Economia
Corte de gastos lá e cá: bilionário diz que ele e Musk vão cortar trilhões se Trump for eleito
Nos EUA, John Paulson se coloca como futuro secretário do Tesouro; no Brasil, governo prepara pacote
A preocupação sobre os riscos de o governo alimentar uma bomba-relógio fiscal tem estressado os mercados brasileiros. Mas não é só por aqui que a discussão sobre a necessidade de corte de gastos e um maior equilíbrio orçamentário tem ganhado senso de urgência.
Nos Estados Unidos, as rugas de economistas e investidores com um avanço potencial do já elevado déficit americano só aumentam diante do silêncio sobre o tema dos dois candidatos à presidência, a democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump. A relação entre a dívida pública dos EUA e o PIB já supera 120%. Em termos financeiros, o montante ultrapassa os US$ 35 trilhões.
Apesar de ser um problema raramente mencionado nas campanhas, o bilionário John Paulson, apoiador de Trump, trouxe o tema à tona ao se colocar como candidato ao cargo de secretário do Tesouro em uma eventual administração republicana. O gestor do hedge fund afirmou ao “The Wall Street Journal“ que ele e o CEO da Tesla, Elon Musk, trabalhariam juntos para implementar cortes massivos nos gastos federais.
A menção ao fundador da marca de veículos elétricos não foi por acaso. Trump prometeu colocar Musk à frente de uma nova “comissão de eficiência governamental” caso seja eleito em 5 de novembro. O grupo seria criado para aconselhar sobre reduções nos gastos federais. O empresário afirmou recentemente que conseguiria cortar pelo menos US$ 2 trilhões do orçamento, mas sem especificar como faria isso.
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Paulson citou como alvo de cortes os subsídios para energia verde previstos na Lei de Redução da Inflação, aprovada no atual governo do democrata Joe Biden. “Todos esses subsídios fiscais para energia solar, para eólica, são ineficientes e economicamente inviáveis,” afirmou. “Elimine isso. Isso reduz os gastos.”
Essa legislação sancionada em 2022 institui créditos fiscais para compra de veículos elétricos, energia renovável, captura e armazenamento de carbono, hidrogênio e energia nuclear. A renúncia fiscal foi compensada por um esforço do governo em aumentar a arrecadação. Mas Trump afirmou, no Economic Club de Nova York em setembro, que pretende “revogar todos os fundos não utilizados” da lei.
Retirar os incentivos para energia limpa poderia gerar uma economia de US$ 921 bilhões ao longo de uma década, segundo a Tax Foundation. Mas esse tipo de proposta pode enfrentar resistência até entre congressistas republicanos. Muitos projetos de energia eólica e solar financiados pela lei, por exemplo, geram empregos e investimentos em distritos dominados pelo partido.
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O alto endividamento dos governos é um problema que vai além dos EUA e do Brasil. O Fundo Monetário Internacional (FMI) tem alertado sobre a escalada da dívida pública global que deve atingir a marca recorde de US$ 100 trilhões este ano. “Nossas previsões apontam para uma combinação implacável de baixo crescimento e alta dívida — um futuro difícil”, disse a diretora-gerente do órgão, Kristalina Georgieva.
No mesmo barco do desequilíbrio fiscal, o Reino Unido também enfrenta o desafio de rebalancear receitas e despesas para conter o endividamento. O primeiro-ministro britânico Keir Starmer precisa encontrar 40 bilhões de libras (cerca de R$ 300 bilhões) para lidar com a lacuna fiscal e, ao mesmo tempo, manter o investimento em áreas como saúde e educação. Para tapar o rombo, as propostas incluem aumentar impostos e cortar gastos.
Sensação de déjà vu no Brasil
Os dilemas americano e britânico podem parecer familiares aos brasileiros. E são. Por aqui, passadas as eleições municipais, o governo finalmente começa a tocar no assunto de contenção de despesas para manter as metas estabelecidas no arcabouço fiscal.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que as propostas tem sido discutidas com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas ainda não têm prazo definido para serem apresentadas. Ele afirmou ainda que as medidas vão exigir um projeto de emenda constitucional (PEC).
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As falas do ministro têm aumentado a volatilidade no mercado. Na terça-feira (29), a sinalização sobre não haver cronograma definido para a apresentação das medidas frustrou o mercado e ajudou a impulsionar o dólar a R$ 5,76, na maior cotação desde março de 2021.
Na quarta (30), outra mensagem transmitida por Haddad trouxe um alívio pontual aos mercados e o dólar fechou praticamente estável, a R$ 5,7640 (+0,03%). O ministro afirmou haver “convergência” com a Casa Civil em relação à necessidade de se implementar medidas fiscais. A Casa Civil representa a ala mais política do governo, ou seja, aquela com maior propensão a defender aumento de gastos.
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, tem reforçado a comunicação sobre a iminência de o governo apresentar um plano de redução de despesas. A integrante da equipe econômica afirmou que o presidente Lula já tem conhecimento sobre as medidas necessárias.
Tebet até indicou um horizonte para a aprovação dos projetos. A ministra colocou como um prazo realizável votar o pacote no Congresso até meados do primeiro semestre de 2025. “Alguma coisa vota em dezembro, outra vota em março, outra vota em maio. O que nós precisamos é apresentar para o país um pacote consistente, autorizado, que dê conforto obviamente para o presidente da República, deixando claro que nós não vamos tirar nenhum direito.”
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A expectativa é de que um primeiro conjunto de propostas possa ser apresentado na semana que vem. Tebet indicou que o plano seria proposto em duas ou mais etapas.
Trajetória da dívida brasileira
A trajetória da dívida pública brasileira tem sido fonte de preocupações entre investidores e outros agentes. De janeiro de 2023 para cá, a dívida do governo subiu 23,6%. Saiu de R$ 7,2 trilhões para R$ 8,9 trilhões. Nas contas do FMI, isso significa que a relação entre endividamento bruto e o PIB do país alcançará 87,6% no fim deste ano.
O fundo espera que o indicador suba para 92% em 2025 e alcance 97,6% do PIB até 2029. Sem um arcabouço fiscal crível, que a recoloque esse endividamento no rumo do equilíbrio, os juros seguem em disparada. Os títulos de dívida do governo com vencimentos mais longos, como o Tesouro IPCA+ 2045, por exemplo, seguem pagando juros reais, ou seja, um retorno acima da inflação, na casa dos 6,76%. Há duas semanas, a taxa estava em 6,57%.
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Patamares de juros tão elevados inibem investimentos produtivos, encarecem o crédito, desaceleram a economia e, se permanecerem nesses níveis por tempo suficiente, podem levar o país a uma recessão. Por enquanto, a atividade, o emprego e a renda têm resistido. Até quando? Vai depender da credibilidade que o governo conseguir conquistar. Aqui e, ao que parece, lá fora também.
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