Economia
Após nota da S&P, Brasil tem longo caminho até retomar ‘selo de bom pagador’
Agência de risco seguiu Fitch e Moody’s, colocando nota de crédito do país dois níveis abaixo do chamado grau de investimento.
A agência de classificação de risco S&P elevou a nota de crédito do Brasil de BB- para BB, com perspectiva estável, o que não indica alterações nos próximos meses. Ainda assim, o anúncio feito na terça-feira (19) trouxe de volta à tona as discussões sobre quando o país pode reconquistar o grau de investimento – conhecido como “selo de bom pagador”–, perdido em setembro de 2015.
Por ora, a decisão da S&P apenas iguala o rating soberano à nota atribuída pelas outras duas principais agências, Fitch (BB) e Moody’s (Ba2). Nos três casos, o Brasil tem uma classificação ainda em “grau especulativo”, estando dois níveis abaixo do grau de investimento (investment grade ou IG).
“O Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer para recuperar grau de investimento”.
Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para a América Latina, em nota após anúncio da S&P.
Para o economista, apesar da notícia positiva, o país tem um “mix de política macro e micro” que é “incompatível” com tal selo. Em contrapartida, “três degraus abaixo do grau de investimento, com contas externas boas, era um exagero”, emenda o diretor do Goldman Sachs na região referindo-se à nota até então atribuída pela S&P ao Brasil.
Segundo a equipe de estratégia do JPMorgan liderada por Emy Shayo, os dois principais obstáculos que impedem o Brasil de alcançar o grau de investimento são o nível de endividamento e o baixo crescimento econômico. Ainda assim, os estrategistas destacam que a “espinha dorsal” para a S&P melhorar a nota foi uma avaliação mais positiva de ambos os quesitos.
PIB x rating
Em nota, a agência de classificação de risco destacou a aprovação da reforma tributária, encerrando uma pauta que tramitava há mais de 30 anos no Congresso, combinada com as perspectivas de crescimento econômico neste ano. Aliás, relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) recolocou o Brasil no ranking das maiores economias do mundo.
Divulgado no mesmo dia, a estimativa de que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2023 some US$ 2,1 trilhões (+3,1%) fez com que o Brasil subisse duas posições e ficasse em nono lugar na lista dos maiores PIBs do planeta, à frente do Canadá e da Rússia. Falta agora uma escalada igual para o país voltar a ser grau de investimento.
Porém, cálculos do JPMorgan usando apenas os ratings da S&P indicam que os países que perderam o grau de investimento demoraram quase 10 anos, pelo menos, para recuperar o selo mais tarde. Em média, a espera dura pouco mais de 7 anos. No caso do Brasil, porém, já se passaram 8 anos e três meses desde o rebaixamento pela agência.
Além disso, os estrategistas do JPMorgan destacam, em relatório, que o Brasil ultrapassou o Canadá “por um fio de cabelo”, depois de ficar para trás na lista em 2022. Ainda assim, com base no PIB nominal em dólares, o banco destaca que o Brasil pode se tornar a oitava maior economia do mundo nos próximos cinco anos, sob essa mesma métrica.
E eu com isso?
Apesar de ter sido apenas um “catch up” da S&P, igualando-se à Fitch e à Moody’s, a reação do mercado doméstico à notícia na véspera foi positiva. O Ibovespa renovou o recorde de pontuação pelo segundo pregão seguido, aproximando-se da marca dos 132 mil pontos, enquanto o dólar fechou cotado abaixo de R$ 4,90.
A expectativa de uma ambiente de juros mais baixos, principalmente nos Estados Unidos, continua alimentando o apetite por risco, em especial entre os investidores estrangeiros No acumulado do mês, as compras externas de ações na B3 somam quase R$ 10 bilhões, com o superávit anual em capital externo superando R$ 35 bilhões.
Assim, a elevação do rating soberano combinada com o ciclo de alívio na taxa Selic e o avanço da agenda econômica, corrigindo o déficit nas contas públicas ainda que de forma gradual, tendem a melhorar o ambiente de negócios, na visão de especialistas. Ou seja, ainda que não tenha chegado ao grau de investimento, o Brasil já pode sonhar com isso.
“Essa mudança atrai investimentos nacionais e estrangeiros para diversos setores da economia e pode facilitar o acesso a empréstimos internacionais, contribuindo para a realização de investimentos” –
Igor Cavaca, líder de gestão de investimentos na Warren Investimentos.
Para ele, os impactos positivos das políticas monetária e fiscal em 2023 foram cruciais para essa mudança da avaliação pelas agências de classificação. Porém, o mercado doméstico já vinha reduzindo o prêmio de risco nos ativos locais. Tanto que o CDS de 5 anos, que mensura o risco de calote, atingiu recentemente o menor nível desde março de 2020.
Por isso, o economista-chefe da Nova Futura, Nicolas Borsoi, afirma que para ter efeito continuado nos preços, repercutindo nos negócios locais ainda nesta quarta-feira (20), a revisão da S&P deveria ser para uma nota superior. “Aí sim, estaríamos diante de uma novidade significativa”, avalia.
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