O que acontece com o seu corpo quando o treino é intenso demais
A rabdomiólise, condição em que o tecido muscular se rompe, pode causar danos renais e até matar
Todos nós já tivemos instrutores de fitness que nos estimulam a pegar mais pesado. Mas, o que pode acontecer se você ultrapassar seus limites?
Recentemente, os jogadores da equipe masculina de lacrosse da Universidade Tufts descobriram a resposta da maneira mais difícil, depois que um treino de 45 minutos com um Navy SEAL (membro da elite da Marinha americana) levou nove pessoas de um grupo de 50 ao hospital com uma condição chamada rabdomiólise. Eles já tiveram alta.
A rabdomiólise ocorre quando o tecido muscular se rompe e libera proteínas e outras substâncias no sangue. Pode causar danos renais, arritmias cardíacas perigosas, convulsões e até morte.
Os principais sintomas que podem indicar o desenvolvimento de rabdomiólise são a presença de urina com tons vermelho-escuro ou marrom e dor muscular intensa em repouso, que persiste por vários dias.
A rabdomiólise não é comum, mas há indicações de que os casos estão acontecendo com mais frequência. Um estudo de 2021 que analisou relatos de 2000 a 2019 mostrou que as hospitalizações por rabdomiólise decuplicaram nos EUA entre a primeira e a segunda década estudadas.
A causa é na maioria das vezes um treino intenso, mas o quadro também pode ser desencadeado por trauma muscular, como uma queda forte ou uma queimadura.
Homens jovens correm maior risco. Esse quadro também é mais comum em pessoas com traços genéticos de anemia falciforme, um distúrbio do sangue.
Médicos e pesquisadores creditam esse aumento à popularidade de exercícios intensos, como HIIT ou CrossFit, à pressão de treinadores e à própria conscientização sobre a existência da rabdomiólise.
O que aumenta o risco
Shaun Johnson, de 40 anos, é aficionada por fitness e se exercita regularmente em uma academia HIIT em Phoenix, onde também dá aulas.
No começo de junho, ela decidiu fazer um treino Murph — desafio popular com o nome de um Navy SEA. Consiste em: uma corrida de 1,6 quilômetro, 100 barras, 200 flexões, 300 agachamentos e outra corrida de 1,6 quilômetro; vestindo um colete de dez quilos.
“Me esforcei muito além do meu nível”, reconhece ela.
Após uma hora do treino, Johnson não conseguia mais esticar os braços, que estavam inchados. Nas duas noites seguintes, não conseguiu dormir direito. Notou que sua frequência cardíaca estava irregular e começou a ter confusão mental. Três dias depois, seus músculos estavam inchados como os do Popeye, conta.
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Um de seus treinadores mencionou a rabdomiólise. Quando percebeu que sua urina estava marrom, ela foi para o pronto-socorro. Acabou passando seis dias internada no hospital recebendo medicação intravenosa.
Seus braços ainda estão fracos e, embora tenha começado a se exercitar há cerca de um mês, ela diz que o faz com 20% da capacidade anterior. “Estou indo bem devagar”, diz.
Infelizmente, não há uma maneira definitiva de saber se você está pegando pesado a ponto de acabar desenvolvendo rabdomiólise. Sentir que está dando duro é bom, mas dor, náusea e fraqueza muscular significam que você está exagerando, diz Abbi Lane, professora assistente de ciência do exercício na Escola de Cinesiologia da Universidade de Michigan.
A condição é mais comumente associada ao levantamento de peso do que a exercícios aeróbicos, afirmam alguns médicos, mas pode resultar de qualquer atividade prolongada e de alta intensidade.
O exercício de intensidade normal não oferece o risco de rabdomiólise, diz Adam S. Lepley, professor assistente e diretor do Laboratório de Pesquisa de Desempenho da Universidade de Michigan. O risco vem do “esforço físico excessivo”, diz ele.
Alguém que não se exercita e faz uma aula de spinning intensa de uma hora pode estar em risco, porque esta é uma grande mudança para o corpo, enquanto alguém com um nível de condicionamento físico mais alto tem um limite mais alto, explica a dra. Kelly Estes, especialista em medicina de emergência e esportes de cuidados primários da Clínica Cleveland.
Não há um número oficial dos casos de rabdomiólise — que nem sempre acabam em hospitalização —, mas um estudo em 1995 estimou cerca de 26 mil por ano. A condição provavelmente é subestimada porque as pessoas nem sempre vão ao médico se tiverem sintomas mais leves, diz Estes.
Alguns indivíduos com condições genéticas como a distrofia muscular de Duchenne também correm maior risco de desenvolver o quadro, assim como quem apresenta certas condições metabólicas ou mitocondriais.
Prevenção e tratamento
Algumas precauções podem ajudar. Certifique-se de beber bastante água e de que sua urina tenha um tom amarelo pálido.
Monitorar sua frequência cardíaca durante um treino pode ser útil, diz Lane. Comece de forma moderada — treinando a 60% da sua frequência cardíaca máxima — e vá lentamente se exercitando em níveis de intensidade mais altos. Atingir 85% da sua frequência cardíaca máxima durante o treino pode melhorar o condicionamento físico, mas deve ser feito com cautela, avisa Lane.
Os médicos podem diagnosticar a rabdomiólise com um exame de sangue, verificando o nível de creatina quinase (CK), enzima que chega à corrente sanguínea quando o músculo é danificado. A rabdomiólise também pode ser diagnosticada com um exame de urina que verifica os níveis de mioglobina, outra proteína liberada quando o músculo se rompe.
O tratamento geralmente envolve soro intravenoso ou eletrólitos diferentes. Casos extremos que resultam em danos renais podem exigir diálise.
Escreva para Sumathi Reddy em [email protected]
traduzido do inglês por investnews