Quando Raísa Macedo, 36, entrou na Fundação de Previdência Complementar do Estado de São Paulo (Prevcom), em 2016, logo decidiu participar do plano de previdência que a instituição oferecia. Já bem informada sobre o assunto – Raísa é planejadora financeira e gerente de investimentos –, ela sabia da enorme vantagem da escolha: a cada R$ 1 investido no plano, a empresa depositaria R$ 1 adicional. É como ter 100% de retorno logo de cara, algo praticamente impossível no mercado.
Mas Raísa também tomou outras decisões ao investir em previdência. Ela passou a investir, em 2018, em um plano de previdência complementar aberto. Estamos falando dos fundos disponíveis em plataformas de bancos e corretoras, que qualquer um pode contratar.
Tanto no fundo de pensão quanto na previdência aberta, Raísa escolheu o modelo PGBL de contribuição, e conseguiu uma vantagem razoável.
Não sabemos quanto Raísa ganha. Para entender essa história, então, vamos supor que seja R$ 15,1 mil. Porque R$ 15,1 mil? Para facilitar as contas, porque isso dá uma renda bruta anual bem redonda, de R$ 200 mil (ou seja 13,3 vezes o salário, para contabilizar o décimo terceiro e o adicional de férias).
Pois bem. A mágica do PGBL acontece na hora da restituição do IR. O que o plano faz é te devolver mais ou menos um quarto de tudo o que você deposita lá ao longo de um ano – até um certo limite, que vamos entender mais adiante.
No exemplo aqui de Raísa, acontece o seguinte. A restituição dela, normalmente, seria de R$ 8,5 mil. Com o PGBL, o valor salta para R$ 12,3 mil.
Agora, vamos mostrar como isso acontece.
A vantagem do PGBL
Ponto número um: a restituição turbinada do PGBL só acontece quando você faz a declaração completa do IR. Na simplificada, ela não existe.
Isso acontece porque os depósitos em PGBL entram como se fossem despesas com saúde ou educação. Elas reduzem a sua “base tributável” – aquela que o leão do imposto de renda efetivamente morde.
Vamos dizer que Raísa gastou R$ 10 mil com consultas médicas (saúde). Isso diminui a base tributável dela – de R$ 200 mil, que é a renda bruta inteira, para R$ 190 mil. Nesse caso, o máximo que ela vai conseguir de restituição são aqueles R$ 8,5 mil.
Para chegar àqueles R$ 12,3 mil, a base tributável precisa baixar bem mais. E é isso que o PGBL faz. Raísa depositou R$ 24 mil no plano. Isso aumentou o total de deduções para R$ 34 mil. Ou seja, reduziu a base para R$ 166 mil. E a restituição engordou em 50%.
Tem uma pegadinha aqui: o valor de R$ 24 mil. Raísa colocou isso porque existe um limite para o tanto que você pode depositar em PGBL: 12% da renda bruta anual. A dela é de R$ 200 mil; e 12% disso dá R$ 24 mil.
Os cuidados que você precisa tomar
Se você só faz a declaração simplificada e quer um plano de previdência, fuja do PGBL. A escolha certa aí é o primo dele, o VGBL.
E isso abre espaço para um interlúdio: quando vale a pena fazer a declaração simplificada? Nesse modelo, não existe a ideia de deduzir despesas com isso ou com aquilo. A receita pega e aplica um desconto padrão de 20% sobre a “renda anual tributável” – que é um pouco menor que renda anual bruta.
Na simplificada, Raísa terá um total de R$ 16.754 em deduções. Você pode estranhar. Afinal, a conta não seria 20% de algo próximo de R$ 200 mil? Sim, mas existe um teto legal. E, neste ano, ele foi de R$ 16.754. Sem conversa.
Conclusão: Raísa fez muito bem em contratar um PGBL, porque, somando as despesas que ela já tinha, a sua restituição ficou muito maior. E foi o que ela fez.
Na prática, só com o PGBL ela obteve de volta pouco mais de R$ 6 mil dos R$ 24 mil que aportou.
Antes de sair correndo atrás de um plano de previdência, você precisa fazer uma conta simples: o total de deduções que você tem com o desconto simplificado supera os 20% da renda tributável?
Para saber isso, é só pegar a sua renda anual (salário bruto vezes 13,3) e aplicar 20% sobre ela. Se você tiver despesas dedutíveis que ultrapassem esse montante, faça a declaração completa. No nosso caso, o montante a se considerar é o teto de R$ 16.754,34.
E isso significa o seguinte: se você não tiver despesa alguma, só um plano de PGBL, já vale. Pelo teto de hoje, basta que a contribuição seja maior do que R$ 16.754,34 – menos até que os R$ 24 mil do nosso exemplo.
Agora, começam as ressalvas.
O desconto que você obtém no PGBL não é uma isenção. Como você abateu os valores destinados ao plano com passar do tempo, a Receita aplica a alíquota de imposto sobre todo o seu montante, o investimento e o lucro, na hora do resgate. No caso do VGBL a Receita aplica a alíquota apenas sobre o rendimento dos recursos – igual acontece em qualquer outro investimento.
É por isso que o PGBL pode ser uma excelente escolha – e também uma maldição. Se você lembrou de declarar o PGBL a cada ano, o dinheiro que seria pago como imposto deve ser reinvestido. O tempo jogará a seu favor. Se você não declarar o PGBL, ele simplesmente não valerá a pena. Você vai pagar um imposto sobre uma base muito maior sem ter tocado nesse dinheiro enquanto pôde.
E você pode questionar: se o imposto vai incidir sobre tudo no futuro, não fica pior? Já adiantamos a resposta: não, mas você precisa ter disciplina. Se você não reinvestir religiosamente o dinheiro da restituição, o plano será muito menos vantajoso que um VGBL. Anote isso.
O poder dos juros compostos
Vamos considerar que Raísa fez tudo direitinho: pegou a sua restituição e reinvestiu a cada ano, no mesmo plano contratado. Não vamos contabilizar nada mais aqui. Vamos apenas ver o efeito dos juros compostos no tempo. Nosso exemplo vai considerar um juro real de 5% ao ano.
Precisamos também colocar na conta o imposto. Na escolha de um plano, há duas tabelas: a progressiva e a regressiva. Na progressiva, a alíquota aumenta conforme o prazo do investimento. Não costuma ser a escolha mais comum. A tabela regressiva, sim, representa uma grande vantagem. Nela, a alíquota cai com o passar do tempo: começa com pesados 35% para investimentos até 2 anos e termina em 10% acima de 10 anos – é o cenário que vamos considerar.
O resultado fica assim:
Mais uma vez, o PGBL prova seu valor.
Aqui, já vale reforçar: o limite de 12% de contribuições ao PGBL para abatimento da renda anual é crucial para não deixar dinheiro na mesa. Se Raíssa tivesse investido mais de R$ 24 mil anuais no plano, eles não poderiam entrar na conta para tornar a base tributável menor. É por isso que tudo aquilo que fica acima desse limite deve ser destinado a um VGBL (caso você queira outro plano de previdência) ou algum outro produto.
Taxas menos ferozes
No passado, o investidor a fim de fazer uma previdência privada só tinha acesso a produtos superconservadores e com taxas elevadas ou inaceitáveis, como as de carregamento e de saída. Hoje, as seguradoras já oferecem inúmeros tipos de planos, inclusive aqueles que replicam fundos de gestoras independentes. Vale tanto para fundos de renda fixa como para multimercados (que incluem uma parcela em renda variável, como ações).
Raísa escolheu um plano considerando um dos pontos mais importantes para qualquer tipo de investimento: as taxas. Para qualquer fundo mais conservador, como aqueles de crédito privado e renda fixa, o ideal é pagar algo ao redor de 1% de taxa de administração ao ano; para produtos mais arriscados, 2% cai bem.
E, para premiar o gestor pelo seu bom trabalho em entregar retorno acima da média, é aceitável pagar 20% de taxa de performance sobre o que o fundo superar de um indicador de referência, como o CDI ou o Ibovespa.
E existe ainda um ganho adicional na previdência que não podemos deixar de falar: a isenção do come-cotas. Esse imposto é uma retenção compulsória de uma parte do lucro gerado por um fundo a cada seis meses. É um sabor amargo presente em praticamente todos os produtos de renda fixa e multimercados.
Simulamos aqui um investimento daqueles R$ 12.314,00 de restituição a cada ano por 10 anos, com retorno real de 5% ao ano. Aqui, não estamos falando de reinvestimento, apenas do rendimento desse dinheiro no tempo.
Veja o que acontece:
Recado final: prazos de investimento mais longos, como é o caso da previdência, combinam com propostas mais arriscadas. Mas se você mudar de ideia, como sair de um multimercado para ficar num 100% renda fixa, existe a beleza de pedir a portabilidade – migrar para outro plano sem pedir o resgate dos recursos. Coisas boas que só a previdência privada traz.