A economia dos Estados Unidos passa por um momento crítico?
No momento em que os Estados Unidos oscilam entre um pouso suave e a recessão, a ansiedade da incerteza pesa sobre consumidores e empresas
Seis meses atrás, Alex e Aaron Taylor reservaram uma viagem de seis dias de Minnesota à Disney World para a família de cinco pessoas durante o feriado de Ação de Graças. No final de junho, Aaron perdeu seu emprego de motorista de caminhão e ainda tem dificuldade para encontrar um novo.
Eles decidiram esta semana reduzir a visita à Disney para um único dia. Optaram por passar mais tempo na piscina do hotel (mas ainda não contaram aos filhos sobre a mudança de planos).
“O mercado de trabalho ficou inundado durante a Covid e agora as coisas simplesmente não estão acontecendo”, disse Aaron, de 41 anos. “Tudo parece estar parado agora.”
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Esses desafios reverberam em uma economia instável, dando origem a uma questão central: na longa luta para reduzir a inflação e evitar a recessão, chegamos a um momento crítico?
Até recentemente, os Estados Unidos pareciam estar caminhando para um pouso suave — com a inflação caindo, enquanto o emprego permanecia alto e o crescimento, estável. Os eventos das últimas semanas, no entanto, minaram a confiança nessa perspectiva, com alguns economistas elevando a probabilidade de recessão e outros dizendo que o Federal Reserve precisa cortar as taxas de juros mais rapidamente para evitá-la. A incerteza está pesando sobre consumidores e empresas de todos os tamanhos, e todos tentam tomar decisões e elaborar planos de gastos.
A Disney disse esta semana que a receita de seus parques temáticos caiu, em parte por causa da queda da demanda. A empresa mencionou a “incerteza econômica que está afetando os consumidores” e disse esperar que a frequência mais fraca em seus parques temáticos persista.
Várias outras empresas, incluindo Airbnb, McDonald’s e Trex, que faz deques, sinalizaram o abrandamento da demanda do consumidor.
As más notícias vindas das empresas norte-americanas surgem no momento em que os economistas avaliam se a recente desaceleração das contratações e o aumento do desemprego que abalaram temporariamente os mercados de ações podem ser um passo em direção à recessão ou apenas um breve susto. Além desses sinais mistos, as taxas de hipoteca caíram para o nível mais baixo em mais de um ano, e os pedidos de seguro-desemprego diminuíram, aliviando algumas preocupações com o mercado de trabalho e desencadeando uma alta das ações na quinta-feira.
A maioria dos economistas espera que o Fed inicie os cortes em sua próxima reunião em setembro. Nesse ínterim, empresas e consumidores tomarão inúmeras decisões — por exemplo, reservar viagens, reformar a cozinha, aprovar viagens de negócios ou contratar mais trabalhadores — que podem ajudar a empurrar o país para um lado ou para outro.
“Devemos estar em um momento crítico”, disse Vineer Bhansali, fundador do LongTail Alpha, fundo de hedge em Newport Beach, Califórnia. É difícil ver o que está por vir, disse ele, acrescentando: “Tudo acontece lentamente e daí acontece de repente”.
Para muitos americanos, as preocupações com a desaceleração e a ansiedade sobre o emprego podem superar os benefícios de pagamentos com juros mais baixos, disse ele.
Os gastos do consumidor representam cerca de dois terços da economia dos Estados Unidos. Quando os consumidores recuam, pode haver grandes efeitos nas empresas, que talvez cortem custos, muitas vezes demitindo trabalhadores.
A Pesquisa com Consumidores da Universidade de Michigan mostrou que o consumidor permanece cauteloso, embora muito acima de uma baixa histórica em meados de 2022, pois os preços altos reduzem as decisões, especialmente para pessoas de baixa renda, disse Joanne Hsu, diretora das pesquisas, após o relatório de julho.
Nancy Lazar, economista-chefe global do Piper Sandler, banco de investimento e empresa de serviços financeiros, disse que a confiança dos consumidores de renda média está “no território da recessão. Estamos até começando a ver dificuldades do consumidor de alto padrão”.
A questão agora, segundo ela, é: “O que as empresas poderiam fazer para continuar a apoiar o consumidor?”. E a resposta, diz ela, seria “aceitar a diminuição de suas margens de lucro” para evitar demissões. Por mais improvável que pareça, Lazar acrescentou: “Há uma visão de que, dada a dificuldade de contratar pessoas, as empresas demorarão a demitir”.
Sinais de consumidores instáveis se refletiram nos recentes relatórios de lucros corporativos. A Trex alertou os investidores na quarta-feira que estava vendo uma demanda mais fraca por produtos de nível médio. A Monster Beverage culpou as vendas fracas de suas bebidas energéticas às pressões sentidas por seus clientes de escritórios. As ações de ambas as empresas caíram drasticamente após seus últimos resultados.
“Há um pouco mais de incerteza sobre a real situação da economia”, disse Joseph Hinrichs, executivo-chefe da ferrovia CSX, em uma teleconferência de resultados na segunda-feira, quando o mercado de ações despencou.
Ele afirmou que a CSX, que movimenta cargas ao longo da Costa Leste americana, viu uma desaceleração nas remessas de fábricas de automóveis nas últimas semanas, e disse que estava observando de perto quaisquer cortes nas taxas de juros que pudessem ajudar os mercados automotivo e imobiliário.
“Dá para dizer onde estamos hoje em comparação com dois meses atrás; a economia parece um pouco mais frágil”, disse Hinrichs. “E acreditamos que ela pode se recuperar, mas estamos observando com muito cuidado.”
Nick Vaughn, sócio-gerente da Kitchen & Bath Galleries em Chapel Hill, na Carolina do Norte, disse que a empresa será cautelosa ao conceder crédito a novos clientes e não espera aumentar os gastos de capital nem sua equipe de 18 pessoas, a menos que encontre alguém excepcional.
Ao mesmo tempo, Vaughn revelou que a procura pelo trabalho de design nunca foi tão forte.
“Esta equipe vai continuar pisando fundo no acelerador”, disse ele. “Meu nível de energia está bem alto no momento. Vejo oportunidades.”
Em Wisconsin, funcionários da Huth-Ben Pearson International, que produz máquinas de fabricação de tubos e canos, estão trabalhando quatro dias por semana este mês com salário reduzido. Kenneth Murray, o presidente da empresa, prometeu o retorno à programação de cinco dias em setembro. O número de funcionários é de 23, abaixo de uma alta de 27, e Murray não quer que esse número diminua.
“As pessoas não querem investir para impulsionar as coisas até saberem para que lado o vento está soprando”, disse Murray. As consultas sobre possíveis pedidos de máquinas de clientes novos e antigos estão relativamente fortes, mas os pedidos estão em baixa, marcando o segundo ano difícil consecutivo da empresa. Mas há um lado positivo: os trabalhadores tiveram tempo extra para limpar o equipamento.
Na manhã de quarta-feira, cerca de uma dúzia de agentes de crédito entraram na sede do Fountain Trust Co., banco comunitário centenário com sede na pequena Covington, Indiana. Eles iriam se reunir com os principais executivos do Fountain para comparar notas sobre os clientes que atendem.
Eles estão vendo sinais de resiliência econômica e incerteza crescente.
“As pessoas ainda estão fazendo coisas”, disse Lucas White, presidente do Fountain. “Ouvimos reclamações regularmente sobre como o básico está caro. Mas os consumidores ainda estão comprando coisas e as empresas ainda estão fazendo o que fazem e se expandindo.”
Ultimamente, porém, alguns clientes passam por suas agências locais com mais frequência para pedir a opinião dos funcionários sobre a saúde da economia.
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“No limite”, disse White, que também é presidente do Independent Community Bankers of America, grupo do setor, descrevendo o sentimento do cliente. “Não diria que estão ansiosos. Estão cientes da situação, mas a maioria ainda está gastando.”
As guerras na Europa e no Oriente Médio, uma eleição presidencial tensa e a recente turbulência do mercado levaram Bill Quackenbush, de 70 anos, a procurar um trabalho de consultoria na empresa de avaliação de private equity da qual se aposentou no ano passado.
Ele e sua esposa, Robin, adiaram uma viagem planejada para seu 50º aniversário de casamento e estão renunciando à compra de um carro novo, mantendo seu Toyota RAV4 2016. Eles querem estar preparados para o que acreditam ser a incerteza econômica que se aproxima, disse o casal de Newburgh, no estado de Nova York.
“Com a loucura do mercado, em vez de fazer saques, posso trabalhar meio período e não ter que tocar na minha aposentadoria”, afirmou Bill.
No ano passado, Aaron Arizmendi, que ensina espanhol em uma escola particular em Phoenix, abandonou os planos de substituir seu Lexus 2009. Ele também tem sido cuidadoso com seus gastos nos últimos anos, desconfiado dos altos preços que consomem suas economias, e reduziu as refeições fora, além de adiar algumas reformas na casa.
A mais recente incerteza econômica reforçou essa atitude. “Estou muito mais cauteloso sobre onde colocar meu dinheiro”, afirmou Arizmendi, de 41 anos.
Juan HernandezAriano, planejador financeiro certificado e diretor da WealthCreate em Houston, disse que vários de seus clientes aventam a hipótese de trabalhar um pouco mais, em vez de se aposentar nos próximos cinco anos conforme planejado.
No geral, ele não está vendo o nível de preocupação da época da recessão de 2007-09, da pandemia ou do colapso de 2023 do Silicon Valley Bank, ao falar com clientes. “Não é pânico, é curiosidade”, afirmou.
O setor imobiliário está contando com taxas de hipoteca mais baixas para atrair possíveis compradores que foram dissuadidos por juros altos e preços recordes.
“As pessoas estão preocupadas com o enfraquecimento da economia, mas acho que vão se animando com o fato de que haverá melhor acesso para a compra de imóveis, que é o que elas esperam há muitos meses”, disse Corey Burr, corretor de imóveis em Washington, D.C.
Taxas mais baixas também ajudariam o setor imobiliário comercial, que depende fortemente de empréstimos.
Para outros, emprego e renda são as principais preocupações.
Mindy DeHate, depois de perder seu emprego de diretora de operações em Minneapolis em junho e digerir as notícias recentes sobre os mercados de trabalho e de ações, cancelou uma viagem a Nova York e à Itália. Um divórcio no ano passado acabou com seu pé-de-meia, e ela espera conseguir um novo emprego antes que tocar em seu fundo de previdência, o chamado de 401(k).
“Estou extremamente hesitante em fazer até mesmo compras pequenas agora”, disse DeHate, de 54 anos.
A instabilidade no emprego abalou a família Taylor, em Dassel, Minnesota, pequena cidade a oeste de Minneapolis. Depois de perder o emprego, Aaron Taylor disse ter procurado centenas de empregos sem sorte.
Alex Taylor, de 32 anos, disse que sente que tem menos oportunidades de crescimento em seu trabalho em operações para uma empresa de saúde do que há alguns meses. Até recentemente, os Taylors sentiam que estavam na melhor situação financeira de sua vida, com uma casa de quatro quartos que compraram em 2021 a uma taxa de juros baixa e planos de viagem à Disney.
Mais recentemente, o casal decidiu começar a comprar presentes de Natal em parcelas, para que possam fazer quatro pagamentos com um mês de intervalo antes do Natal.
“Não sei como estará a situação daqui a quatro meses”, disse Alex. “Portanto, não posso esperar todo esse tempo para planejar tudo.”
Escreva para Jon Kamp em [email protected], Rachel Wolfe em [email protected], Ruth Simon em [email protected] e Justin Baer em [email protected]
traduzido do inglês por investnews