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Como os EUA tentam desafiar o controle da China sobre o cobalto

O governo Biden conversou com pelo menos três empresas sobre a possibilidade de elas comprarem uma mineradora do Congo

Por Alexandra Wexler The wall street Journal
Publicado em
7 min
traduzido do inglês por investnews

O governo Biden conversou com três empresas nas últimas semanas sobre a compra de uma das maiores produtoras de cobalto não-chinesas do mundo, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto, agora que os EUA tentam afrouxar o controle global de Pequim sobre um metal visto como central para a transição energética.

As negociações que envolvem a Chemaf, uma empresa de mineração com sede na República Democrática do Congo, são parte de uma tentativa do governo de garantir o fornecimento global de um metal cujo uso engloba desde baterias de carros elétricos até caças e drones.

Por mais de uma década, empresas chinesas gastaram bilhões de dólares comprando mineradoras americanas e europeias no Congo, que produz quase 75% do suprimento mundial de cobalto. Isso colocou a China em uma posição dominante tanto na produção quanto no processamento do minério.

O governo Biden prometeu bilhões de investimento em projetos de infraestrutura em toda a África, incluindo uma ferrovia destinada a transportar minérios congoleses, como cobre e cobalto, através de Angola até o porto de Lobito, no Oceano Atlântico. Mas tem sido difícil para o governo despertar o interesse de investidores americanos em qualquer setor no Congo por causa da infraestrutura precária do país, da mão de obra pouco qualificada e da reputação de corrupção governamental.

Guichê de pagamento em dinheiro para mineradores informais, em uma instalação de cobalto da Chemaf em Kolwezi. A imagem é de 2018. Foto: Alexandra Wexler/WSJ

“As coisas estão melhorando, mas ainda é um lugar complicado para operar”, disse Daniel van Dalen, analista sênior da Signal Risk, empresa de consultoria de risco político com foco na África.

Biden prometeu assumir um papel mais ativo na busca de maneiras de motivar as empresas americanas a investir no Congo. Ele planejava visitar Angola este mês, mas adiou a viagem para se concentrar na resposta aos furacões que atingem os EUA.

Nas últimas semanas, autoridades do governo americano conversaram com a empresa de mineração e inteligência artificial KoBold Metals, a mineradora de cobre First Quantum Minerals e a empresa de investimentos Orion Resource Partners sobre a participação em um acordo para adquirir a Chemaf, separadamente ou em conjunto, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. 

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É a segunda vez em um ano que Washington tenta gerar interesse ocidental na mineradora e reflete uma retomada da atitude dos EUA em relação à proteção de minerais críticos. O país pede a compradores e nações que Washington vê como amigáveis que considerem vários ativos de mineração em todo o mundo. 

Os congoleses também têm conversado com possíveis interessados. Os países estão trabalhando juntos para garantir que o processo de encontrar um novo comprador seja justo e transparente, disse uma das pessoas. 

Autoridades dos EUA disseram que seu objetivo é oferecer um modelo que não resulte em endividamento, corrupção e degradação ambiental. 

A Chemaf foi colocada à venda no ano passado por seu fundador, Shiraz Virji. Na época, as autoridades americanas procuraram mineradoras ou investidores ocidentais para comprar a empresa, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. 

As práticas comerciais e as dívidas anteriores da Chemaf complicaram uma possível venda, segundo pessoas familiarizadas com o assunto.

Quando o Wall Street Journal visitou a mina Mutoshi da Chemaf em 2018, mineiros congoleses autônomos podiam ser vistos descendo sem capacete, sem sapato ou sem equipamentos de segurança. Eles usavam picaretas, pás e mãos nuas para desenterrar rochas ricas no minério. A água chegou a inundar alguns buracos e afogar os mineiros, e uma escavadeira enterrou viva uma pessoa, disseram trabalhadores locais e funcionários da mina.

De acordo com ex-executivos, a empresa recorreu a subornos algumas vezes no passado. Virji não respondeu a um pedido de comentário. Pessoas próximas disseram que ele se afastou do dia-a-dia da empresa.

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A Trafigura, gigante do comércio de commodities com sede na Suíça e Singapura e parceira de longa data da Chemaf, conseguiu um empréstimo de US$ 600 milhões em 2022 para concluir a mecanização da mina Mutoshi, construir uma fábrica de processamento e expandir o processamento na mina Etoile. Em troca, a Trafigura negociaria todo o hidróxido de cobalto produzido pelas minas até 2027.

Alguns possíveis compradores da Chemaf acharam o preço de aquisição muito alto, em parte porque qualquer venda dependeria da compensação da Trafigura, de acordo com pessoas envolvidas na venda.

No ano passado, a Chemaf disse que precisava de US$ 250 milhões a US $ 300 milhões adicionais para concluir os projetos, dado os baixos preços do cobalto.

A Chemaf atualmente tem US$ 900 milhões em dívidas, incluindo dinheiro devido a um grande número de terceirizados no país, segundo uma pessoa próxima à empresa.

Em junho, a Chemaf concordou com a venda para a Norin Mining, apoiada pelo Estado chinês. Pouco depois, a pressão dos EUA ajudou a impedir a venda, de acordo com pessoas familiarizadas com a transação. O governo congolês também estava ansioso para diversificar os parceiros chineses, disseram as pessoas. 

Um porta-voz da Chemaf, no entanto, disse que a empresa ainda está buscando uma possível venda para a Norin Mining.

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E os EUA estão mais uma vez tentando encorajar um comprador ocidental, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. Duncan Blount, presidente-executivo da empresa norte-americana Chilean Cobalt Corp., analisou o projeto no ano passado, mas disse que era muito caro, além de haver outras preocupações. Recentemente, afirmou estar ainda interessado, e disse ao Departamento de Estado que mantém conversas com outras empresas sobre a formação de um consórcio.

Fazer negócios no Congo pode ser complicado mesmo para empresas que estão lá há anos. A gigante de commodities Glencore recentemente teve alguns de seus ativos congoleses congelados em meio a uma disputa sobre royalties, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. A Bloomberg relatou anteriormente o congelamento. 

Em geral, os investidores americanos querem que Washington ofereça incentivos para investir no Congo, possivelmente incluindo apoio financeiro, seguro contra expropriação ou aumentos repentinos de impostos e isenções à Lei de Práticas de Corrupção no Exterior, de acordo com participantes do setor.  

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“Sem esses instrumentos, eles não poderão investir”, disse Christian-Geraud Neema Byamungu, editor da África do Projeto China-Sul Global, organização sem fins lucrativos. “Um equilíbrio ou compromisso terá que ser estabelecido entre princípios humanitários e geopolítica.”

A Anglo American, a Rio Tinto e a KoBold estão considerando projetos de mineração no Congo, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. 

O governo dos EUA perguntou recentemente à empresa de cobre Freeport-McMoRan, com sede em Phoenix, se estaria interessada em retornar ao Congo, disseram pessoas familiarizadas com o assunto. A Freeport operou lá até 2016, quando, durante um período conturbado, vendeu sua participação em uma mina de cobre e cobalto para uma empresa chinesa para levantar dinheiro.

A Freeport não está atualmente focada na aquisição de novos ativos, mas voltaria para o projeto certo, disse uma das pessoas. Ainda não analisou a Chemaf, disse a pessoa.

Escreva para Alexandra Wexler em [email protected] e Julie Steinberg em [email protected]

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