Finanças
Quarta-Feira de Cinzas: o que o Ibovespa fez em Carnavais passados?
Investidor que se assustou com desempenho da bolsa brasileira na volta da folia em 2020 não fez a melhor opção.
O Ibovespa volta a ser negociado nesta Quarta-feira de Cinzas (14), a partir das 13h, após a longa pausa do feriado de Carnaval. A festa mais popular do Brasil manteve a B3 fechada no início da semana, com a atenção do investidor se distanciando das telas e se voltando para a folia vinda dos blocos de ruas e do Sambódromo.
Enquanto isso, os mercados internacionais funcionaram normalmente nos últimos dois dias. A exceção ficou com a China, que celebra desde o último sábado (10) a chegada do ano do dragão e festeja a dança desse animal mítico que simboliza riqueza e poder até a próxima sexta-feira (16). Trata-se de uma cena bem diferente do que se viu há quatro anos.
Foi na volta do carnaval de 2020 que os mercados globais tiveram um choque de realidade quanto ao impacto do coronavírus no mundo. À época, a doença causada pelo vírus SARS-Cov-2 já se espalhava para outros países fora da China – inclusive aqui no Brasil, enquanto os foliões pulavam ao ritmo de samba.
Esse contágio disparou uma busca por proteção – não apenas contra a covid-19, mas também por ativos mais seguros. Em um tradicional pregão encurtado da bolsa brasileira na volta do Carnaval, o Ibovespa derreteu 7%, queimando quase 8 mil pontos, na maior queda diária desde o famoso Joesley Day, em 18 de maio de 2017.
O estrago acompanhou as perdas em torno de 6% das bolsas de Nova York nos dois dias anteriores. Aliás, ao final daquela última semana de fevereiro de 2020, Wall Street entrava em território de correção (bear market), amargando o pior desempenho semanal desde a crise financeira de 2008. Mas o pior ainda estava por vir.
Em meados de março, pouco depois de a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarar oficialmente pandemia de coronavírus, o Ibovespa disparou o circuit breaker, mecanismo usado para conter uma queda livre, nada menos do que quatro vezes – sendo duas em uma mesma sessão. Ao final daqueles dois meses, o índice acionário caiu quase 40%.
Recordar é viver
Ainda que não se espere nenhuma surpresa de tamanha proporção nesta Quarta-Feira de Cinzas, quando a B3 volta a funcionar, é importante recordar o que aconteceu em outros carnavais para estar preparado quando novos abalos atingirem os mercados globais. Afinal, crises financeiras são como tempestades.
Nesse caso, é possível perceber os sinais de sua chegada e até mesmo tentar antecipar os impactos que serão causados. Por isso, na maioria das vezes, a melhor opção é ficar parado e não fazer nada, esperando a tormenta passar até que a direção do vento mude e traga a bonança.
É o que aponta estudo defendido por Yahmany Fontenelle Abrahim, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), no qual ele disserta sobre as crises globais e o efeito manada no mercado de ações brasileiro. Sob a orientação do professor Wenner Glaucio Lopes Lucena, a pesquisa mostra que em situações como a vivida pelo Ibovespa em 2020, tanto a euforia como o desespero podem tomar conta dos investidores.
“É muito comum nessas situações que os investidores desconfiem de suas próprias crenças e apoiem suas decisões em seus pares ou mesmo em um certo consenso de mercado”, afirmam os acadêmicos. Abrahim e Lucena lembram que esse comportamento é conhecido como efeito manada.
Depois da tempestade…
Com base em um levantamento feito em cinco intervalos de tempo distintos, os pesquisadores buscaram comprovar se o fenômeno extraordinário da pandemia da covid-19 contribuiu para a existência desse efeito manada na bolsa brasileira. Os períodos considerados foram antes da pandemia; os primeiros cem dias e as primeiras, segunda e terceira ondas da doença no Brasil.
“Os resultados mostraram que não foi evidenciado o efeito manada no período antes da pandemia. No entanto, esse efeito foi detectado durante os cem primeiros dias da pandemia e esse comportamento se estendeu até a primeira onda. Na segunda e terceira ondas, o efeito manada não é mais evidenciado”
Yahmany Fontenelle Abrahim e Wenner Glaucio Lopes Lucena, pesquisadores da UFPB
Para eles, ao que parece, o surto da pandemia trouxe incertezas ao mercado brasileiro, levando os investidores a entrarem em um “estado de pânico” em um primeiro momento. Aliás, comportamento semelhante observou-se em mercados de economias maduras, como Estados Unidos, Reino Unido e outros países europeus.
…vem a bonança
Porém, com o passar do tempo, o mercado foi absorvendo os impactos da doença e recebendo injeções de liquidez por parte dos bancos centrais, levando investidores a voltaram a tomar suas decisões com base em suas próprias crenças. Tanto que houve uma retomada da trajetória de alta e da tendência de crescimento do Ibovespa a partir de 2021.
“Portanto, a exemplo das tempestades, onde muitas vezes a atitude mais segura é simplesmente se abrigar e esperar que ela passe, o investidor da bolsa brasileira pode pensar o mesmo para sua carteira, deixando que primeiramente passe todo o momento de euforia e/ou desespero do mercado para então tomar suas decisões”
Yahmany Fontenelle Abrahim e Wenner Glaucio Lopes Lucena, pesquisadores da UFPB
Ainda assim, a pesquisa de Abrahim, sob orientação do professor Wenner, ressalta que, caso o mercado acionário doméstico sofra algum tipo de perturbação externa, como uma crise financeira, será esperado que o efeito manada apareça. A questão, portanto, é saber o que deve ser feito quando o tempo voltar a fechar entre os ativos de risco.
Afinal, com os índices Dow Jones e S&P 500 renovando recordes às vésperas do Carnaval e apesar do Federal Reserve adiar o início do ciclo de cortes nos juros dos EUA, em algum momento os investidores vão perceber que estão pagando caro demais. Aí pode ser importante se lembrar do que aconteceu com os mercados na volta do carnaval em 2020.
Aliás, os alertas de que os mercados de ações globais enfrentam uma ameaça crescente se multiplicam. Na semana passada, foi a vez dos estrategistas de ações do JPMorgan ressaltarem que o atual ciclo de alta dos bolsas pode ter chegado ao fim, abrindo caminho para uma queda de 20 a 30% do pico de 2024. Atenção, então, ao efeito manada.
Veja também
- Na contramão dos EUA, Ibovespa recua após vitória do Trump
- A bolsa tinha tudo para decolar em 2024, mas a Selic estragou a festa
- Embraer sobe 715% em 4 anos, quase tanto quanto a Nvidia. Entenda as razões
- Ibovespa recua 1,27%, a 125,8 mil pontos; dólar cai 0,44%
- Dólar fecha a R$5,736, alta de 1,43%; Ibovespa cai 0,2%