Economia
Brasil segue com a maior taxa de juros reais em ranking com 40 países
Maioria dos países da lista tem taxas negativas – ou seja, inflação maior que o juro nominal.
O Brasil segue na liderança do ranking de juros reais. Em uma lista com 40 países, o Brasil é o que tem a maior taxa real – ou seja, os juros nominais descontados pela inflação. É o que indica um levantamento feito pelo Trading Economics.
Considerando a Selic de 13,25% determinada na quarta-feira (15) pelo Comitê de Política Monetária (Copom) e a projeção para a inflação no Brasil, o país tem uma taxa de juros real de 6,84%. O número fica acima das taxas de outros países emergentes, como México (+1,61%) e China (+1,17%).
O Brasil faz parte de uma minoria na lista com taxas reais positivas. Dos 40 países, apenas 9 têm juros reais positivos (ou seja, juros acima da inflação). Os demais estão em território negativo, o que significa que a inflação está mais elevada que a taxa de juros nominal.
Entre os países com juros negativos, a taxa mais baixa é a Turquia (-24%). A taxa de inflação anual do país acelerou a uma máxima em 24 anos de 73,5% em maio, em uma disparada que teve início em 2021, quando a lira despencou depois que o banco central iniciou um ciclo de afrouxamento que reduziu os juros em 5 pontos percentuais a pedido do presidente do país, Tayyip Erdogan.
Inflação preocupa: um risco global
Diversos países pelo mundo vivem a preocupação com a inflação, com a guerra na Ucrânia pressionando os preços das commodities e de energia em várias regiões. O aumento de casos de covid-19 na China também está sob as atenções, já que restrições ao funcionamento de diversas atividades podem desajustar as cadeias de suprimentos novamente.
Nesse cenário, o Banco Central Europeu (BCE), por exemplo, deve aumentar o ritmo de alta de juros na região. O BCE indicou um aumento de 0,25 ponto dos juros em julho e disse que um aumento maior pode ser necessário em setembro, pois as pressões inflacionárias estavam aumentando e se ampliando.
A preocupação atinge também os Estados Unidos. Em sua decisão de subir a taxa de juros nos Estados Unidos em 0,75 ponto percentual, o Federal Reserve (Fed), citou as pressões que os preços ainda devem sofrer. A inflação nos EUA tem batido recordes em 40 anos.
Entre países menos desenvolvidos, o receio é o mesmo. No começo de junho, o banco central do Chile, por exemplo, decidiu por outro aumento na taxa de juros de referência para 9%, em meio à forte pressão inflacionária. O BC chileno elevou sua previsão de inflação para este ano de 8,2% para 10,8%.
Por que o Brasil tem juros mais altos?
Enquanto choques globais como a pandemia de covid-19 e a guerra na Ucrânia atingem os preços em diversos países, especialistas ouvidos pelo InvestNews citam as particularidades que fazem com que o Brasil seja ainda mais afetado pelo aumento da inflação. Um dos principais pontos, segundo eles, é a questão fiscal.
“Hoje, infelizmente, em termos de taxas de juros, o Brasil é destaque, inclusive em relação a seus pares emergentes. Mas isso é uma condição local”, afirma Ricardo Jorge, especialista em renda fixa e sócio da Quantzed.“Uma coisa que acaba influenciando também é a perspectiva dos agentes financeiros sobre o cenário fiscal brasileiro.”
Cristiane Quartaroli, economista do Banco Ourinvest, complementa: “quando a gente fala de juros, não só o aspecto da inflação em si, mas o aspecto da percepção de risco em alguns momentos em relação à economia brasileira.”
Se a situação das contas públicas gera dúvidas entre os investidores, eles passam a exigir mais “prêmio” para emprestar dinheiro ao país. Isso, portanto, gera uma pressão de alta sobre os juros.
“Hoje, qual é a fotografia? A gente tem um governo tentando usar uma política fiscal para combater a inflação de curto prazo, e isso aumenta a desconfiança dos investidores sobre a capacidade que o governo vai ter no futuro em organizar suas contas”, afirma Jorge, em referência à proposta do governo de reduzir o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis e outros itens. A ideia é que a União compense os estados pela perda de arrecadação.
“Essa medida do ICMS, por exemplo, o governo está abrindo mão de receita para resolver um problema de curto prazo, temporário. A preocupação é se isso não vai causar um descontrole fiscal e como o governo vai resolver isso”, diz Jorge. “Isso por si só já faz com que o mercado de juros antecipe, peça um prêmio maior de risco na hora de financiar o governo.”
Quartaroli, do Ourinvest, cita outros eventos recentes que aumentaram a desconfiança do mercado. “A gente não pode se esquecer do segundo semestre do ano passado, da questão da flexibilização do teto de gastos para colocar o Auxílio Brasil em prática. Isso fez com que o BC acelerasse o passo da elevação dos juros por conta justamente do prêmio exigido pelo investidor para financiar a dívida pública do Brasil.”
Mas Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações de renda variável da Ação Brasil, cita outro fator por trás da liderança do Brasil no ranking de juros: o fato de o país ter começado a subir sua taxa básica antes de outros. A ideia é que o alívio da inflação chegue primeiro por aqui na comparação com demais locais. Com a inflação mais controlada e os juros mais altos, a taxa real consequentemente sobe.
“Hoje temos o fato de ter iniciado o processo de alta de juros no Brasil muito antes das principais economias do mundo, o que nos gerou uma ‘vantagem’ em relação ao controle da inflação”, diz Alves.
“Por conta da nossa ‘expertise’ em períodos inflacionários, o Banco Central sabia que teria que se antecipar e acelerar o movimento de alta de juros, o que naturalmente gera essa diferença positiva, produzindo juros real mais atrativos”, acrescenta o especialista.
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