Colunistas

Viés de confirmação: por que investidores preferem o que já sabem

Pessoas que apoiam ou se opõem a uma questão não só buscam informação que confirmem suas crenças como rejeitam os dados que não as favorecem.

Publicado

em

Tempo médio de leitura: 4 min

Um dos prêmios mais singulares do cinema e do streaming é o Oscar da economia comportamental. É informalmente atribuído desde 2015 por Cass Sunstein, pesquisador e professor, a atores, atrizes, filmes e diretores que levam para a tela e conceitos que unem psicologia e economia. Por exemplo, em 2020, a atriz Sutton Foster, da série Younger, foi a vencedora por usar um truque de ancoragem em um episódio para conseguir emprego.

Fake Art, documentário que entrou no Netflix no ano passado, não esteve entre os vencedores. Mas merecia a lembrança. É a história do maior escândalo do mundo da arte dos Estados Unidos, a falsificação de quadros de artistas famosos que enganou marchands e especialistas, além, claro, dos compradores, que pagaram dezenas de milhões de dólares por obras supostamente originais de artistas celebrados que no fim não valiam nada.

Uma questão do filme é se Ann Friedman, a galerista que vendeu os quadros, é cúmplice ou mais uma vítima do esquema. A maioria dos entrevistados prefere a condenação, apontando as comissões recebidas nas vendas. Mas, assim como os especialistas que deram credibilidade às obras, seu comportamento sugere que ela foi influenciada pelo viés de confirmação e não a intenção de enganar seus clientes.

O fascínio por estar envolvida na descoberta de obras inéditas de ícones como o rebelde  Jackson Pollock levou não só a marchand como outros especialistas a fecharem os olhos para o óbvio: estavam lidando com uma dupla de picaretas com uma história inverossímil. Quanto mais as evidências apontavam para a fraude, mais a galerista, com a crença inabalável, lutava para provar que os quadros eram verdadeiros.

É um comportamento familiar para a maioria das pessoas. Ignorar a voz da razão, considerando apenas a informação que confirma nossas crenças tem sido um problema em tempos tão polarizados, vide a discussão sobre a covid-19 ou vacinas. Pessoas que apoiam ou se opõem a uma questão não só buscam informação que confirmem suas crenças como rejeitam os dados que não as favorecem.

No caso dos investidores, o viés de confirmação explica comportamentos como o efeito-disposição, a tendência a vender depois de um curto período de tempo os ativos que estão subindo, e a fazer um excesso de transações, segundo um estudo publicado em 2019 no International Journal of Economy and Finance.

Investidores em geral reagem de maneira mais favorável à informação que confirma suas estratégias, ignorando os dados negativos? Para testar, o autor do trabalho, Chu Jin Cheng, montou um experimento com 125 voluntários recrutados na internet. Eles tinham de imaginar se investiriam em um fundo com gestão ativa mais arriscado e mais rentável, ou em um fundo de índice, que rendia menos e também oscilava menos.

Em seguida, cada participante precisou escolher entre ler um artigo favorável ou um artigo contrário à gestão ativa. Por último, foi dada às pessoas a chance de revisar suas escolhas de investimento e mudá-las, se fosse o caso.

O primeiro resultado demonstrou como, tomada uma decisão, resistimos a confrontá-la com informações contrárias. Entre o grupo que investiria com mais risco, só 15% se interessaram em ler informações negativas sobre a gestão ativa. Já entre investidores que preferiam fundos de índice, praticamente 70% preferiram ler críticas à aplicação de maior risco.

Depois da leitura, a maioria (56%) dos investidores em gestão ativa continuava convicta se o artigo lido era positivo. Mas, quando o artigo era negativo, 40% passaram a preferir o investimento menos volátil. Esse índice superou até mesmo o percentual (29%) de pessoas que investiriam com menor risco e leram críticas à opção mais arriscada. Só não foi maior do que os investidores mais moderados que se empolgaram com a gestão ativa após um artigo favorável. Nada menos do que 42%.

Investidores acabam considerando mais confiável a informação que aponta que estão fazendo a coisa certa. Por isso, buscam confirmar suas expectativas selecionando o que lhes favorece. Mas se confrontados com dados mais complexos, tendem a adaptar seus portfólios. O que deixa uma certeza: para tudo na vida, como para seus investimentos, quanto mais variada a informação, melhor.

Veja também

  • Os melhores fundos de ações, multimercado e renda fixa do semestre
  • O que é CDI? Entenda o que significa e qual a relação com seus investimentos
  • Número de investidores ativos na bolsa avança 42,9% em junho
  • Dólar, dividendos e reforma: 3 falas de Paulo Guedes que mexeram com o mercado

Mais Vistos