Finanças

Ouro: o que explica a alta de 45% em 18 meses 

Bancos centrais estão comprando o metal amarelo em quantidades faraônicas. Entenda os motivos.

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Todo o ouro minerado na história da humanidade formaria um bloco do tamanho de um prédio de nove andares. São 190 mil toneladas. Isso é o que a Vale extrai de minério de ferro a cada oito horas

Oferta minúscula, demanda infinita. Tanto que, até outro dia, dinheiro só valia dinheiro se tivesse lastro em ouro – como acontecia com o dólar até 1971. Desde lá, a ascensão da moeda puramente fiduciária (sem lastro) deixou o ouro um tanto de escanteio na economia global. Mas algo está mudando.  

Alguns bancos centrais passaram a estocar ouro violentamente, para reforçar suas reservas internacionais. Em 2022, as compras conjuntas ao longo do ano ultrapassaram pela primeira vez a marca de mil toneladas (mais precisamente, 1.082 T). E o fenômeno se repetiu em 2023 (1.037 T). É o dobro da média dos 10 anos anteriores (511 T). 

Quem puxa o cordão é o BC chinês. Sozinho, ele abocanhou 225 toneladas no ano passado – de cada cinco barras adquiridas por bancos centrais, uma teve Pequim como destino. Foi a maior compra de ouro da China num único ano desde 1977. 

Isso elevou o estoque deles em 11%, para 2.235 toneladas. A preços atuais, dá US$ 172 bilhões. Bastante, mas ainda nem faz cócegas diante do total de reservas internacionais deles, o equivalente a US$ 3,22 trilhões. 

“Equivalente” porque há cada vez menos dólares nas reservas chinesas. Há dez anos, eles tinham US$ 1,3 trilhão em títulos públicos americanos. Fecharam 2023 com US$ 816 bilhões – apenas 25% do total. Só em 2023, a desova foi de US$ 97,5 bi. 

Sintoma da tensão geopolítica, claro. A maior parte das reservas chinesas, hoje, está em outras moedas fortes (euros, libras, ienes…). Mas isso não basta para proteger o país de um eventual bloqueio de sua poupança internacional. 

Em 2018, 40% das reservas internacionais da Rússia estavam em dólares. No início de 2022, já tinham reduzido para 16% – num óbvio preparativo para a invasão da Ucrânia. O resto estava em euros, libras, ienes, francos suíços e yuans. 

Mas aí União Europeia, Reino Unido, Suíça e Japão bloquearem os títulos em poder da Rússia (além dos EUA, claro). Isso eliminou o acesso de Putin ao seu “Tesouro Direto” em moeda estrangeira. Do equivalente a US$ 640 bilhões que ele tinha, sobraram apenas US$ 230 bilhões – a parte em ouro (22%) e em yuans (14%).

Ao converter papel em ouro paulatinamente, a China mostra, no mínimo, que pretende ter mais controle sobre suas reservas. E não está sozinha. Veja aqui os maiores compradores no ano passado, em toneladas, de acordo com o World Gold Council

China:           225 T

Polônia:        130 T

Singapura:     76 T

Líbia:              30 T

Rep. Tcheca: 19 T

Vale notar que o Fed, dos EUA, não comprou nada nos últimos anos, mas o maior estoque do planeta segue lá: 8.133 toneladas. O nosso BC também não se moveu – e o estoque aqui, só para constar, é o 30º do mundo: 129 toneladas.    

A parte em ouro das reservas chinesas ainda é pequena. Só 4% do total. Na Alemanha (2º maior estoque do mundo, com 3.352 toneladas) são 30%. Nos EUA, 95%. Caso a China siga aumentando a proporção metálica de suas reservas, teremos uma demanda trilionária (sem figura de linguagem) para o ouro nos próximos anos.

O mercado, ao que tudo indica, aposta nisso. Nos últimos 18 meses, a cotação do ouro em dólar subiu 44,5% (de US$ 53,15 para US$ 76,85 o grama) – contra 20,5% do S&P 500 para o mesmo período. Em reais, foram 43,5% (rolou pouco efeito de câmbio nesse intervalo específico) – versus 4% do Ibovespa e 19% do CDI. Not so bad.

Mas essa não é a história toda. Uma parte considerável da alta está concentrada nos últimos dois meses. Só de meados de fevereiro até agora rolou uma alta de 20% em dólar – em reais, 27% (por que para esse período o câmbio contou, de fato). Nem precisa comparar com outros ativos. 

O salto foi tão forte que há quem imagine haver outro fator por trás, além do apetite dos BCs. Vejamos aqui.  

Barras no supermercado

“Não temos como saber. Mas indivíduos ricos na China, por exemplo, veem o mercado imobiliário capengando, e agora eles podem estar dizendo ‘Ok, vamos diversificar para outro ativo que dá para deixar para os netos.’ E aí compram ouro”, disse o americano Chris Mancini, gerente de portfólio do Gabelli Gold, um fundo que investe em mineradoras de ouro, numa entrevista recente à CNBC.

Talvez não sejam só os chineses. A Costco, gigante do atacarejo nos EUA, passou a oferecer barras de ouro de 28 gramas (uma onça) no segundo semestre do ano passado. Analistas do banco Wells Fargo estimam que as vendas estejam entre “US$ 100 milhões a US$ 200 milhões por mês”. 

Não é nada comparado à média de US$ 17 bilhões que o BC chinês tem comprado por mês. Mas que indica uma tendência, indica. 

Uma alternativa mais cômoda do que guardar barras debaixo do colchão, vale lembrar, são os ETFs que compram o metal amarelo por você. É o caso do GOLD11, da XP, e do BIAU39, da BlackRock  – você adquire uma cota e ela flutua de acordo com o ouro e com o dólar. Um risco duplo – mas que nos últimos tempos tem pagado bem.   

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