Medidas de Trump contra imigração fazem venezuelanos abandonar Miami

40% dos 80.000 habitantes de Doral, subúrbio de Miami, nasceram na Venezuela ou são descendentes de venezuelanos

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A casa de dois andares com telhado de terracota, em um condomínio fechado conhecido como Doral Landings East (EUA) parecia ideal para a família venezuelana de quatro pessoas que se mudou para lá há dois anos. Os vizinhos ficaram surpresos quando um dia a família desapareceu sem pagar o aluguel, segundo o proprietário, e deixando grande parte dos móveis para trás.

Um a um, venezuelanos e outros imigrantes começam a sair de Doral, um subúrbio de Miami às portas dos Everglades, conhecido por um resort de Trump, onde o presidente planeja sediar a cúpula do G-20 no ano que vem.

Muitos venezuelanos foram para lá com permissão legal temporária para trabalhar nos EUA. A liberação era parte de uma série de programas de imigração expandidos pelo governo Biden. O governo Trump está tentando revogar essa permissão, deixando mais de um milhão de estrangeiros de vários países em algum tipo de limbo legal, dependendo de seu tipo de status.

Poucos lugares nos EUA estão sentindo os efeitos da mudança na política de imigração de forma mais aguda do que Doral, onde cerca de 40% de seus 80.000 habitantes nasceram na Venezuela ou são descendentes de venezuelanos.

Alguns venezuelanos vivem ali há décadas, eventualmente se tornando cidadãos americanos e com filhos nascidos nos Estados Unidos. Outros são recém-chegados que construíram suas vidas na cidade nos últimos anos, graças aos programas temporários do governo.

Alguns dos esforços do governo Trump foram frustrados por um tribunal de apelações, mas muitos imigrantes estão partindo mesmo assim, sem saber se poderão ficar.

Casas vazias em Miami

As taxas de vacância de apartamentos em municípios ao redor de Doral são de 4,3%. Mas em Doral mesmo, essa taxa subiu de 5,6% para 6,5% no final do ano passado.

Em alguns edifícios de Doral, a taxa de vacância é muito maior — mais de 10% em alguns casos.

Corretores de locação de prédios dizem que as vagas são motivadas por venezuelanos que fugiram. Os aluguéis em Doral caíram para o menor nível em três anos.

“Todos estão me dizendo: ‘Não posso ficar, meu status temporário está expirando'”, disse Maria Eugenia Nucete, corretora imobiliária venezuelana-americana que trabalha em Doral há décadas. Em março, ela perdeu um inquilino venezuelano que se mudou para a Itália, disse ela.

A prefeita de Doral, a republicana Christi Fraga, diz que o aumento nas vagas reflete uma combinação de fatores, embora imigrantes que estão deixando a cidade por medo de serem pegos por agentes federais também seja um fator.

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“Conheço pessoalmente algumas famílias que se autodeportaram. Seu status era incerto e elas não queriam ficar aqui ilegalmente”, disse Fraga. “Tenho certeza de que isso afetará o mercado imobiliário até certo ponto.”

Aqueles que partem frequentemente deixam para trás casas, móveis, empregos e os resquícios de novas vidas. Alguns migrantes que conversaram com o The Wall Street Journal afirmam ter planos de se mudar para a Itália e a Espanha. Alguns até voltaram para a Venezuela, de acordo com uma corretora imobiliária que disse que seu cliente entregou as chaves do apartamento e deixou todos os móveis para trás.

“Nossos planos ruíram”, disse Gabriela Hernandez, de 26 anos, que afirmou que vai deixar Doral no mês que vem. Hernandez e o namorado moravam juntos em um apartamento novo de um quarto com varanda com vista para casas de milhões de dólares. Ele trabalhava como corretor de seguros e ela, como executiva de marketing em um escritório de advocacia.

O namorado dela, que esperava perder a permissão temporária, já saiu da cidade, dirigindo no meio da noite para evitar problemas com agentes federais, disse Hernandez.

Hernandez, que chegou da Venezuela há quase uma década, disse que está legalmente nos EUA enquanto aguarda a tramitação do seu pedido de asilo no sistema judicial.

O casal agora planeja se mudar para a Espanha assim que economizarem o suficiente, juntando-se ao êxodo de venezuelanos que estão deixando seu prédio em Doral, de acordo com moradores.

Status imigratório

Os proprietários de prédios de apartamentos em Doral dizem que querem saber o status imigratório de uma família antes de permitir que ela alugue. Muitos administradores de prédios estão recusando famílias, preocupados que uma decisão judicial possa, de repente, significar que ela esteja vivendo ilegalmente nos EUA.

A Lei de Moradia Justa do governo dos EUA, promulgada em 1968, proíbe a discriminação na venda e no aluguel de imóveis. Recusar pessoas por serem da Venezuela corre o risco de violar essa lei, afirmou Courtney Cunningham, advogado especializado em moradia justa em Miami.

“Pode ser visto como discriminação racial ou como um caso envolvendo alegações de discriminação com base na nacionalidade”, disse ele.

Os imigrantes representam uma parcela substancial da população de inquilinos no sul da Flórida, afirmou Juan Arias, diretor de análise de mercado da empresa de dados CoStar Group, acrescentando que 70% dos imigrantes que chegaram desde 2010 são inquilinos.

Em julho, a família de quatro pessoas em Doral Landings East fugiu de sua casa alugada de quatro quartos devido a problemas de imigração, de acordo com o proprietário. Eles pararam de pagar o aluguel de US$ 4.000 porque haviam gastado boa parte do dinheiro para pagar assistência jurídica, disse o proprietário. A família foi embora e levou mobílias e pertences pessoais. Vanesa Eguillor, corretora imobiliária do proprietário, que trabalha na área há 20 anos, disse: “Nunca vi nada parecido”.

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