Opinião: Trump está tentando destruir Harvard?

A ordem contra estudantes estrangeiros afasta os alunos mais brilhantes do mundo.

O governo Trump congelou bilhões em subsídios federais para a Universidade de Harvard, ameaçou seu status de isenção fiscal e tentou ditar seu currículo e contratação de pessoal. Agora, o governo parece decidido a destruir a universidade pelo “crime” de ter reagido. E com que propósito?

É assim que interpretamos a decisão do Departamento de Segurança Interna (DHS) na quinta-feira de proibir estudantes estrangeiros de frequentar a renomada instituição. São 6,800 mil alunos – ou um quarto do corpo estudantil de Harvard – cujos futuros estão, de repente, em desordem. Trata-se também de um ataque míope a uma das maiores vantagens competitivas dos EUA: sua capacidade de atrair os melhores e mais brilhantes do mundo.

O ataque mais recente começou quando o DHS exigiu que Harvard entregasse diversos registros de seus estudantes estrangeiros, incluindo informações sobre se algum deles participou de atividades ilegais ou deixou a universidade por envolvimento em “atividade perigosa ou violenta, ou por privação de direitos”.

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Alguns desses pedidos são razoáveis, mas outros extrapolaram, exigindo informações privadas dos alunos. O DHS também deu apenas duas semanas para Harvard responder. Caso não o fizesse, a secretária Kristi Noem afirmou que “retiraria automaticamente” a certificação da universidade no Programa de Estudantes e Visitantes de Intercâmbio (SEVP). “A retirada não estará sujeita a recurso.”

O programa SEVP permite que estrangeiros estudem em universidades norte-americanas com vistos de estudante. O DHS pode barrar universidades do programa se não cumprirem exigências como manutenção de registros, retenção e relatórios sobre estudantes estrangeiros. Harvard afirma que respondeu com “as informações exigidas por lei” dentro do prazo de duas semanas e entregou mais documentos em 14 de maio.

A sra. Noem considerou a resposta de Harvard insatisfatória e excluiu a universidade do programa. Isso significa que os estudantes estrangeiros terão de deixar o país em pouco tempo ou encontrar outra universidade nos EUA que os aceite.

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A maioria dos estudantes estrangeiros de Harvard está matriculada em programas de pós-graduação. Muitos ajudam em pesquisas científicas e no ensino de cursos de graduação. Expulsá-los vai prejudicar projetos de pesquisa e pode levar alguns professores da área de ciências a migrarem para outras universidades. Esse parece ser um objetivo do congelamento dos subsídios de pesquisa de Harvard.

Harvard entrou com um processo na sexta-feira, e um juiz federal emitiu uma ordem judicial temporária suspendendo a proibição aos estudantes. A universidade afirma corretamente que as ações do governo são “uma retaliação clara por Harvard exercer seu direito da Primeira Emenda ao rejeitar as tentativas do governo de controlar sua administração, currículo e a ‘ideologia’ de seus professores e alunos.”

A universidade tem boas chances de vencer com base na legislação, mas, até que os tribunais decidam o mérito da questão, milhares de estudantes que não cometeram nenhum erro estarão em situação jurídica indefinida. Alguns certamente se opuseram aos protestos anti-Israel e talvez até sejam israelenses. Por que puni-los?

As táticas da equipe Trump contra Harvard lembram como o governo Obama cortou a ajuda estudantil à rede de faculdades com fins lucrativos Corinthian Colleges, sob o pretexto de uma resposta supostamente lenta a exigências amplas de documentos. A educação de milhares de alunos foi interrompida para que o governo Obama pudesse exibir uma “vitória” política.

Isso será terrivelmente prejudicial à capacidade dos EUA de atrair jovens talentosos que trazem com eles seu capital intelectual e espírito empreendedor. Em 2022, estrangeiros representaram mais da metade dos doutorados concedidos em áreas ligadas à inteligência artificial. Muitos foram trabalhar em empresas como a Nvidia ou fundaram seus próprios negócios.

A Fundação Nacional de Política para a América constatou que “imigrantes fundaram ou cofundaram quase dois terços (65% ou 28 de 43) das principais empresas de IA nos EUA, e 70% dos estudantes de pós-graduação em tempo integral nas áreas relacionadas à IA são estrangeiros.” Imigrantes também fundaram mais da metade das startups privadas dos EUA avaliadas em mais de US$ 1 bilhão.

Mesmo que seja modificada, a ordem da sra. Noem vai repercutir no mundo todo como um sinal de que os EUA não estão mais dispostos a educar os jovens mais brilhantes do planeta. Esses estudantes vão entender o recado e levar seus talentos para outro lugar. O politburo chinês deve estar rindo da sorte de ter um adversário que se sabota – primeiro com tarifas que enfraquecem sua competitividade, agora com um ataque ao talento estrangeiro.

Como grande parte do ensino superior americano, Harvard precisava de um choque para retornar à sua missão de formar mentes abertas. Mas isso exige reformas. O governo Trump parece achar que é preciso destruir Harvard para salvá-la. Isso é o oposto de “tornar a América grande”.

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