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Campos Neto e ata do Copom mostram pessimismo com inflação e política fiscal

Ata do Copom e declarações do presidente do BC mostram uma visão mais pessimista para a inflação e sobre a credibilidade fiscal

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O presidente do BC, Roberto Campos Neto

A reabertura do ciclo de comunicação do Banco Central após a decisão de elevar os juros básicos evidenciou uma visão mais pessimista para a inflação, enquanto preocupações sobre a credibilidade dos números fiscais do governo ganharam força. Essa é a visão passada tanto pela ata da última reunião de política monetária, quanto pelas declarações do presidente da autarquia, Roberto Campos Neto.

Na ata do encontro do Comitê de Política Monetária (Copom) que marcou a primeira elevação da Selic em dois anos, em 0,25 ponto percentual, para 10,75% ao ano, o BC excluiu do texto a menção feita em julho de que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) “tem arrefecido”. O documento foi divulgado na manhã desta terça-feira.

Segundo a autarquia, dados sugerem uma deterioração da composição da inflação, ainda que o número agregado não tenha divergido significativamente do que era esperado, citando uma interrupção no processo desinflacionário no período mais recente.

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“O Comitê avalia que o cenário prospectivo de inflação se tornou mais desafiador, com o aumento das projeções de inflação de médio prazo, mesmo condicionadas em uma trajetória de taxa de juros mais elevada”, acrescentou, ao reforçar que o balanço de riscos para a inflação deixou de estar equilibrado e passou a ser assimétrico, com maior peso dos riscos de alta de preços.

Em evento organizado pelo J. Safra logo após a divulgação da ata, quando se encerra o período de silêncio da diretoria do BC, Campos Neto disse que o número mais recente de inflação foi “até melhor”, mas defendeu que se observe o quadro mais completo, antes de ressaltar que a seca no país gera alerta sobre os preços de alimentos e energia.

“A dinâmica de inflação ainda preocupa o Banco Central,” disse.

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A meta central estabelecida para a inflação no país é de 3%, mas as expectativas do mercado para os preços à frente seguem persistentemente acima desse alvo, tema que o BC destacou como “fator de desconforto comum a todos os membros do Comitê”.

As atenções do mercado na quarta-feira estarão voltadas para a divulgação de números do IPCA-15 de setembro, com economistas consultados pela Reuters prevendo uma alta de 0,30% no índice, de 0,19% no mês anterior. Em 12 meses, a expectativa é de que o número chegue a 4,30%, ante 4,35% em agosto.

As análises do BC também têm focado nos riscos de surpresas positivas na atividade e no mercado de trabalho apertado pressionarem a inflação. Na ata, a autarquia avaliou que o crescimento real de salários acabará impactando preços caso seja persistente, embora o momento e a magnitude desse movimento sejam incertos.

“A conjunção de um mercado de trabalho robusto, política fiscal expansionista e vigor nas concessões de crédito às famílias seguem indicando um suporte ao consumo e consequentemente à demanda agregada”, disse a ata.

Preocupações fiscais

Em meio a críticas de analistas sobre iniciativas criativas adotadas pelo governo na gestão das contas públicas, o BC enfatizou a importância da credibilidade e da transparência nessa área.

“Uma política fiscal crível, embasada em regras previsíveis e transparência em seus resultados, em conjunto com a persecução de estratégias fiscais que sinalizem e reforcem o compromisso com o arcabouço fiscal nos próximos anos são importantes elementos para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de riscos dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”, afirmou.

O trecho do documento que defende regras previsíveis e transparência dos resultados fiscais representa um passo adicional na comunicação do BC, já que não fazia parte da ata da reunião do Copom de julho.

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Entre as ações do governo criticadas por especialistas estão uma proposta para bancar o auxílio-gás a famílias carentes fora do Orçamento, o uso de fundos privados para financiar políticas públicas e a tentativa de usar a captação de recursos esquecidos por correntistas em bancos para turbinar o resultado primário, ponto que enfrenta discordância do BC.

Na sexta-feira, o governo afrouxou a contenção orçamentária adotada para cumprir regras fiscais, argumentando que seus cálculos apontam para uma receita maior que a esperada compensando uma elevação de despesas obrigatórias. O congelamento de verbas foi reduzido de R$ 15 bilhões para R$ 13,3 bilhões.

Na apresentação desta terça, Campos Neto disse que o aumento observado no prêmio de risco captado na parte longa da curva de juros futuros parece estar associado a uma dúvida sobre números fiscais do país, ressaltando que o tema das contas públicas é importante para a atuação da política monetária.

Tanto a ata do Copom quanto Campos Neto ponderaram que a autarquia incorpora em seus cenários uma desaceleração no ritmo de crescimento dos gastos públicos ao longo do tempo. O presidente do BC afirmou ainda que o aumento do risco nas leituras de mercado “parece exagerado”.

Por Bernardo Caram

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