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Crédito de carbono não é investimento

Sim, ele pode trazer lucro para empresas. Mas é fundamental que essa não seja a meta para o uso desse instrumento.

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“As alterações climáticas induzidas pelo homem estão afetando o planeta. Globalmente, 2023 foi o ano mais quente já registrado”. Esse é o trecho do primeiro parágrafo de um estudo publicado pela Agência Europeia do Ambiente, e ele dá o subsídio necessário para afirmar que não, o crédito de carbono não é um investimento.

O estudo continua: “A temperatura média global no período entre fevereiro de 2023 e janeiro de 2024 excedeu os níveis pré-industriais em 1,5°C”. E eu afirmo: o crédito de carbono foi criado para financiar o combate ao aumento da temperatura, que pode extinguir toda a vida humana do planeta. A meta combinada pelos países no Acordo de Paris é limitar o aquecimento a 1,5°C até 2050.

Para atingirmos essa meta foi criado o crédito de carbono. Diferentemente de outros tipos de créditos, ele foi feito para ser aposentado. “Aposentar” um crédito de carbono quer dizer que uma empresa investiu em um projeto, por exemplo, de preservação ambiental de uma floresta tendo como retorno a neutralização dos gases que emitiu para para fabricar seus produtos. Após esse saldo ser cientificamente comprovado, a empresa dá baixa de tais créditos na sua demonstração financeira.

Na prática, uma indústria que emitiu 1 milhão de toneladas-equivalentes de CO2 no ano de 2023 vai ser incentivada pelo crédito de carbono a preservar uma floresta ou evitar o aumento das suas emissões – primeiro para neutralizá-las, obtendo saldo zero. Quando a companhia captura mais carbono da atmosfera do que emite, ela gera um saldo negativo de suas emissões, possibilitando a certificação dos créditos de carbono. Esse excedente pode ser vendido pela empresa, que obtém um lucro. 

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Porém, a meta principal da empresa não é lucrar com os créditos de carbono. É neutralizar suas emissões de gases nocivos. Mesmo com essa possibilidade de retorno financeiro com os créditos, eles não foram criados para esse fim. 

O crédito de carbono é um instrumento para incentivar a neutralização das emissões de gases da empresa e de sua cadeia de valor. E isso já é muito. Não se esqueçam de que não estamos cobrando os muitos anos de emissão desenfreada por essa empresa, só os anos atuais e futuros.

Crédito de carbono também não é um empréstimo para financiar uma empresa. Não é um LCI ou LCA, as chamadas letras de crédito imobiliário ou agrícola cujos investimentos financiam os devidos setores da economia. O crédito de carbono não foi criado para que o investidor tenha retorno financeiro. 

Ele veio para ser um instrumento tangível de financiamento das questões climáticas; um incentivador para que governos, empresas e sociedade enxerguem de forma tangível que há uma forma de lutarmos essa guerra climática. 

Nesse sentido, o novo marco legal dos créditos de carbono que está para ser votado no Senado não deve ter foco financeiro ou econômico. Deve apenas promover esse instrumento como um incentivo à redução das emissões de gases nocivos à atmosfera.

No entanto, um dado alarmante segundo o Relatório da Organização das Nações Unidas publicado em 2023: o mundo está caminhando até 2050 para um aumento de temperatura de 2,5°C a 2,9°C, acima dos níveis pré-industriais. 

Ou seja, se continuarmos tratando o crédito de carbono como um instrumento financeiro, continuaremos a seguir essa trilha de destruição, temos que mudar a rota. E isso começa pela compreensão da natureza do crédito de carbono – do por quê de ele ter sido criado.

Alexandre Furtado é economista, Presidente da Comissão de Crédito de Carbono da Associação Brasileira de Carbono (ABCarb) e Sócio da Grant Thornton

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade dos autores e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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