Finanças

Quase 40% dos brasileiros não pisam numa agência bancária há mais de seis meses

Segundo pesquisa da Ipsos, 26% dos jovens adultos nunca fez depósito de dinheiro físico no caixa eletrônico

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Qual foi a última vez que você passou pelo ritual de colocar chaves, telefone e carteira no recipiente da porta giratória antes de entrar em um banco? Para 38% dos brasileiros dentro do sistema financeiro, isso foi há mais de seis meses, segundo pesquisa Ipsos encomendada pelo Nubank, realizada em setembro e divulgada nesta terça-feira (21), num evento do banco.

Para a parcela mais jovem da população, esse hábito já começa a virar algo tão distante quanto pegar uma caneta para rebobinar manualmente a fita cassete: os dados mostram que 7% da população de 18 a 25 anos, a geração Z, jamais pisou em uma agência bancária.

Os depósitos são ainda menos frequentes. Mais de um quarto desses jovens adultos (26%) nunca vivenciou a experiência de fazer depósito de dinheiro físico em caixa eletrônico, contra 10% dos millenials (26 a 40 anos) e 7% da geração X (41 a 60 anos).

Na média geral, só 11% dos brasileiros ainda realizam pagamentos nessa forma.

Ir até um caixa da agência para depositar o dinheiro com um funcionário é algo que um a cada cinco representantes da geração Z nunca fez, ressalta Livia Chanes, CEO do Nubank no Brasil.

Segundo ela, esse comportamento reflete tendências geracionais que devem se intensificar no futuro.

“Se pensar que 16% das pessoas com 18 a 25 anos nunca foram a um caixa de agência bancário… Eu também não saco mais dinheiro, mas, quando lembro, para mim isso era uma coisa do dia a dia no passado.”

Livia chanes, ceo do nubank
Livia Chanes, CEO do Nubank no Brasil. Foto: Divulgação/Nubank

O estudante de educação física Giovanni Rodrigues, prestes a completar 19 anos, tem conta bancária desde os 15, quando começou a trabalhar, mas nunca fez um depósito (no caixa eletrônico ou com um funcionário no caixa). Ele se arrisca a descrever o processo, mas acaba misturando o passo a passo do serviço eletrônico e o do caixa da agência: “Acho que você coloca o dinheiro dentro do envelopezinho e coloca no balcão.”

Dono de três contas digitais, Giovanni recentemente abriu uma em banco tradicional (mas pelo aplicativo) para receber o salário de um novo emprego.

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Saque, ele só fez duas vezes na vida. “Uma foi para pegar ônibus. Meu amigo estava sem o Bilhete Único, corri no mercado e saquei”, contou ele ao InvestNews. A segunda e última foi para ajudar um amigo que vendeu o celular. “Ele ficou sem o celular e não tinha como receber o dinheiro na conta digital, aí o comprador fez o Pix para mim, eu saquei e entreguei o dinheiro.”

Uma década de digitalização

O levantamento da Ipsos ouviu uma amostra de 600 participantes com conta bancária em três países: Brasil. México e Colômbia, onde o Nubank opera desde 2013, 2019 e 2020, respectivamente. O foco foi avaliar o impacto do recente boom de novas pessoas abrindo contas bancárias, a bancarização promovida com a digitalização.

Só entre junho de 2018 e dezembro de 2023, segundo um relatório do Banco Central, a base de clientes pessoas físicas do sistema financeiro nacional praticamente dobrou, de 77 milhões para 150 milhões (88% da população de 15 anos ou mais estimada pelo IBGE). O documento explica que a forte crescimento se deve não só à digitalização dos serviços financeiros, mas também ao lançamento do Pix, ao auxílio emergencial pago durante a pandemia e à entrada de novas instituições”.

Luis Gustavo Mansur Siqueira, do Departamento de Promoção da Cidadania Financeira do Banco Central, diz que a digitalização do sistema financeiro vem de uma trajetória de mais de 20 anos de novas leis e regras que prepararam o sistema para a chegada do Pix, que ele descreve como “pá de cal no problema de acesso”, que veio para “acabar de incluir o pessoal que faltava” entrar no sistema.

Ele ressalta que os produtos digitais também ajudaram nisso. Segundo Mansur, 130 milhões dos brasileiros possuem uma conta bancária digital.

As respostas da pesquisa Ipsos também indicam um “antes e depois” da digitalização: Caiu de 33% para 10% a proporção de pessoas que visitam uma agência de banco para pagar contas no Brasil. O uso do caixa eletrônico para pagamentos caiu de 32% para 7%.

Agora, 66% dos participantes disseram usar aplicativos de conta digital para isso. O internet banking também é usado por um terço delas.

Luis Gustavo Mansur Siqueira, do Departamento de Promoção da Cidadania Financeira do Banco Central. Foto: Divulgação/Nubank

Diferenças culturais

Segundo o estudo, a maioria dos jovens teve a primeira experiência bancária já com produtos digitais, enquanto os mais velhos foram aderindo aos poucos aos novos serviços digitais. Mas, segundo Livia, a insegurança vista há 15 anos sobre as transações financeiras sem dinheiro em papel já foram superadas e quase todos os participantes da pesquisa afirmaram que se sentem seguros com transações online.

A carteira que Giovanni leva no bolso, por exemplo, serve apenas para documentos. “Se tenho dinheiro em papel ou moeda na mão, quero me livrar dele o mais rápido possível”, explica o jovem, que usa a combinação entre aplicativo do banco e casa lotérica para “digitalizar” suas cédulas.

“Você gera o boleto no aplicativo, vai na lotérica e deposita.” Isso quando ele não consegue receber o dinheiro via Pix — uma unanimidade entre as gerações, diz o estudo.

A tecnologia do Pix, aliás, é o principal item que diferencia o Brasil de Colômbia e México, segundo a pesquisa. Nos dois países latino-americanos, o dinheiro é meio de pagamento usado com maior frequência, por 56% das pessoas. Já por aqui, dinheiro não chega nem no top 3. O primeiro é o Pix, usado por 70% da população, seguido do cartão de crédito físico (49%) e do cartão de débito físico (47%).

Como consequência, no México e na Colômbia 30% e 20% das pessoas, respectivamente, ainda fazem pagamentos no caixa eletrônico. Além disso, só 16% dos mexicanos e 23% dos colombianos deixaram de ir ao banco nos últimos seis meses.

Outro aspecto no qual o Brasil se diferencia é na predileção pelo cartão de crédito, usado por 65% dos entrevistados, enquanto os hermanos preferem pagar no débito. Ao menos metade dos mexicanos e colombianos também usam o crédito, mas a adesão é relativamente recente: a maioria dos usuários de cartão de crédito tem o produto há menos de cinco anos. No México e na Colômbia, as principais compras no crédito vão para serviços. Já no Brasil, o maior gasto é com compras de mercado.

Do controle de gastos ao investimento

Segundo Mansur, do Banco Central, depois de vencer o desafio de trazer os brasileiros adultos ao sistema financeiro, os desafios atuais incluem aumentar o bem-estar financeiro. Isso passa justamente pelo relacionamento da população com o crédito, o endividamento e a inadimplência.

“As pessoas às vezes tiveram acesso a crédito que elas não tinham antes. Então elas não estavam preparadas ou não conheciam o produto.”

LUIS GUSTAVO MANSUR, banco central

Observando os resultados da pesquisa por faixa etária no Brasil, as gerações mais novas também são as que tiveram mais acesso à educação financeira. Segundo a pesquisa, 81% dos millenials aprenderam sobre o tema, contra 70% da geração X e 46% dos baby boomers (ou seja, as pessoas com mais de 60 anos).

Como a idade principal para começar a aprender sobre o tema foi aos 20 anos para todas as gerações, a pesquisa indica que a geração Z “está justamente no momento de ter seu primeiro contato”.

No Brasil e no México, o próprio aplicativo do banco serve como método de planejamento para a maior parcela das pessoas. Na Colômbia, porém, a manutenção de planilhas eletrônicas com os gastos e receitas foi a resposta dada pela maioria dos entrevistados.

Parte da solução para combater a inadimplência, de acordo com o especialista, passa por novas regulamentações que incluem a implementação, por parte dos bancos e instituições financeiras, de políticas de educação financeira oferecida aos clientes no momento em que eles começam a consumir produtos de crédito.

O BC também tem aplicado a tecnologia para avançar na análise dos dados bancários para poder identificar que comportamentos aumentam o risco de endividamento e poder agir de forma preventiva.

Melhorando o bem-estar financeiro, segundo ele, mais pessoas podem adotar formas de poupar e investir.

Nos três países da pesquisa, investir ou guardar dinheiro é um hábito recente. De acordo com os dados, metade dos entrevistados brasileiros começou a poupar há menos de dois anos. Essa proporção cai para 44% no México e 42% na Colômbia.

A motivação é igual para todos: investir tem como objetivo principal manter uma reserva para emergências.

Giovanni confirma as respostas da pesquisa. Ele diz que entende pouco sobre investimentos, mas já aprendeu na prática uma das lições: produtos como “caixinhas”, “cofrinhos” e “porquinhos” rendem mais que a poupança.

Essa foi, aliás, sua primeira experiência com o tema.

“Eu guardei por algum tempo, fui juntando dinheirinho no cofrinho dos bancos, que vai rendendo. Mas gastei tudo na viagem de formatura para Porto Seguro.”

giovanni rodrigues, estudante universitário

Agora no primeiro ano de faculdade e com um novo emprego, ele diz que quer voltar a poupar para, quem sabe, conseguir custear um intercâmbio acadêmico antes de terminar a graduação.

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