Site icon InvestNews

A crise da dívida dos Estados Unidos está cada vez mais perto

Apesar da crescente polarização nos Estados Unidos, os partidos Republicano e Democrata são semelhantes em um aspecto importante: ambos agem agora como se os déficits orçamentários não importassem. Políticos de direita e esquerda parecem acreditar que é possível aumentar os gastos, cortar impostos indefinidamente e tomar empréstimos para cobrir o déficit, acumulando a dívida pública — tudo isso sem pagar um preço.

Por que não agradar a todos eliminando os impostos de uma vez e tomando empréstimos para tudo? A resposta é óbvia: nenhum credor em potencial acreditaria que seria reembolsado integralmente. Eles exigiriam, portanto, taxas de juros cada vez mais altas sobre a dívida. Eventualmente, esse carrossel pararia, desencadeando uma crise sem precedentes na história dos EUA.

LEIA MAIS: A bomba da dívida americana. E os estilhaços dela no Brasil

A trajetória atual — marcada por crescentes despesas com juros e por receitas estagnadas — também pode entornar o caldo, embora de forma mais lenta. Em algum momento, o volume de dívida necessário para financiar nossos déficits excederia a disposição dos credores de emprestar suas reservas de caixa em condições que não arruinariam a economia.

O fato de isso ainda não ter acontecido não é evidência de que não acontecerá. Isso apenas comprova a sabedoria do famoso lembrete de Adam Smith: “há muita ruína em uma nação”. Podemos nos recuperar de insensatezes episódicas, mas se persistirmos nelas, estamos pedindo problemas.

Vamos relembrar a história recente. A última vez que o governo federal dos EUA teve um superávit orçamentário foi em 2001. A dívida federal detida pelo público era de US$ 3,3 trilhões, cerca de 33% do Produto Interno Bruto (PIB), e o governo estava no caminho para quitá-la completamente até o final da década.

Nas duas décadas seguintes, a combinação de cortes de impostos, aumento de gastos, guerras dispendiosas e a pressão fiscal de uma população envelhecida reverteu essa tendência. A dívida nacional detida pelo público agora supera US$ 28 trilhões, representando 99% do PIB. Somente o déficit orçamentário de 2024 será de quase US$ 2 trilhões, o que representa 7% do PIB. A Comissão de Orçamento do Congresso projeta que, até 2035, a dívida detida pelo público ultrapassará US$ 50 trilhões e a dívida total será equivalente a 122% do PIB.

Esses números podem soar abstratos, mas têm consequências reais. Ao longo do último meio século, os pagamentos de juros sobre a dívida federal foram, em média, 2,1% do PIB, em comparação com 3,1% este ano. Se as tendências atuais continuarem, o pagamento anual de juros atingirá US$ 1,7 trilhão — 4,1% do PIB — até 2034.

A Comissão de Orçamento é obrigada a basear suas estimativas na legislação atual, que inclui a extinção planejada já no próximo ano de muitos dos cortes de impostos feitos em 2017. Mas, se os cortes forem prorrogados, isso tornaria as projeções de déficit e dívida ainda piores. O escritório projeta que os gastos com defesa, que foram em média 4,2% do PIB nos últimos 50 anos, encolherão para 2,8% até 2034. O crescente peso dos pagamentos de juros, incluindo aos credores estrangeiros, dificulta a manutenção da segurança nacional de que os EUA precisam.

Talvez porque uma crise da dívida nacional pareça distante e intangível para o americano médio, os eleitores estão focados em questões mais urgentes, como preços elevados, imigração e aborto. Mas é dever dos funcionários públicos — especialmente candidatos a altos cargos — dizer ao povo o que ele precisa saber, não apenas o que quer ouvir. Ignorar questões difíceis pode render ganhos de curto prazo para os políticos, mas as futuras gerações julgarão esse silêncio de forma severa.

A dívida pública dos EUA só cresce/ Ilustração João Brito

Os políticos devem começar falando francamente sobre a rede de segurança social.

Donald Trump concorda com Kamala Harris e a maioria dos democratas que a Seguridade Social e o Medicare devem ser preservados para as futuras gerações sem cortes de benefícios. Mas a receita que alimenta esses programas não é suficiente para financiar os benefícios atuais, e ambos estão operando em déficit.

As reservas da Seguridade Social devem se esgotar em 2033, as do Medicare em 2036. Os republicanos que apoiam Trump na Seguridade Social e no Medicare estão tacitamente endossando o aumento de receita para esses programas. Por que não ser transparente com o povo americano sobre a crise que se aproxima e persuadi-los a começar a aumentar gradualmente as receitas fiscais necessárias para evitá-la?

Os orçamentos equilibrados que tivemos no final do século 20 não voltarão tão cedo. Felizmente, a sustentabilidade fiscal não requer isso. Os políticos devem, no mínimo, estabilizar a dívida pública como uma parcela do PIB para que o peso dos pagamentos de juros e do refinanciamento da dívida cresça no mesmo ritmo da economia.

LEIA MAIS: Agro bomba e exportadoras aproveitam janelas de negociação com o dólar forte

Se as projeções de crescimento econômico anual de 2% e as taxas de inflação de longo prazo forem precisas, essa meta exigiria um corte de cerca de US$ 9 trilhões, ou 40%, além da dívida projetada para a próxima década. Trazer a Seguridade Social e o Medicare de volta ao equilíbrio seria um grande passo em direção a esse objetivo, mas teríamos que fazer mais para alcançá-lo. Não podemos ignorar o déficit e a dívida indefinidamente, mesmo que gostemos de fingir que podemos.

Exit mobile version