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Muito além da Tesla: Sigma investe em lítio no Brasil e ações sobem 240% no ano

A companhia canadense com subsidiária em Minas Gerais produz lítio de baixa pegada ambiental e se posiciona entre as maiores produtoras globais do componente de baterias de carros elétricos.

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A corrida pelo lítio – também conhecido como “petróleo branco” – não parte apenas de Elon Musk e suas tentativas de construir uma mina em território americano para abastecer os carros da Tesla (TSLA34).

No Brasil, a canadense Sigma Lithium, listada nas bolsas de Toronto e Nasdaq, está construindo uma mina de lítio e sinalizou que vai produzir comercialmente já em 2023 material de alta qualidade para as baterias de carros elétricos.

Produção de lítio na Austrália. Crédito: Carla Gottgens/Bloomberg

E isso deve impulsionar sua produção, colocando inclusive a companhia entre as quatro maiores produtoras mundiais de lítio, segundo projeções da corretora canadense Canaccord Genuity. Hoje, a americana Albermale, a chilena SQM e a chinesa Ganfeng Lithium são as “top 3”.

‘Mineração verde’ da Sigma Lithium

Apesar de a demanda brasileira ser menor do que a oferta que a Sigma produz – o que se explica pela liderança na produção de biocombustíveis, como o etanol, por exemplo – , a demanda externa é grande. Nos Estados Unidos, 91% dos carros usam combustíveis “sujos”, como gasolina ou diesel. Logo, existe um forte campo de atuação. Mas para se diferenciar em um ambiente altamente competitivo, a Sigma aposta em um fator cada vez mais valorizado por empresas e discutido no mundo, a exemplo da COP27: o ESG (sigla em inglês para boas práticas ambientais, sociais e de governanças).

A empresa investiu em uma “mineração verde” de lítio na região do vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. O que, na prática, significa que a planta não utiliza nenhum componente químico para a purificação de lítio, além de conseguir reutilizar cerca de 90% da água consumida no local. Segundo relatório aos investidores, a empresa também aponta utilizar o método de empilhamento de rejeitos a seco – evitando, assim, o uso de barragens como as da Samarco, que romperam em Mariana e em Brumadinho.

Recentemente, a companhia anunciou que captou US$ 100 milhões com um de seus principais acionistas (Synergi Capital) que devem ser destinados para triplicar sua produção em 2024 para 768 mil toneladas. A projeção é que, em 2023, sejam produzidas 270 mil toneladas em solo brasileiro.

A notícia animou o mercado, com Bank Of America ampliando sua recomendação de compra para os papéis, de US$ 37 para US$ 47. As ações na Nasdaq (SGML) saltaram 237,9% no ano até o último dia 6 de dezembro, segundo levantamento do TradeMap.

Já os papeis das americanas Piedmont e Albermale tiveram desempenhos muito abaixo da Sigma: os retornos foram de 4% e 10%, respectivamente, no acumulado deste ano.

Cresce a demanda por lítio

Embora o níquel, o cobalto e o manganês nas baterias de carros elétricos possam ser eliminados gradualmente, o lítio não pode ser eliminado de forma alguma, segundo a estatal Serviço Geológico Brasil (SGB). Mas o metal mais leve do mundo também é usado em celulares, laptops, câmeras digitais e algumas baterias não recarregáveis. No entanto, as baterias dos carros elétricos exigem cerca de 8 mil a 11 mil vezes a quantidade necessária em um smartphone, de acordo com a Bloomberg NEF.

O Brasil não tinha uma procura tão intensa por projetos de mineração de lítio. E esse maior interesse está diretamente ligado à transição energética, principalmente por conta da eletrificação das frotas mundo afora. E agora, o Brasil vai poder exportar para fábricas de baterias do mundo todo por meio da mineradora, que também se prepara para se tornar zero rejeitos.

Em julho, foi publicado um decreto presidencial removendo as restrições à exportação de lítio pelo Brasil. E essa medida pode vir a destravar investimentos bilionários na cadeia de suprimentos. Antes, uma empresa só poderia exportar lítio o equivalente a 10% de seus recursos minerais, além de depender de uma autorização expressa do governo.

Essa cota para o lítio se devia ao fato de o mineral ter sido enquadrado como um item de interesse nuclear, uma vez que usinas usavam um composto com lítio para resfriar reatores – técnica que ficou ultrapassada.

Preço do lítio ainda é salgado

Um ponto que sempre é discutido, inclusive por Musk via redes sociais, é o custo alto do lítio, o que vem sendo um problema para transformar o produto de nicho para massa. Por mais que exista um grande número de incentivos de governos pra avançar no desenvolvimento, produção e utilização de carros elétricos (uma vez que diminui muito a poluição), o lítio é bem caro.

E tendo em vista o crescimento da demanda por soluções de energia renovável, os preços do mineral devem continuar aumentando. E com a demanda por descarbonização, a oferta de lítio será um dos principais determinantes para a expansão de veículos elétricos. Segundo relatório sobre Transição Energética e Metais Verdes, os analistas da XP, Marcella Ungaretti, Jennie Li, Pietra Pereira e Giovanna Beneducci apontam que é esperado que os investimentos no setor continuem aumentando assim como a demanda por baterias.

E entre as ações destacadas pelos analistas está os papéis da canadense Sigma, que tem subsidiária no Brasil. A companhia produz lítio de baixa pegada ambiental  e adota princípios ambientais, sociais e de governança . E devido aos altos padrões ESG é que analistas apontam para a consistência da empresa.

“Na nossa visão, a exposição às empresas produtoras dos principais metais utilizados em tecnologias de baixo carbono pode ser uma oportunidade de investimento interessante, uma vez que este é um tema global importante e estrutural. No entanto, isso exige que os investidores tenham cautela com potenciais riscos ESG, como disputas locais e regulação. Neste caso, os investidores não têm escolha a não ser buscar pelas empresas de minerações com altos padrões ESG”.

ETF com exposição ao lítio

As ações da Sigma não estão disponíveis ao investidor brasileiro por meio dos BDRs (recibos de ações listados na bolsa brasileira). O que significa que para acessar os papéis se faz necessário abrir conta em um corretora internacional que os tenha em prateleira. Mas existe um fundo global listado na bolsa de Nova York que expõe o investidor a 40 ações ligadas ao lítio: de mineradoras a fabricantes de baterias – e, entre elas, está a Sigma.

O fundo de índice Global X Lithium & Battery Tech é listado na NYSE e negociado pelo ticker ‘LIT‘. O ETF começou a ser negociado em julho de 2010 e rastreia o índice ‘Solactive Global Lithium’. Cerca de metade das empresas que compõem a carteira são da China, seguidas por Estados Unidos (22%), Coreia do Sul (8,3%), Austrália (6,8%) e Japão (4,2%).

A empresa que tem o maior peso na carteira (11%) é a americana Albermale (ALB), cujas ações listadas nos EUA tiveram uma rentabilidade de 10% no ano. Já a americana Tesla representa mais de 4,8% no portfólio. No entanto, a empresa de Elon Musk vem amargando uma queda de 86% no acumulado do ano até 6 de dezembro.

Em igual período, o ETF está 20,64% no negativo, segundo o Trademap. Então apesar da maior pulverização em ações do setor, muitos papéis estão puxando o índice para baixo. O que não se aplica a representatividade da Sigma na carteira do índice, uma vez que esta representa apenas 0,6%.

A maior mina de lítio de rocha dura do mundo. Ele está localizado ao sul da cidade de Greenbushes, Austrália Ocidental.

O triângulo do lítio

Hoje, a China controla a  maior parte da fabricação que transforma o mineral em baterias recarregáveis, segundo a Bloomberg NEF. O país asiático abriga 75% de toda a capacidade de fabricação de células de bateria. Mas analisando onde estão as maiores reservas de lítio no mundo, a maior parte do metal bruto é extraído na Austrália (para depois ser transformado em um concentrado, que em geral, é refinado na China), além de três países chamados de triângulo do lítio.

Argentina, Bolívia e Chile formam o chamado triângulo do petróleo branco. Juntos, os países concentram mais da metade dos recursos de lítio do mundo. No entanto, os países latinos estão entre os mais secos do planeta, o que acaba tornando a produção do mineral um desafio, uma vez que o metal é separado de salmouras bombeadas do subsolo e evaporadas em lagoas artificiais – o que faz com que estes processos também consumam muita água, segundo especialistas. Isso também é um desafio, justamente por não ser tão sustentável.

Já o clima brasileiro e sua vasta diversidade mineral para produzir baterias, desde o lítio até o nióbio, grafite, manganês, níquel, cobalto, cobre e alumínio, favorece o país neste rali. Hoje, a Sigma, além da companhia AMG, são as duas únicas empresas que produzem lítio no país, apesar de haver várias com projetos de mineração em andamento.

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