Economia
Comprar ou alugar um imóvel? O que levar em conta para decidir
O isolamento social mudou nossas relações com o lugar onde moramos. Em tempos de crise e juro baixo, é vantajoso buscar a casa própria?
O déficit de habitacional cresceu 7% no Brasil em apenas dez anos, de 2007 a 2017, atingindo 7,78 milhões de unidades habitacionais, segundo um estudo da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV). Boa parte desse aumento é reflexo da inadequação da moradia — famílias que dividem a mesma casa, moram em favelas ou cortiços, o que faz parecer que morar em um imóvel seja um privilégio.
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Além de ser crucial para entender o isolamento social, a questão habitacional aparece em um novo contexto durante a pandemia. Ficamos em casa, pensando em reformar ou mudar de moradia. Os juros baixos, mesmo para o financiamento de imóveis no longo prazo, faz alguns especialistas afirmarem que não há hora melhor para comprar um imóvel. Sabendo disso, voltamos a uma pergunta elementar, mas ao mesmo tempo complexa, das finanças pessoais: em tempos de pandemia e juros baixos, vale mais a pena comprar ou alugar um imóvel?
Cenários possíveis
Segundo o professor e coordenador do curso de administração do Ibmec de Minas Gerais, Eduardo Senra Coutinho, temos algumas possibilidades para analisar:
- A primeira: sair do aluguel, mas com o recurso necessário para comprar à vista. Neste caso, deve-se decidir entre permanecer no aluguel e investir esse recurso em alguma aplicação, ou realizar a compra pensando no imóvel como um ativo.
- A segunda: sair do aluguel sem o recurso para a compra à vista. Será que fica “elas por elas” ao escolher entre alugar ou financiar? Coutinho enxerga uma diferença essencial. “Quando você paga o aluguel, a renda é do recebedor do aluguel. Quando você paga uma prestação, parte é renda de quem concedeu o crédito e parte é acumulação de capital para você no futuro”, explica.
Pensando assim, fica fácil responder que: se a prestação da casa própria ficou no mesmo nível do aluguel, vale mais o financiamento. E no caso de ter o dinheiro à vista, vale questionar quando adiar a compra para investir o dinheiro?
“Você abriu mão de comprar o imóvel para ficar no aluguel, então o valor do investimento tem que, no mínimo, cobrir o valor do aluguel”, adverte Coutinho, enquanto lembra que essa escolha fica condicionada ao cenário econômico, como o que estamos vivendo agora em que o ganho da renda fixa está nas mínimas históricas.
Fatores que pesam na decisão
O tesoureiro e gerente de produtos financeiros do QuintoAndar, Augusto Meirelles, adverte sobre o tempo em que a pessoa pretende ficar no imóvel. “Como as taxas de compra são mais altas que as do aluguel, faz mais sentido alugar se a pessoa for ficar pouco tempo no imóvel. Agora, se a ideia é ficar muitos anos, a diluição dos custos torna a compra mais atraente.”
Coutinho também fez menção aos fundos imobiliários (FIIs), uma alternativa de investimento em imóveis para receber o recebimento de uma renda parecida com a do aluguel. Segundo ele, “nesses fundos, o que se tem é uma carteira de imóveis pré-estabelecida, algo que diminui os riscos e os custos, desde manutenção até a conservação do imóvel vazio.”
O que há além do financiamento?
Para diretor de Imóveis da OLX Brasil, Marcelo Dadian, esse período de juros baixos, não só no Brasil, mas no mundo todo, é uma ótima oportunidade para se fazer negócio. E não é porque ele vê os preços dos imóveis subindo. “Existe uma demanda natural em cidades como São Paulo, que precisa de 25 mil unidades por ano simplesmente para sobreviver, com pessoas querendo morar mais perto do trabalho, se separando, juntando”, observa.
Vale lembrar que o mercado imobiliário não desaqueceu durante a pandemia, pelo contrário, continuou crescendo. Segundo dados da própria OLX, entre abril e maio de 2020, a busca por imóveis cresceu 15%, dos quais 20% corresponde à procura por compra e 8% por aluguel, em comparação ao mesmo período do ano passado.
Na verdade, ele enxerga dois movimentos condicionados pela queda na taxa de juros. O primeiro é a migração da renda fixa, o que torna o investimento em imóveis mais atraente, e o segundo pela queda na taxa de juros dos financiamentos. Além disso, ele vê maiores possibilidades de pagamento.
Dadian cita, por exemplo, o home equity, a possibilidade de colocar o imóvel atual como garantia de um empréstimo. “Você consegue levantar alguma grana com isso, para depois dar entrada em outro apartamento ou casa”, explica. Nisso entram as IBuyers, companhias que atuam no mercado imobiliário, e utilizam ciência de dados para avaliar e viabilizar propostas de compra de propriedades. Hoje no Brasil, quem está à frente nesse modelo de negócio é a Loft, mencionada por Dadian.
Meirelles lembra também da possibilidade de usar os recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) na hora da compra. “Para trabalhadores CLT, que depositam 8% da sua remuneração mensal compulsoriamente no FGTS, a utilização desse saldo para a compra de um imóvel é uma ótima opção”, afirma.
Bancos públicos x privados
Considerando as situações citadas anteriormente, para que as prestações do financiamento fiquem mais próximas do valor de um aluguel, é importante que a oferta de crédito tenha custo baixo. Nesse sentido, os especialistas concordam sobre a centralidade dos bancos públicos na hora de obter uma boa oferta.
“A Caixa [Econômica Federal], principalmente com o Minha Casa Minha Vida, junto com o Banco do Brasil, tem um papel fundamental de dar moradia para quem não tem. E agora também tem bastante criatividade para lançar novos produtos”, afirma Dadian. Ele também tem uma avaliação sobre a linha de crédito imobiliário com juros prefixados, lançada pela Caixa no início do ano.
Alguns especialistas tinham a preocupação de que um financiamento de prazo tão longo com taxas prefixadas podia ser prejudicial à própria Caixa. “A verdade é que a prestação baixava muito, e todo volume disponibilizado foi alocado. Então as pessoas viram isso como uma boa oferta”, analisa Dadian.
Coutinho tem outras considerações. “Os recursos disponibilizados pela Caixa, podem ter vindo boa parte de rendimentos pós-fixados. Por isso, tem um risco sim para o banco”, esclarece ele. Sobre a centralidade no financiamento da habitação, ele concorda que os bancos públicos são protagonistas. Coutinho acha que há uma diferença essencial. “Quando você paga o aluguel, a renda é do recebedor do aluguel. Quando você paga uma prestação, parte é renda do fornecedor do crédito e parte é acumulação de capital para você no futuro”, explica.
De acordo, Meirelles olha para o papel desses bancos para instigar a competitividade com os bancos privados. Ele cita como exemplo a substituição da taxa referencial (TR), um indicador pós-fixado que compunha o cálculo das prestações dos bancos privados, por outras linhas de crédito como o prefixado e atrelado ao IPCA, que mede a inflação oficial.