Por que as tarifas de Trump não impulsionaram a inflação nos EUA?

Nova pesquisa sugere que as tarifas reais estão bem abaixo do que os economistas suspeitavam

As tarifas mais altas em quase um século não provocaram um aumento repentino da inflação. O fenômeno intrigou economistas, alguns dos quais suspeitam que as empresas até agora simplesmente estão relutando em repassar os custos extras aos seus clientes.

Mas outro argumento para o impacto limitado está ganhando força: as tarifas pagas pelos importadores são menores do que o anunciado.

Em um novo estudo, economistas do Barclays analisaram dados do censo para verificar quais tarifas os importadores realmente pagaram em maio. Eles descobriram que a alíquota média ponderada da tarifa — a média de todas as tarifas, ajustada pelo volume de importação de cada país — naquele mês foi de cerca de 9%. Esse número está bem abaixo da taxa de 12% que eles haviam estimado anteriormente com base em anúncios da Casa Branca e muito menor do que o estimado por outros.

O motivo é que metade das importações dos EUA ficou isenta de impostos, mostra o estudo do Barclays, e porque muitas empresas e consumidores americanos compraram menos de países com tarifas mais altas, especialmente da China.

“A verdadeira surpresa na resiliência da economia americana não está em sua reação às tarifas, mas no fato de que o aumento da alíquota tarifária efetiva foi mais modesto do que se pensava”, afirma o relatório do Barclays.

Economistas do JPMorgan argumentam que as alíquotas tarifárias reais em junho foram menores do que as médias sugerem porque os importadores migraram para países com tarifas mais baixas ou para produtores nacionais.

Essas tarifas efetivas mais baixas podem ajudar a explicar por que os preços ao consumidor não subiram tão rapidamente quanto alguns analistas temiam.

Impacto das tarifas

O impacto das tarifas tem sido um tema controverso. Trump afirmou esta semana que as tarifas não causaram inflação e pediu ao Goldman Sachs que substituísse um economista que havia previsto aumentos de preços.

As novas tarifas arrecadaram US$ 58,5 bilhões entre janeiro e junho, de acordo com o Modelo Orçamentário da Penn Wharton.

E a inflação tem subido nos últimos meses, com o aumento dos preços de bens importados, como móveis.

As últimas leituras de inflação permanecem bem acima da taxa de referência do Federal Reserve (Fed), de 2% em relação ao ano anterior. Em julho, os preços no atacado subiram à maior taxa mensal em três anos e bem acima das previsões dos economistas.

Mas o quadro geral da inflação nos primeiros seis meses do ano não foi tão ruim quanto muitos temiam após os aumentos de tarifas do presidente Trump.

Pesquisas do Barclays sugerem que a inflação não aumentou tanto, em parte porque os EUA não cobraram tarifas sobre muitos produtos — por enquanto.

Em junho, apenas 48% das importações americanas estavam realmente sujeitas a tarifas, graças a inúmeras isenções, de acordo com a análise do banco com base em dados do U.S. Census Bureau.

Bens como produtos farmacêuticos, certos eletrônicos e semicondutores, além de muitas importações do Canadá e do México, foram isentos das chamadas tarifas recíprocas de Trump. Há também isenções parciais para produtos com pelo menos 20% de componentes fabricados nos EUA.

No entanto, de acordo com o Barclays, as taxas efetivamente pagas pelos importadores provavelmente aumentarão nos próximos meses.

Muitas das brechas existentes poderão ser fechadas. Trump ameaçou impor tarifas de 250% sobre produtos farmacêuticos e de 100% sobre semicondutores.

A Casa Branca também informou que, a partir do final deste mês, suspenderá a isenção de minimis, que permite remessas isentas de impostos para os EUA, desde que o valor seja igual ou inferior a US$ 800.

Outros economistas, utilizando metodologias diferentes, fixaram as tarifas em valores muito mais altos. O Laboratório de Orçamento de Yale, um centro de pesquisa de políticas públicas, por exemplo, estima que os consumidores americanos atualmente enfrentam tarifas médias efetivas de 18,6%, abaixo dos 21,9% do final de maio. O diretor de economia do laboratório, Ernie Tedeschi, afirma que sua pesquisa também mostra que a taxa média real paga pelas empresas tem sido menor.

Em última análise, o Barclays espera que as tarifas médias ponderadas acabem em torno de 15%, acima dos atuais 10% e 2,5% do ano passado. Outros economistas calculam taxas ainda mais altas. Isso pode significar que grande parte do provável impacto tarifário ainda esteja no futuro.

As tarifas gerais pagas também foram menores do que as taxas base sugerem, porque muitas empresas americanas estão importando menos produtos que enfrentam tarifas elevadas, principalmente da China.

Inflação

Mas parte disso também pode ser temporário. As empresas americanas importaram mais no início do ano para se antecipar às tarifas, o que levou a importações menores nos meses seguintes. Com a redução dos estoques, as importações provavelmente aumentarão novamente. “Não está claro se é possível se desvincular da China com tanta força e rapidez”, diz Mark Cus, economista do Barclays.

Barry Roth, que importa carros usados do Canadá para concessionárias americanas, diz ter importado em média cerca de 1 mil carros por mês no ano passado, até novembro.

Em janeiro, esse número subiu para quase 1.500, à medida que as concessionárias tentavam se antecipar às tarifas. Agora, com muitos carros do Canadá enfrentando impostos de 25%, ele diz ter sorte em importar 400 veículos por mês.

Mas, à medida que as concessionárias esgotam seus estoques ampliados, elas terão que pagar as tarifas ou ter menos carros para vender. De qualquer forma, ele diz, os preços provavelmente subirão. “Isso não vai acontecer amanhã, nem na semana que vem, mas vai ter aumento”, diz Roth.

Enquanto isso, mais empresas afirmam que estão cada vez mais propensas a repassar as tarifas aos seus clientes nos próximos meses.

Muitas empresas demoraram a aumentar os preços enquanto aguardavam para o que aconteceria com as taxas. Agora que as tarifas finais estão se tornando mais claras, economistas esperam um fluxo constante de empresas pedindo que seus clientes paguem mais. “As empresas estão sendo estratégicas em relação aos aumentos de preços”, afirma Aditya Bhave, economista do Bank of America.

A empresa World Emblem, de Randy Carr, sediada na Flórida, importa apliques para uniformes da China, Vietnã e Camboja, para policiais e socorristas dos EUA. Inicialmente, não aumentou os preços em resposta às tarifas, pois as taxas anunciadas mudavam constantemente, e não queria afastar os clientes ajustando seus preços constantemente. Pagar as tarifas custou à empresa mais de US$ 1 milhão.

Agora, ele se sente mais confiante sobre a aplicação das tarifas, e sua empresa está aumentando os preços dos apliques fabricados no Leste Asiático em 6% a 25% a partir de setembro. “Simplesmente não faz mais sentido esperar“, diz ele.

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