Finanças
IPO da Intelbras: por que os analistas estão céticos com as ações da companhia?
Fabricante tem crescimento sólido e um portfólio diverso, mas para analistas pesa mais o seu “calcanhar de Aquiles”.
Conhecida como a maior fabricante de câmeras e equipamentos de segurança eletrônica no Brasil, a Intelbras estreia no dia 4 fevereiro na bolsa de valores. A companhia será listada no Novo Mercado, maior nível de governança da B3, com o ticker INTB3.
A faixa indicativa de preço foi estabelecida entre R$ 15,25 e R$ 19,25, tendo como ponto médio R$ 17,25. O período de reservas termina nesta segunda-feira (1) e o preço final será fixado no dia seguinte (2 de fevereiro). A empresa vai estrear na bolsa no dia 4 de fevereiro.
Com a sua oferta pública inicial de ações (IPO), a Intelbras pode movimentar até R$ 1,24 bilhão. O prazo de reserva termina no dia 1 de fevereiro, e o valor mínimo é de R$ 3000.
Empresa sólida e com um portfólio diversificado em três grandes segmentos (segurança, comunicação e energia), a Intelbras tem atraído o olhar do investidor nas últimas semanas, mas parece que seu desempenho financeiro e sua boa reputação em 40 anos de mercado não foram suficientes para convencer as principais casas de análise.
Especialistas de mercado enxergam como principais riscos ao investidor: os concorrentes estrangeiros, a dependência da empresa por insumos importados e a falta de novos planos para futuras aquisições.
Analistas da Eleven Financial e a Suno Research também se mostraram céticos com o potencial de valorização do papel e não aconselham a entrada no IPO. “Nossa recomendação é de não participação na oferta, pois o upside no ponto médio da faixa não nos parece justificar a relação risco x retorno de investimento em um papel estreante na bolsa”, apontaram Eric Huang, Talles Granelo e Carlos Daltozo da Eleven Financial.
Para Rodrigo Wainberg, analista da Suno Research, não há dúvidas que a companhia é uma empresa de ponta. Contudo, afirma que a faixa de preços estipulada não dá uma margem de segurança suficiente para investir na ação. “Decidimos acompanhar como serão feitas as aquisições e os resultados da empresa com isso, mas num primeiro momento vamos ficar fora da oferta”.
Afinal, a companhia é boa ou não para investir? Trouxemos alguns dados para que o investidor tire as suas próprias conclusões.
Sobre a oferta
A Intelbras vai ofertar 72 milhões de ações ordinárias em dois blocos:
- Oferta primária (quando os recursos vão para o caixa da companhia): 64% das ações, com a expectativa de levantar R$ 793,5 milhões, considerando o preço médio da faixa indicativa.
- Oferta secundária (quando os atuais sócios vendem parte da sua participação e embolsam os recursos): 36% das ações, estimada em R$ 448,5 milhões. Com a conclusão da oferta, a participação dos acionistas controladores, da família Freitas, será diluída podendo chegar a 61% do capital da empresa.
Após a oferta pública inicial, a fabricante terá um free float (percentual de ações emitidas em circulação) entre 26,3% e 30%, disponível para qualquer investidor comprar.
A família Freitas deve permanecer sob posse de 61% das ações e a Dahua Technology, parceira da Intelbras, permanecerá com quase 9% da companhia.
Para onde vai o dinheiro?
De acordo com o informado pela Intelbras em prospecto, pelo menos R$ 751 milhões levantados na oferta primária serão utilizados nos seguintes projetos:
- 36% para crescimento inorgânico: são as aquisições que a companhia pretende realizar. Durante a sua trajetória de 40 anos, a empresa adquiriu 5 companhias de segmentos diversos (Maxcom, Automatiza, Engesul, Décio, Seventh) e manteve seus fundadores à frente das operações. No entanto, no momento não há nenhuma nova negociação em andamento.
- 26% para expansão de capacidade produtiva: ampliação de capacidade industrial e processos produtivos e de automatização especialmente nas plantas de Santa Catarina, Minas Gerais e Amazonas.
- 21% para aquisição de unidades “hardware como serviço”: comercialização e distribuição de equipamentos de TI sem necessidade de compra, investimentos na área comercial e de desenvolvimento de produtos.
- 17% para área administrativa e de TI: expansão de times, desenvolvimento de e-commerce e investimento nos canais de varejo.
Vantagens da Intelbras
Entre as principais vantagens de investir na fabricante, a Eleven Financial destaca a liderança que a companhia tem nas diversas categorias em que atua. (veja na tabela segmentos de atuação). A Intelbras se consolidou na área de segurança eletrônica, comunicação, controles de acesso e redes, na qual tem uma participação de mercado superior a 20%. “Isso lhe garante melhores condições comerciais tanto de fornecedores como nos canais de venda”, apontam os analistas da casa.
Segurança | Comunicação | Energia |
R$ 777 mi (53%) | R$ 544 mi (37%) | R$ 142 mi (10%) |
Segurança eletrônica • DVR • Câmera de vídeo • Alarmes de intrusão • Sensor de presença | Redes • Roteador Wi-fi • OLT – fibra ótica • Switch • Rack – data center | Energia • Nobreak • Baterias • Cabos USB • Luminárias LED |
Controles de acesso • Porteiro residencial • Vide porteiro • Controlador de acesso facial • Fechadura digital | Comunicação • Audiocônferência • Rádio comunicador • Speakers • Controle universal para eletrônicos (TV, box de tv a cabo, etc) | Energia solar • Soluções on-grid e offgrid: • Painéis solares • Inversor solar |
Fonte: Eleven Financial
Outro ponto forte da companhia é seu bom histórico de aquisições. Foram compradas pelo menos 5 companhias desde sua fundação, e se a empresa for seletiva no uso desses 36% do IPO em boas oportunidades, pode gerar mais lucro e crescimento do seu portfólio.
Portfólio que é bem diversificado, a terceira vantagem da companhia. A Eleven avalia que os planos de adquirir novas unidades para “hardware como serviço” podem beneficiar muito a companhia. “É uma tendência crescente do mercado de tecnologia substituir as aquisições de equipamentos por subscrições”, afirma a casa de análise. A estratégia pode trazer uma linha de receitas recorrentes, o que auxiliaria no planejamento financeiro da Intelbras.
Rodrigo Wainberg da Suno Research destaca também entre as vantagens competitivas, os investimentos de 10% do lucro que historicamente a empresa faz em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos. Em um segmento onde a inovação precisa ser constante e rápida, ele explica que 70% do faturamento da empresa é fruto de itens desenvolvidos internamente. “Isso graças ao time de pesquisa que foi montado há mais de 40 anos e conta com cerca de 400 profissionais”, reforça
Segundo Wainberg, a Intelbras também goza de boa reputação quando o assunto é suporte ao cliente, com bom desempenho no site de queixas contra companhias Reclame Aqui e no NTS (Net Promoter Score), que mede a lealdade do cliente, mostrando que a companhia vive um ciclo virtuoso.
E quando se fala de mercados em expansão, a fabricante possui dois carros chefes: o mercado de câmeras IP e portarias remotas, com forte potencial de crescimento, um salto de 12% em 2020.
E o mercado de energia solar, a companhia ingressou em 2019 com painéis solares e inversores e já faturou R$ 49,9 milhões, 44% da receita da sua unidade de Energia. Com o consumidor de olho nas energias renováveis, a Eleven Financial avalia que esta linha deve ter forte potencial de crescimento.
Motivos para ficar de fora da ação
Apesar de a empresa ser sólida e ter tantos benefícios como apresentado acima, existem alguns empecilhos que podem colocar o negócio por água abaixo. Por este motivo, as casas de análise consultadas ficam com um pé atrás na hora de optar pelo IPO da companhia. Entre as principais desvantagens estão:
- Mercado aberto a concorrentes estrangeiros: o Brasil não possui barreiras para que players estrangeiros, como os países asiáticos, iniciem suas operações no país ou importem seus produtos. Se comparamos a Intelbrás com algum destes países que possui mão de obra boa e barata, além de eficiência tecnológica, a companhia pode perder muito mercado.
- Câmbio elevado: A Intelbras é muito dependente de matéria-prima e produtos acabados ou semiacabados em dólar, exposta a variações cambiais e redução de retornos. A dívida também está exposta em dólar com um empréstimo de US$ 18 milhões com o Citibank. Se o real desvaloriza frente ao dólar, a dívida sobe.
- Perda de benefícios fiscais: O sucesso da receita nos últimos anos foi graças a incentivos fiscais e isenções. Em 2019, por exemplo, recebeu benefícios e incentivos R$ 142,7 milhões, o equivalente a 75,4% do seu lucro líquido. A ausência destes benefícios, em tempos nos quais o governo procura arrecadar, pode afetar drasticamente a rentabilidade da empresa.
- Necessidade de planos de inovação e aquisição: Mesmo apontando que destinará 36% dos recursos para aquisições, a companhia ainda não tem nenhuma negociação em andamento. E em um mercado no qual produtos e soluções se tornam rapidamente obsoletos, são urgentes estratégias para não perder espaço e aceitação