Um drinque ou um baseado: o que é pior para a saúde?

Ambos podem fazer mal. E o debate se complica dado o menor número de pesquisas sobre os efeitos da cannabis

Um foco renovado nos efeitos do álcool na saúde reacendeu um debate comum: qual é o pior, o álcool ou a maconha?

Desculpe, pessoal, mas a resposta mais simples é que ambos podem ser ruins.

“A realidade é que, se você está realmente preocupado com sua saúde, não usaria nenhum deles”, diz Ryan Vandrey, professor da Universidade Johns Hopkins que ajuda a administrar o Cannabis Science Lab.

A resposta mais completa: a questão é complicada pelo fato de que o álcool tem sido amplamente estudado há décadas, enquanto a pesquisa sobre cannabis, particularmente na forma comestível, ainda está muito atrás.

“As pessoas estão bastante conscientes do fato de que, se beberem grandes quantidades de álcool por longos períodos, haverá consequências para a saúde”, diz Staci Gruber, diretora do programa Marijuana Investigations for Neuroscientific Discovery (Pesquisas sobre Marijuana para Descobertas Neurocientíficas) do McLean Hospital em Belmont, em Massachusetts. “Não há muita informação sobre a cannabis em termos de literatura.”

Existem certos efeitos negativos que ambas as substâncias compartilham: elas prejudicam o funcionamento cognitivo de curto e longo prazo. Isso prejudica o julgamento, a atenção e a coordenação, aumentando o risco de acidentes com veículos, quedas e outras lesões. Ambos também podem se tornar viciantes e podem ter consequências significativas para a saúde mental, principalmente quando usados em excesso.

Algumas pessoas dizem que o THC — o composto psicoativo da cannabis que deixa você chapado — não atrapalha o sono da mesma forma que o álcool, nem causa ressaca. Mas os médicos dizem que pode deixar algumas pessoas grogues no dia seguinte. A cannabis pode ter menos calorias do que o álcool, mas ambas as substâncias podem fazer com que as pessoas comam mais.

O álcool está na berlinda. O ex-cirurgião geral dos EUA recentemente pediu que as bebidas alcoólicas exibissem avisos de câncer devido às suas ligações de longa data com sete tipos da doença — incluindo o de mama e o colorretal.

O grande consumo de álcool também pode causar problemas cardíacos e hepáticos e levar à pancreatite, inflamação perigosa do pâncreas. O álcool enfraquece o sistema imunológico, e beber demais, mesmo em uma única ocasião, pode prejudicar a capacidade do corpo de se defender contra infecções por até 24 horas.

As ligações da maconha com o câncer são menos claras. Há evidências de que fumar THC pode aumentar o risco de câncer. Um estudo de agosto no periódico JAMA Otolaryngology-Head & Neck Surgery comparou pacientes com e sem transtorno por uso de cannabis e descobriu que os primeiros tinham 3,5 a cinco vezes mais chances de serem diagnosticados com câncer na cabeça e no pescoço.

“Elaboramos uma hipótese e assumimos que fumar cannabis tem maior probabilidade de aumentar o risco de câncer de cabeça e pescoço”, diz o dr. Niels Kokot, cirurgião de cabeça e pescoço da Keck Medicine da Universidade do Sul da Califórnia e autor sênior do estudo. Não está claro se a ingestão de THC também representaria um risco, diz ele, enquanto o tabaco ainda é um risco maior de câncer de cabeça e pescoço.

Petrópolis
Um médico pediu que as bebidas alcoólicas exibissem avisos de câncer devido às suas ligações com sete tipos da doença. REUTERS/Peter Nicholls

Kokot diz que seu grupo de pesquisa agora está verificando dados que analisam o transtorno por uso de cannabis e o câncer de pulmão e pretende analisar outros cânceres não inalatórios também.

“Sabemos que o tabaco causa câncer de estômago e bexiga”, diz ele. “A principal conclusão é que a cannabis parece ter ligações com o câncer. Presumimos que esteja relacionado a fumar cannabis, mas não sabemos disso com certeza e não sabemos qual quantidade chega ao nível de perigo. Mas essa associação parece muito forte e válida.”

Vandrey observa que, embora fumar maconha esteja ligado a problemas pulmonares, o consumo de comestíveis não traz os mesmos riscos para os pulmões, embora ainda não esteja claro se o uso crônico pode levar ao câncer ou outras doenças ao longo do tempo.

Para vinculá-la ao risco de câncer em longo prazo, são necessários de 20 a 30 anos de pesquisa, explica ele.

“Acho que as próximas décadas nos dirão muito sobre a cannabis e o risco de câncer”, diz Vandrey. "Mas o importante é que, se você está preocupado com o câncer, o uso excessivo de uma droga recreativa não é uma boa ideia.”

Gruber diz que é difícil comparar o álcool, que é uma molécula única, com a cannabis, que é uma planta multicomposta e usada de muitas maneiras diferentes por diversas razões.

A maioria dos produtos de THC também contém outros canabinoides, e há alguns dados que sugerem que alguns deles podem ser úteis contra o câncer.

“Não podemos descartar o impacto de outros compostos”, diz Gruber. “De 90% a 95% das vezes as pessoas não estão usando THC isolado no mercado recreativo.”

Por exemplo, alguns dos efeitos neurocognitivos do THC podem ser mitigados com canabidiol, comumente referido como CBD, ou outros compostos. O CBD é um produto químico da planta de cannabis que não produz o “barato” e é comumente usado para dor e ansiedade.

Além disso, a cannabis é consumida de muitas formas diferentes, que conferem efeitos diferentes, diz ela.

Por outro lado, os comestíveis — assim como outras formas de THC — têm seus próprios riscos únicos. Talvez o mais conhecido seja o potencial de psicose de curto prazo — paranoia intensa, delírios ou mesmo alucinações. Isso é especialmente verdadeiro quando os usuários consomem inadvertidamente muito THC, o que está se tornando um risco maior, pois os produtos são mais potentes e às vezes mais fortes do que o indicado.

Os comestíveis podem levar até duas horas para produzir efeitos, às vezes levando as pessoas a consumir mais do que deveriam. Isso aumenta as chances de apresentar sintomas psicóticos.

Se você tem doença cardíaca, o THC em qualquer forma pode aumentar a frequência cardíaca ou diminuir drasticamente a pressão arterial, resultando em possíveis danos à saúde. E pessoas com ou em risco de certos transtornos mentais, como esquizofrenia ou transtorno bipolar, podem ter reações ruins ao THC, seja fumado ou ingerido.

O uso excessivo de THC também pode resultar na síndrome de hiperêmese canabinoide, ou CHS, condição cíclica de vômito que muitas vezes leva as pessoas ao pronto-socorro.

Alguns estudos descobriram que o álcool é mais prejudicial em nível social do que a maconha, mas a maioria desses estudos foi conduzida quando a cannabis era ilegal.

Gruber diz que os consumidores de cannabis recreativa devem estar atentos ao “que há em sua maconha”.

Exit mobile version