Finanças
‘Varejo online transformou o setor de logística no país’, diz gestor do Guardian
Em entrevista ao InvestNews, Gustavo Asdourian comenta o atual momento dos fundos imobiliários que investem em galpões e explica por que eles devem continuar crescendo.
Os fundos que investem em logística resistiram bem à crise de 2020, e não foi apenas porque o comércio eletrônico ficou mais forte na pandemia. Parte destes fundos costuma ter contratos mais previsíveis e longos, o que reduz o risco de saída de inquilinos. Um deles é o FII Guardian Logística (GALG11), que fez uma oferta pública no final do ano passado e estreou na bolsa de valores (B3) no último dia 7 de janeiro, após captar R$ 109,2 milhões.
O criador do fundo, Gustavo Asdourian, vem de uma família que investe há mais de cinco décadas no setor imobiliário e é dona dos imóveis que compõem a carteira. O fundo foi aberto há poucos meses para o público com a criação da Guardian Gestora, mas o olhar seletivo da família já estava voltado para os galpões e centros de distribuição de importantes empresas há cerca de seis anos.
O fundo está com 100% dos imóveis alugados pelos chamados contratos atípicos, que têm prazos mais longos e obrigam o locatário a pagar uma multa cheia se decidir sair. Os ocupantes foram escolhidos a dedo e são bem conhecidos do público: a produtora de alimentos BRF (BRFS3), a fabricante de cigarros Souza Cruz e a produtora de gás industrial Air Liquide são os principais locatários.
Com um valor de mercado de R$ 630 milhões, o Guardian prevê pagar um retorno de dividendos (dividend yield, na sigla em inglês) superior a 8% em 2021, mais que a média de 6% dos pares do setor. A renda mensal gerada pelos FIIs tem atraído um “exército” de pessoas físicas à modalidade de investimento: no ano passado, eles saltaram de cerca de 700 mil para aproximadamente 1,1 milhão em dezembro.
Em entrevista ao InvestNews, Asdourian comenta o bom momento dos galpões logísticos no contexto da pandemia, fala sobre o ritmo de recuperação dos fundos imobiliários de shoppings e escritórios e enumera quais pontos os investidor deve levar em conta antes de escolher um bom FII de logística.
InvestNews – Por que vocês escolheram investir em imóveis do segmento de logística?
Gustavo Asdourian – Vemos que o país ainda precisa de muito investimento em infraestrutura. Tem muita demanda e pouca oferta, é um segmento que tem tudo para crescer e foi muito demandado em ano de pandemia. Ela mudou o padrão de consumo da população e fez com que as compras online ficassem mais fortes.
Como a pandemia impactou os resultados do setor?
As vendas do varejo online mudaram o perfil do setor de logística no país e algumas empresas de nosso próprio portfólio foram muito bem, como a BRF, que se destacou nas vendas para supermercados e do câmbio com exportações. A Souza Cruz se beneficiou do fechamento de fronteiras na pandemia, diminuiu o contrabando e as vendas aumentaram. A Bat [British American Tobacco] fechou fábricas em outros países mas não no Brasil, onde a produção aumentou para atender o exterior. E a Air Liquide teve um bom desempenho com refrigerantes, além, da parte hospitalar. No caso da rede Almanara, que sofreu na crise, concluímos a compra do imóvel após os restaurantes serem reabertos e já operando no azul. Com os recursos da venda do imóvel a empresa quitou as dívidas e hoje está em posição confortável.
De onde surgiu a ideia de criar o fundo no ano passado?
A Guardian Gestora foi montada ano passado mas a aquisição dos imóveis foi feita por minha família, que tem perfil conservador, há seis anos. No fim de 2020, esse portfólio ficou mais relevante e justificou profissionalizar a gestão. O fundo tem 100% dos imóveis alugados e todos têm contrato atípico de locação, quando o locatário não pode cancelar ou paga o prazo inteiro do saldo. Se o prazo é 18 anos, tem que pagar o aluguel dos 18 anos. É um contrato já consagrado por jurisprudência e as empresas aceitam esse tipo de contrato. Isso dá mais segurança ao cotista. Além disso, o prazo médio é de 12,5 anos, o que dá uma previsibilidade de receitas muito grande.
Em 2020, muitos fundos imobiliários sofreram e tiveram que reduzir ou até cortar os dividendos. Qual a expectativa de retorno deste fundo?
Lançamos o fundo no mercado com um retorno alto. Hoje o retorno projetado (dividend yield) está entre 8,5% e 9% corrigido por IPCA, enquanto a média dos outros fundos de logística é 6%. Acreditamos que nos próximos meses, com os dividendos altos, a cota do fundo vai ter um bom desempenho. Os dividendos são pagos mensalmente.
Como você vê a recuperação do mercado imobiliário depois da pandemia, incluindo segmentos que sofreram como shoppings e lajes corporativas?
Com as boas notícias de vacinas chegando, não é de uma hora para outra que vai recuperar porque demora para conseguir imunizar parte relevante da população, mas acreditamos que o movimento deve voltar este ano para setores que sofreram mais como hotéis, shoppings e turismo. A parte de escritórios também sofreu e deve se recuperar mais do meio para o final do ano. E o setor de logística em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasil como um todo vem reduzindo a vacância desde 2016. No ano passado ele fechou com a mais de 2 milhões de metros de absorção líquida (mais gente alugando do que desalugando), a maior dos últimos 15 anos. Vimos Amazon, Mercado Livre e Magazine Luiza, essas varejistas, um pipeline que olhamos também para o fundo. Achamos que a perspectiva deve continuar boa para logística, mas em outros setores vemos a recuperação mais para o segundo semestre.
Vimos devoluções de imóveis comerciais com a adesão ao home office no ano passado. Você acredita que vai voltar ao que era antes?
Acho que o segmento de lajes corporativas vai se recuperar. Não será como antes, vai ter uma flexibilidade de home office, mas no geral o mercado volta. Na maior parte dos segmentos, percebemos conversando com inquilinos que não é a mesma coisa trabalhar em casa e no escritório com equipe e pessoas conversando a todo momento. Sob esse ponto de vista, com a economia voltando, as pessoas vão começar a voltar para o escritório, o concorrente vai olhar e voltar também para a produtividade ficar parecida, para não perder market share. Alguns segmentos de fato funcionam bem em home office, mas de forma geral, esse percentual é pequeno e não vai mudar o mercado.
Quais os passos para o investidor pode escolher um fundo de logística de qualidade?
Começo pelos quarto principais pontos do Guardian, que são vacância zero, o percentual de contratos atípicos (no qual a multa é o aluguel do prazo todo), o prazo médio dos contratos e o perfil das locatárias. Outro pontos é saber onde os imóveis ficam localizados, se estão em regiões metropolitanas com vocação para logística, se estão em uma localização ruim ou perto de grandes centros urbanos. Também é importante olhar o retorno (dividend yield esperado do fundo) e comparar a média de outros fundos no mesmo segmento. Importante ver se os dividendos estão atrelados a algum índice de inflação. Por exemplo, o Guardian está atrelado ao IPCA e é líquido de Imposto de Renda.
Pelas características do GALG11, apesar de ser classificado como renda variável, pode-se dizer que os dividendos pagos se assemelham a um ativo de renda fixa?
De fato, neste caso ele está quase como uma renda fixa quando se olha os pagamentos mensais dos dividendos. Claro que ele está no mercado secundário em bolsa e está sujeito aos riscos de variação de preço da cota no dia.
Vocês pretendem fazer outras ofertas?
Ainda não temos outra oferta para esse fundo no curto prazo porque queremos consolidar no mercado secundário primeiro. Depois vamos pensar em outra emissão. Temos um pipeline com mais imóveis para comprar, mas queremos consolidar a cota do fundo antes. Planejamos lançar um fundo de papel focado em CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários). Vai começar nas próximas semanas com dinheiro proprietário e depois com um histórico de retorno planejamos fazer a oferta.