Entre ‘malandros’ e ‘manés’: como reconhecer as avaliações falsas na internet?
Pode ser difícil separar o que é real do que é falso. Mas não se você souber o que procurar. Aqui está o que a pesquisa nos ensina.
Levanta a mão quando você identificar algo que já aconteceu contigo.
Você leu ótimas críticas on-line sobre um restaurante ou hotel e fez uma reserva. Então, quando chega lá, se pergunta se está no mesmo lugar visitado por quem deixou os comentários.
É aí que você percebe: eram avaliações falsas.
Essas avaliações falsas podem representar uma grande porcentagem das informações disponíveis — desde 16%, segundo estimativas conservadoras, podendo chegar a 40% do total de comentários. Algumas delas são elogios dos próprios funcionários, de um software de inteligência artificial ou de pessoas contratadas para falar bem do lugar. Outras são notas negativas de ex-funcionários ou concorrentes descontentes.
O problema é tão difundido que a Comissão Federal de Comércio acaba de criar uma nova regra que punirá civilmente os infratores que pagarem por avaliações ou depoimentos falsos. Além disso, plataformas de avaliação e agências de viagens on-line estão intensificando esforços para eliminar avaliações falsas antes que elas apareçam on-line.
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Não é fácil para as pessoas distinguirem o real do falso. Shabnam Azimi, professor associado de marketing da Universidade Loyola de Chicago, conduziu uma pesquisa que visava determinar se humanos são bons em apontar avaliações falsas. “Descobrimos que, no geral, percebemos quais avaliações são reais em cerca de metade do tempo”, diz Azimi. “Na detecção de mentiras, não somos melhores do que um lançamento de moeda.”
A boa notícia é que pesquisadores e viajantes experientes encontraram uma série de estratégias eficazes para detectar o que é falso. Eis algumas de suas melhores dicas.
‘Me mostre a sua cara‘
Um dado clássico de avaliações duvidosas: não há foto de perfil.
Lawrence Hoc Nang Fong, professor associado de gestão de turismo da Universidade de Macau, estudou as avaliações que o Yelp designa como “não recomendadas” porque, segundo ele, disparam alarmes de possíveis falsificações. (Um porta-voz do Yelp diz que essas avaliações não são necessariamente falsas, mas que o software do Yelp as determina como “menos confiáveis e pouco úteis”.)
No estudo, “46,9% das avaliações falsas não têm foto de perfil dos revisores, enquanto 19,9% das avaliações autênticas não têm fotos de perfil”, diz ele. “Portanto, procure fotos de perfil para ajudar a determinar quais avaliações são reais e quais não são.” É possível fazer também uma pesquisa de imagens on-line com as fotos do perfil para ver se a pessoa é realmente quem afirma ser.
Dividindo a culpa
Pessoas contratadas para escrever avaliações falsas não gostam de usar a palavra “eu”. Em um artigo publicado no ano passado, os pesquisadores descobriram que aqueles que as escreviam evitavam o uso de pronomes da primeira pessoa do singular e optaram por “nós”.
Por quê? Alguns indivíduos recrutados para produzir opiniões falsas para o estudo disseram que usaram pronomes coletivos para compartilhar a responsabilidade com outras pessoas imaginárias (como uma “família” inexistente), e para criar algum distanciamento psicológico entre eles e o suposto leitor.
É claro que o uso de “nós” em vez de “eu” nem sempre revelará uma farsa, mas pode ajudar no seu processo de decisão.
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Verifique a data
Outra pista importante pode ser quando as avaliações são postadas. Grupos de postagens semelhantes surgindo na mesma época podem revelar uma campanha contratada, de acordo com pesquisas recentes.
Por exemplo, as empresas compram uma grande quantidade de avaliações falsas de sites de trabalhadores temporários ou recorrem a redação de IA pouco antes de um grande evento, como uma grande maratona, quando sabem que visitantes estarão em busca de reservas.
Alton Chua, professor associado da Universidade Tecnológica de Nanyang, em Singapura, sugere a leitura das resenhas anteriores e posteriores a qualquer postagem.
“Por exemplo, se várias opiniões semelhantes forem postadas com textos muito parecidos e em intervalos de tempo próximos, isso é suspeito”, diz o pesquisador. Da mesma forma, “imagens semelhantes usadas em avaliações também são um sinal de não autenticidade”.
Detalhes importam
As avaliações falsas geralmente têm poucos detalhes, mas estão repletas de pontos de exclamação, palavras em maiúsculas e superlativos vagos como “incrível” e “horrível”, de acordo com a pesquisa. Elas também tendem a ser mais curtas do que as reais: a pesquisa sugere que as autênticas contêm menos palavras longas, mas as frases são mais elaboradas.
As avaliações pagas, por sua vez, tendem a ter poucas palavras e poucos detalhes, já que empresas que oferecem esse “serviço” são normalmente compensadas pelo número de postagens, não necessariamente pelo tamanho, de acordo com especialistas.
As avaliações reais, por outro lado, costumam ter detalhes, como casos ocorridos em uma viagem ou sobre as refeições servidas.
“Se a resenha diz: “É tão bonito” e as frases são curtas e desconexas, não acredito na veracidade”, diz Meg Nolan, consultora de viagens da Friend of a Friend Trip Design, com sede em West Palm Beach, na Flórida.
“Por outro lado, se alguém escreve seis frases sobre como a equipe de check-in deu a eles um quarto vago para se trocar, para que pudessem usar a piscina enquanto esperavam que o quarto estivesse pronto, esse nível de detalhes me leva a supor que foi escrito por um hóspede real.”
Outro aspecto bem importante, de acordo com uma pesquisa da Universidade de Cornell, é o uso de descrições espaciais, como o tamanho de um quarto ou a direção para a qual a varanda está voltada — detalhes que os autores provavelmente não saberiam a menos que tivessem estado na propriedade.
Da mesma forma, o estudo concluiu que o uso de muitas palavras concretas e sensoriais associadas à audição, tato, paladar, olfato ou visão é uma possibilidade decente da veracidade das avaliações.
No entanto, os especialistas sugerem que um detalhe concreto específico pode ser um sinal de alerta: citar o nome de um funcionário. “É possível que o hotel ou restaurante tenha oferecido algum tipo de prêmio para a pessoa que recebeu mais avaliações naquela semana”, diz Nolan, então o funcionário pode ter pedido às pessoas que escrevessem avisos falsos. “Ignore-os”, avisa Nolan.
Se você está preocupado com as avaliações geradas por IA, estudos feitos internamente por grandes sites de avaliação de viagens mostraram que o software de IA é muito ruim em indicadores espaciais e muitas vezes não possui aquele brilho humano conhecido como personalidade. Mas prepare-se: a IA vai melhorar.
Faça algumas verificações extras
Outra maneira de se proteger é procurar avaliações do mesmo hotel, restaurante ou operadora de turismo em vários sites. Verifique se foram simplesmente copiadas e coladas de um site para outro (“Assumo que isso é falso”, diz Nolan) e se são consistentes.
No mínimo, as avaliações em todas as plataformas não devem ser confiáveis se não conseguirem incluir fatos básicos, como se uma propriedade tem piscina ou se há muito barulho da rua.
Evite os extremos
Quando examinam as avaliações, turistas experientes como Rahul Mehta, executivo financeiro e viajante frequente, muitas vezes ignoram as anotações de uma e de cinco estrelas.
Normalmente, pessoas experientes como Mehta dizem que as cinco estrelas simplesmente indicam que o lugar ou a experiência foi entregue exatamente como o esperado, o que é “o mínimo, e não uma informação realmente significativa”, enquanto uma estrela pode ser uma exceção ou alguém que brigou com o pessoal da recepção. Na pior das hipóteses, elas são falsas; na melhor das hipóteses, não são muito úteis.
Mehta diz que dá mais valor às críticas medianas do que aos extremos. “Uma propriedade que tem duas avaliações de cinco estrelas tem menos peso do que outra classificada com quatro estrelas por 85 avaliadores”, diz. Ele definirá um filtro para destacar as avaliações de duas a quatro estrelas e lerá algumas negativas. “As positivas repetem a mesma coisa”, diz ele. “As informações novas para mim são as críticas negativas.”
Heidi Mitchell é escritora em Chicago e Londres. Ela pode ser contatada em [email protected].
traduzido do inglês por investnews