção) para executivos e empresários.

“Os executivos precisam olhar para fora da cerca das suas empresas. Há uma certa omissão de boa parte da sociedade e isso ajuda a explicar o status de baixo crescimento econômico do país”, disse Schalka ao InvestNews, reforçando que trazia sua visão pessoal sobre o tema.

Para o agora ex-CEO da Suzano, os executivos precisam se expor e defender reformas e mudanças estruturais no país, ainda que essa exposição custe acusações de ação em favor de um ou outro lado político, como já aconteceu com o próprio Schalka.

“Não sou Lula, nem Bolsonaro. Sou brasileiro”, desabafa o executivo.

Schalka foi uma das vozes a criticar o governo Bolsonaro por não conter o desmatamento na Amazônia. E também foi um dos signatários da Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito, de julho de 2022. Em janeiro de 2024, manifestou-se contra a política de subsídios à indústria adotada pelo governo Lula, que, na visão do executivo, não deram certo.

“Quando eu, de forma positiva, criticava ações do governo Bolsonaro, fui acusado de fazer o ‘L’ [expressão usada para se referir a quem apoiou a eleição do presidente Lula], coisas desse tipo. E quando eu falo do governo Lula, sou acusado de ser bolsonarista”, conta. “O Brasil precisa de reformas importantes, estruturantes. Mas temos a mania de querer endereçar o problema de curto prazo colocando band-aids.

A classe empresarial, diz Schalka, costuma pensar que sua responsabilidade está restrita às questões internas: fazer a empresa ser melhor, ganhar eficiência na operação, gerar dividendos e emprego. “Isso é responsabilidade, sim, mas não é a única. É preciso olhar para fora da cerca e fazer as transformações”, diz.

Walter Schalka, Presidente da Suzano
Crédito: Sergio Zacchi

A lista dos problemas elencados por ele é longa e conhecida: ineficiência do Estado, educação inadequada e que não prepara para o futuro, déficit de infraestrutura, invasão dos poderes legislativos, falha na segurança pública. O adiamento dessas soluções limita  o crescimento potencial do país, que hoje é perto de 2%, mas poderia – e deveria, segundo ele – estar em 5% ou 6%. 

Ver o país patinando nesses aspectos há décadas frustrou algumas vezes, admite Schalka. “Mas tenho resiliência. Temos uma responsabilidade geracional de endereçar algumas questões.”

“Tudo não terás”

Schalka foi CEO por 33 anos – antes da Suzano, ocupou essa mesma posição na Votorantim Cimentos. Nesse período, diz que não teve um único dia em que não checou e-mail e mensagens de WhatsApp. “A agenda do CEO é sequestrada”, afirmou, lembrando situações em que teve jantares com investidores em fim de semana, viagens internacionais bate-e-volta para atender clientes ou reuniões com governadores em dias, teoricamente, de descanso.

Para executivos de alto nível, como Schalka, essa dedicação costuma ter um custo alto para a família. Em meio às 30 reuniões individuais com diretores, visitas a todas a unidades da Suzano e um encontro virtual com todos os colaboradores, foi da família que veio um dos depoimentos mais emocionantes do processo de despedida de Schalka.

Mônica, com quem está casado há 39 anos, estava ao lado de Schalka no encontro virtual com os cerca de 40 mil colaboradores da Suzano. Os três filhos – Andréa, Beatriz e Gustavo – participaram virtualmente. Eles lembraram que, em meio à agenda atribulada do pai, houve sempre tempo para brincadeiras, para escorregar na grama com papelão, para buscar nas baladas de madrugada e para prestigiar todas as formaturas. “Na verdade,  a gente teve tudo”, disseram.

Eles se referiam ao lema “tudo não terás”, que o pai sempre usou, em casa e no trabalho. O lema ajudou Schalka a gerenciar a frustração de quem esteve ao seu lado, mas também foi o que levou o executivo a ser considerado uma das vozes mais equilibradas no meio empresarial.

Novo ciclo

Schalka assumiu em janeiro de 2013 a posição de CEO da Suzano. Desde então, o valor de mercado da companhia saltou de US$ 3,82 bilhões para US$ 13,1 bilhões. Crescimento que reflete, em boa medida, negócios como a aquisição do negócio de tissue (como lenços de papel) da Kimberly-Clark no Brasil, concluída em 2023, e a inauguração da fábrica da WoodSpin, joint venture entre a Suzano e a finlandesa Spinnova, instalada na Finlândia, responsável por produzir fibra têxtil sustentável, reciclável e biodegradável. Agora em junho, fechou ainda a compra de 15% da Lenzing, também acionista da Spinnova.

Em julho, a companhia deve inaugurar o projeto Cerrado, um dos maiores empreendimentos da história da companhia. Localizada em Ribas do Rio Pardo (MS), a nova fábrica recebeu investimentos de R$ 22,2 bilhões e terá capacidade de produção de 2,55 milhões de toneladas por ano de celulose de eucalipto.

Depois disso tudo, segundo Schalka, estava claro que a Suzano passaria por um novo início de ciclo de investimento. “Quando se inicia um novo ciclo, é importante que alguém que tenha o horizonte inteiro desse ciclo esteja liderando esse processo”, explica. A missão foi entregue para Beto Abreu, que assume o posto de CEO.

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Schalka permanecerá na Suzano como membro do conselho de administração e de comitês. Também estará no conselho da Vibra e seguirá participando de projetos voltados para educação. 

Antes disso tudo, tira “longas” férias de duas semanas. E diz que já está preparado emocionalmente para seu telefone tocar muito menos. “O que me move é ser um agente transformador”, diz o torcedor do Santos, que prometeu para a esposa que não passaria a almoçar em casa todo dia, como ela chegou a perguntar, brincando. Schalka terá um escritório na holding e diz que está longe o momento de colocar pijama.

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Para Fabio Kanczuk, ‘BC do futuro’ vai mirar no teto da meta de inflação (4,5%), e não no centro (3%) https://investnews.com.br/economia/para-fabio-kanczuk-bc-do-futuro-vai-mirar-no-teto-da-meta-de-inflacao-45-e-nao-no-centro-3/ Tue, 14 May 2024 17:56:28 +0000 https://investnews.com.br/?p=578789 Ninguém entendeu direito o que levou quatro diretores do Banco Central a votar por um corte de 0,5 ponto da Selic – e não em 0,25 ponto, como a maioria do comitê. Sem explicações técnicas convincentes, o que parece é que a ala dissidente fez mesmo uma escolha puramente política.

E isso deve se traduzir numa piora das expectativas de inflação, menor espaço para cortes adicionais de juros e, dessa forma, um acirramento da queda de braço entre governo e Banco Central. Eis a leitura de Fabio Kanczuk, head de macroeconomia da ASA Investments e ex-diretor de Política Econômica do Banco Central.

A ata do Copom, divulgada na manhã desta terça-feira (14) diz que todos os diretores concordam que o cenário de inflação ficou mais preocupante.  Mas diz também que quatro diretores, a despeito dessa deterioração, entenderam que o corte deveria ser mais uma vez de 0,5 ponto por causa do guidance (indicação futura) da reunião anterior, em março.

Ou seja, o BC deveria cumprir com aquilo que havia se comprometido, independentemente da piora no cenário que desenrolou-se desde então.

“Só que ninguém acreditou nessa explicação. Esse guidance era condicional. Ou seja, o 0,5 ponto só seria uma opção caso o cenário continuasse favorável, o que não aconteceu”, explica Kanczuk.

Além disso, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, já havia avisado, em Washington, que a tal sinalização de que haveria um novo corte de 0,5 ponto não estava mais valendo, diante da piora do quadro geral.

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A cereja do bolo, diz o economista, foi o fato de que os diretores dissidentes repetiram a mesma afirmação feita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, logo após a reunião do Copom. Haddad citou justamente o “guidance” como justificativa para os votos em 0,5 ponto da Selic. 

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“Foi coincidência? Acho que a verdadeira história é que esses diretores querem uma política monetária mais frouxa”, afirma. “E isso indica que o próximo presidente do BC será alguém que gosta mais de tomar risco em relação à inflação.”

Esse novo perfil do BC, na visão de Kanczuk, é coerente com a forma como a política fiscal está sendo conduzida pelo atual governo. “Vai ter uma meta, mas acho que o BC vai voltar a mirar o teto [4,5%], e não mais o centro [3%]”, explica. “Acho que a discussão sobre qual será a meta a ser perseguida vai voltar à pauta e a coisa deve ir degringolando, como está acontecendo com o fiscal.”

A preocupação com os efeitos de uma interferência política sobre a condução dos juros parece um teste à autonomia formal da autarquia, que passou a valer em 2023. Kanczuk aproveita o momento para lembrar que, sem ela, tudo poderia ter sido bem pior. A independência do BC, afinal, já vem funcionando como um mitigador de crise. Sem ela, todos os diretores do BC teriam sido substituídos simultaneamente no início deste governo. E isso poderia ter sido a porta para uma política monetária leniente de fato – uma espécie de dé javù do governo Dilma.

Em um Banco Central autônomo, cada diretor passa a ter o seu próprio mandato. Isso significa mais espaço, inclusive, para divergir do presidente do BC – é bom lembrar que, no modelo anterior, era ele quem montava o time, o que reduzia muito a chance de dissenso. Esse espaço para visões diferentes, que se vê em bancos centrais como o americano, o europeu e o britiânico, é saudável, diz Kanczuk.

Por outro lado, os argumentos técnicos que embasam os votos de cada um dos diretores precisam estar muito bem explicados, especialmente na ata da reunião, como fazem esses outros BCs. Não foi o caso agora.

“Estamos ainda no meio do caminho, ainda distantes do que faz o Fed”, afirma. E mesmo nesses países onde a autonomia do BC é algo consolidado, há o risco de alguma pressão política. “A questão”, conclui Kanczuk, “é saber como iremos atuar para não perder a independência”.

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Só a prevenção pode garantir a sustentabilidade do sistema de saúde, diz Jeane Tsutsui https://investnews.com.br/negocios/so-a-prevencao-pode-garantir-a-sustentabilidade-do-sistema-de-saude-diz-jeane-tsutsui/ Wed, 08 May 2024 11:00:00 +0000 https://investnews.com.br/?p=577503

O sistema de saúde no Brasil ainda está mais focado no tratamento do que na prevenção das doenças. Essa lógica precisa mudar num setor que tem pela frente um desafio imenso: o envelhecimento da população, que traz consigo o aumento das doenças crônicas. Quem faz o diagnóstico é a CEO do Grupo Fleury, Jeane Tsutsui.

Em entrevista ao InvestNews, Jeane diz que a contrapartida à vida mais longa é, naturalmente, o aumento nos casos de várias doenças, como as oncológicas e cardiológicas. E isso impacta o equilíbrio dos custos do setor.

“A prevenção é fundamental para que a gente consiga equilibrar e trazer mais sustentabilidade ao sistema no longo prazo”, afirma.

O protocolo da prevenção inclui diagnósticos precoces e acompanhamento ambulatorial. Práticas que podem evitar os chamados eventos agudos – que custam mais caro. E, portanto, contribuem para a sustentabilidade do sistema.

“É importante lembrar que a medicina diagnóstica, de maneira geral, corresponde a apenas 20% do custo total da saúde suplementar [planos de saúde]”, afirma.

O Fleury é um player conhecido por seu investimento em pesquisa e desenvolvimento, que permite testes mais precisos e rápidos. O grupo foi pioneiro, por exemplo, ao implementar testes da área de genoma no Brasil, por meio dos quais é possível, entre outras coisas, definir qual o tratamento mais adequado para um caso de câncer. Por meio de uma parceria com o  Hospital Israelita Albert Einstein, o Fleury segue investindo no desenvolvimento de  novos testes  na área de genômica.

Mas Jeane admite: o avanço da ciência tem um custo. E por isso o uso adequado dos recursos é fundamental. “Precisamos optar por aquelas tecnologias que trazem benefício real para o paciente”, diz. Fazer o teste certo, na hora certa, e de forma coordenada a fim de evitar repetições é o caminho a perseguir para garantir qualidade, sem desperdício.

O acesso da população aos avanços da medicina é outro desafio, diz Jeane. Ela lembra que, hoje, apenas 25% dos  brasileiros são atendidos pelo sistema de saúde suplementar. O restante conta com o atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) que, em sua visão, é “extremamente estruturado”, mas que vem lidando com uma demanda cada vez maior. 

Com um currículo acadêmico de excelência – ela tem pós-doutorado pelo University of Nebraska Medical Center (UNMC) e é professora livre-docente em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da USP –, Jeane está na cadeira de CEO do Fleury desde 2021. Mas já havia enveredado para a carreira executiva 14 anos antes. “O fato de eu ter sido médica lá no passado me traz uma visão sistêmica do setor de saúde e daquilo que a gente precisa implementar como solução”, diz.

Como uma das poucas mulheres a comandar uma empresa listada no Ibovespa, ela diz ter a responsabilidade de incentivar outras mulheres a aspirar posições de liderança. “Costumo dizer que não só a questão de gênero, mas toda a pauta de diversidade, é importante.  Sabemos que a diversidade promove mais capacidade de inovação, mais capacidade de reação diante de ambientes incertos”.

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