O crescimento da IA tornou fabricantes de chips, como a Nvidia, e desenvolvedores de software, como a OpenAI, queridinhos dos investidores. Agora, o modesto disco rígido está renascendo.
As fabricantes de discos rígidos Western Digital e Seagate Technology Holdings, as duas maiores empresas do setor, relataram receitas cerca de 30% maiores em seus últimos trimestres.
Isso pode não ser uma inflexão no estilo da Nvidia ou da Oracle. Mas as fabricantes de discos rígidos têm aproveitado a carona de empresas como essas para um crescimento que seria impensável alguns anos atrás.
Sustentando esse impulso está o consumo voraz por armazenamento digital pela inteligência artificial e o aumento dos preços de unidades de maior capacidade.
Em seu último relatório financeiro, a Western Digital informou que o número de exabytes (um exabyte equivale a um bilhão de gigabytes) de armazenamento entregues aumentou para 190. Ou seja: um crescimento de 32% em relação ao ano anterior. A Seagate entregou 45% a mais de seus próprios exabytes no mesmo período.
Enquanto a história da IA permanecer intacta, há poucas dúvidas de que a trajetória dos discos rígidos continuará crescendo.
Provavelmente haverá alguma instabilidade nos próximos anos, à medida que as empresas se apressam para comprar discos rígidos e, em seguida, gastam tempo para preenchê-los.
O último impulso antes do crescimento da IA veio durante os lockdowns da Covid. Haiva muita gente trabalhando e aprendendo remotamente. Então, era preciso mais armazenamento digital.
No entanto, as coisas mudaram quando a pandemia diminuiu e as pessoas retornaram aos seus velhos hábitos. A receita global com discos rígidos caiu cerca de 30% em 2023, antes da IA, de acordo com a Gartner.
Empresas precisam de discos rígidos
A IA é diferente porque as empresas que usam grandes quantidades de dados para treinar seus modelos tendem a mantê-los em discos rígidos em vez de excluí-los quando terminam. Isso contrasta com a prática usual de reaproveitamento do armazenamento digital.
Mais crucial, talvez, é que a IA gera muitos dados na forma de texto, imagens e, cada vez mais, vídeo, que precisam ser armazenados em algum lugar.
O Google informou no mês passado que seus usuários que produzem filmes criaram 100 milhões de vídeos de IA nos três meses desde o lançamento em maio. E isso exige toneladas de armazenamento.
Não é surpresa, portanto, que a Gartner agora espere que a receita global com discos rígidos seja de aproximadamente US$ 24 bilhões no próximo ano. O valor é quase o dobro do alcançado em 2023.
Apesar disso, os investidores não aderiram de corpo e alma à onda dos discos rígidos. As ações de ambas as empresas mais que dobraram de valor no último ano, mas ainda estão longe de avaliações que mereçam atenção.
A Western Digital é negociada a cerca de 16 vezes os lucros futuros; a Seagate tem um múltiplo de 20 vezes. Essas avaliações não são pechinchas, mas também não refletem a oportunidade que as empresas têm pela frente. O índice Nasdaq, com forte presença em tecnologia, é negociado a um múltiplo médio de cerca de 29 vezes.
E a oportunidade está crescendo. A mudança na IA deu à Seagate e à Western Digital um poder sobre os clientes que elas não viam no passado.
As grandes empresas de tecnologia que oferecem serviços de computação em nuvem e desenvolvem modelos de IA de ponta precisam deles. Isso fica evidente nas vendas de discos rígidos: a computação em nuvem representou 90% da receita da Western Digital em seu último trimestre.
“Não há IA sem dados, nem dados sem armazenamento. E eles entendem isso perfeitamente”, disse Kris Sennesael, diretor financeiro da Western Digital, em uma conferência do Goldman Sachs na semana passada.
Com a demanda excedendo a oferta, os fabricantes de discos rígidos estão assinando contratos de fornecimento de longo prazo com os clientes, com prazos de um ano ou mais. O preço também está embutido neles.
Essa visibilidade e o poder de precificação deram às empresas a confiança para prever uma expansão nas margens de lucro bruto. As margens praticamente dobraram nos últimos dois anos fiscais, para cerca de 40%.
Sem competidores
Além disso, há pouca chance de que uma ameaça competitiva possa prejudicar o crescimento das empresas.
Ambas estão migrando para uma nova tecnologia de armazenamento em disco rígido chamada gravação magnética assistida por calor, ou HAMR.
O HAMR abre caminho para unidades de maior capacidade, de 30 terabytes ou mais. As empresas trabalham nessa tecnologia há muitos anos e não há um caminho fácil para os concorrentes desafiá-las.
Também há pouco com o que se preocupar na mudança para o uso de unidades de armazenamento flash — as chamadas unidades de estado sólido — em data centers. Embora os SSDs possam ser mais rápidos no acesso e na transferência de dados, os discos rígidos são significativamente mais baratos para comprar e operar.
Isso relega os SSDs a operações onde o alto desempenho é essencial. Os discos rígidos ainda representam cerca de 80% ou 90% do armazenamento de dados em data centers, sugerem estimativas do setor.
A sorte dos fabricantes de discos rígidos está intimamente ligada ao destino da IA. Um risco, sem dúvida.
Mas, em um canto da tecnologia pouco atraente, a Seagate e a Western Digital estão argumentando que o tedioso pode render bons frutos.