Newsletter

Trump quer reviver a indústria naval dos EUA, mas é mais difícil do que se imaginava

O estaleiro Hanwha Philly Shipyard, adquirido por uma empresa sul-coreana e encarregado de reviver a indústria naval americana, agora precisa construir um submarino nuclear pela primeira vez

Publicidade

Quando o presidente Trump anunciou recentemente seu apoio à Coreia do Sul para construir um submarino movido a energia nuclear nos Estados Unidos, ele destacou o local onde quer que isso aconteça: um histórico estaleiro na Filadélfia.

O Philly Shipyard, comprado no ano passado pela gigante naval sul-coreana Hanwha Ocean, já era peça central dos ambiciosos planos de Trump para revitalizar a indústria naval americana e reduzir o enorme abismo marítimo com a China.

Agora, a perspectiva de também construir um submarino nuclear na Filadélfia elevou ainda mais a ambição — e a dificuldade — do projeto.

Quando a Hanwha comprou o Philly Shipyard por US$ 100 milhões, o estaleiro americano estava dando prejuízo. Hoje, ele é o centro de um compromisso sul-coreano de US$ 150 bilhões para ajudar Trump a reviver a indústria naval dos EUA — um dos projetos de reestruturação industrial mais ambiciosos das últimas décadas.

A Hanwha planeja investir US$ 5 bilhões no local, tentando reconstruir a força de trabalho e a cadeia de suprimentos de construção naval que praticamente desapareceram. Atualmente, os EUA produzem menos de 1% dos navios do mundo. A China é, de longe, a maior fabricante global, com mais de 230 vezes a capacidade naval americana e muito mais navios mercantes.

O sonho de Trump de ressuscitar a construção naval americana depende fortemente da ajuda sul-coreana. Como maior rival da China no setor, a Coreia do Sul — aliada próxima de Washington — viu nas parcerias marítimas uma oportunidade estratégica durante as negociações comerciais com os EUA. Em uma jogada simbólica, autoridades de Seul chegaram a presentear seus colegas americanos com bonés vermelhos estampados com o slogan: Make America Shipbuilding Great Again.

Os projetos conjuntos EUA–Coreia incluem o reparo de embarcações militares americanas, o auxílio no design de navios de abastecimento da Marinha e o suporte a empresas dos EUA para expandir sua capacidade, treinar trabalhadores e tornar a produção mais eficiente.

Mas o Philly Shipyard é o elemento mais crucial. Se for bem-sucedido, poderá servir de modelo para outros estaleiros americanos em dificuldades — mas isso exigirá persistência política, um grande contingente de trabalhadores e investimentos profundos.

Um navio cargueiro saindo do porto de Yangshan, em Xangai. Foto: Bloomberg

O estaleiro ocupa um terreno com origens anteriores à Declaração de Independência e que foi fundamental para a criação da Marinha dos Estados Unidos.

Nas últimas décadas, porém, a Filadélfia perdeu seu antigo prestígio, à medida que os EUA reduziram sua própria produção de navios e países estrangeiros dominaram o mercado com custos menores e, depois, tecnologia superior. Atualmente, o Philly Shipyard produz apenas um navio comercial por ano — o equivalente à produção de uma semana da Hanwha na Coreia.

A empresa quer elevar essa produção para 20 navios por ano, aumentar a força de trabalho em milhares de pessoas e adicionar novos guindastes pesados, robótica e centros de treinamento.

Publicidade

“O objetivo é trazer um pouco da abordagem sul-coreana para a Filadélfia”, disse David Kim, texano que deixou a divisão de defesa da Hanwha para se tornar o novo CEO do estaleiro. “Precisamos mudar”, afirmou. “Não podemos continuar fazendo as coisas do jeito que sempre fizemos.”

Uma mão amiga

A Hanwha nunca construiu um submarino nuclear, e os EUA protegem rigidamente essa tecnologia, mesmo de seus aliados. Desde o anúncio de Trump, autoridades e parlamentares de Seul questionam se o estaleiro está à altura da tarefa — e sugerem que o submarino poderia ser construído mais rapidamente na Coreia do Sul.

“O Philly Shipyard tem deficiências significativas em termos de tecnologia, mão de obra e infraestrutura”, disse o ministro da Defesa Ahn Gyu-back, ao defender a produção local como “uma opção razoável”.

“Com novas tecnologias, investimento em trabalhadores americanos e uma parceria profunda com a Coreia, o Philly Shipyard pode voltar a ser um centro de construção naval avançada, tanto comercial quanto militar”, afirmou Alex Wong, diretor de estratégia da empresa.

A legislação americana proíbe a construção de embarcações militares ou comerciais fora do país. No entanto, um projeto de lei apresentado na Câmara em agosto propôs relaxar essas restrições para parceiros de confiança como Coreia do Sul e Japão.

“Por que não deveríamos nos ajudar mutuamente?”, disse o deputado Ed Case, democrata do Havaí e um dos patrocinadores da proposta.

Foto: Adobe Stock

Em uma manhã recente no estaleiro, um enorme guindaste “Goliath” dominava o horizonte, pintado com o novo laranja Hanwha. Acima da bandeira da empresa, tremulava uma bandeira americana. Cerca de 100 funcionários — menos de 10% da força total — são coreanos.

Para acelerar a produção, os dois diques secos do estaleiro serão usados para novas construções, em vez de reservar um deles para acabamentos e comissionamento. A Hanwha também abrirá mais oficinas de pintura e jateamento e ampliará os centros de treinamento para receber novos recrutas.

Segundo uma fonte próxima à empresa, a Hanwha estuda expandir suas operações na região da Filadélfia para garantir capacidade para futuros projetos. A meta interna é produzir de dois a três submarinos nucleares por ano nos EUA dentro de uma década.

O estaleiro ganhou um grande impulso no verão, quando a divisão de transporte marítimo da Hanwha encomendou 12 petroleiros e navios de gás natural liquefeito de médio porte — a maior compra do tipo nos EUA em décadas. A entrega do primeiro navio está prevista para 2028.

Publicidade

“A única maneira de construirmos navios com rapidez suficiente é fazendo parceria com um país líder em construção naval, como a Coreia”, disse a senadora Tammy Duckworth (Democrata de Illinois), que se reuniu com o presidente Lee Jae Myung e executivos do setor na Coreia do Sul no início do ano.

Mais oportunidades

A recuperação da indústria naval dos EUA dependerá de jovens como Eion Phillips, de 26 anos, de Williamstown, Nova Jersey.

Phillips tem a construção naval no sangue — seu bisavô trabalhou no Estaleiro Naval da Filadélfia a partir dos anos 1950 e chegou a se tornar encarregado. Mas até um amigo mencionar a onda de contratações da Hanwha, ele nunca havia considerado seguir esse caminho. Antes, trabalhou como carteiro e jardineiro comercial. Hoje, faz parte da empresa — e já convenceu dois amigos a se candidatarem também.

“É empolgante saber que haverá mais coisas para fazer, mais oportunidades, mais espaço para crescer”, disse Phillips.

Neste ano, após a aquisição pela Hanwha, o número de candidatos ao programa de aprendizado técnico da empresa triplicou. Agora, centenas disputam uma das 25 vagas disponíveis em cada nova turma.

Esses cargos levam a empregos com salários sindicais, começando em cerca de US$ 48 mil anuais.
Mais de 120 aprendizes como Phillips devem ingressar na Hanwha este ano, com previsão de chegar a 500 por ano nos próximos, segundo Megan Heileman, responsável pelo programa de aprendizes no estaleiro.

“Muitos desses candidatos têm diploma universitário ou até mestrado”, contou. “Eles só estão em busca de algo diferente.”

Em seu discurso inaugural, em janeiro, dentro de um grande galpão, o CEO David Kim disse aos funcionários: “Queremos investir nas instalações e nas pessoas.”

Texano, Kim arrancou risos ao dizer aos mais de mil presentes que torce pelos Dallas Cowboys, rivais da equipe local Philadelphia Eagles. Ele explicou que o mascote do time de beisebol da Hanwha na Coreia também é uma águia. O time de softball do estaleiro adotou o nome Hanwha Eagles, e Kim diz ver funcionários circulando com camisetas do grupo.

Sua fidelidade aos Cowboys, porém, ainda rende piadas. “Eles ainda não me perdoaram por isso”, brincou.

Escreva para Timothy W. Martin em timothy.martin@wsj.com

Publicidade
Exit mobile version