Na On, produzir um tênis é mais rápido do que correr com ele
A marca suíça On desenvolveu uma nova maneira de fazer tênis. Agora precisa aumentar a produção e conquistar os consumidores.
A marca de tênis On ganhou visibilidade pela primeira vez quando decidiu inovar com uma sola cheia de buracos. Agora, está colocando suas fichas em um calçado feito com spray que mais se parece com uma meia.
O modelo nada convencional é o resultado de uma nova tecnologia que vai borrifando a metade de cima do tênis em um suporte no formato de pé, enquanto gira em um braço robótico.
O sistema LightSpray não apenas produz um tênis incomum, mas elimina a necessidade de produzir e costurar pedaços de material. O calçado fica pronto em três minutos, e este é mais um passo para automatizar uma indústria que ainda depende muito do trabalho humano.
“Em um tênis tradicional, são necessários 200 pares de mãos trabalhando. Neste, você basicamente tem agumas poucas”, disse Marc Maurer, um dos CEOs da On.
O primeiro tênis comercial produzido com o spray é o Cloudboom Strike LS — leve e sem cadarço, custando US$ 300 o par e mirando corredores profissionais. O preço é aproximadamente o mesmo que o mais recente super tênis da Nike, e mais barato que um produto rival da Adidas. A On agora planeja ampliar a tecnologia LightSpray para lançar nos próximos anos versões mais baratas de tênis de corrida, além de outros modelos casuais.
Expandir a produção do LightSpray traz desafios. A tecnologia é um desenvolvimento empolgante, “mas não será um divisor de águas, a menos que consigam torná-la acessível”, fazendo do tênis um item para o público em geral, disse Matt Powell, consultor de calçados da Spurwink River, citando o preço inicial do produto.
Também não há garantia de que os consumidores vão gostar dos modelos. Embora geralmente positivas em relação à sensação e ao desempenho, algumas avaliações iniciais apontam que o tênis pode ser difícil de calçar, e existem preocupações sobre a conservação da estrutura ao longo do tempo.
Maurer disse que o visual pode ser controverso, mas que fazer sucesso com um produto diferente é preferível a lançar algo que não chama a atenção.
A On é uma das várias marcas de tênis de rápido crescimento. A Hoka, de propriedade da Deckers, é outro exemplo que se destaca. E ambas podem ameaçar a Nike e a Adidas ao ganhar participação de mercado.
A maioria das grandes marcas de tênis afirma defender a inovação. A Adidas e a Nike fabricaram tênis de corrida superleves usados por atletas que quebraram recordes de maratona no ano passado. Mas ambas as marcas ainda fazer os calçados de maneira convencional.
Para uma recém-chegada como a On, a criatividade é mais vital do que para as tradicionais, disse Maurer. Enquanto a Adidas tem o Samba e a Nike tem o Air Force 1 — estilos testados, aprovados pelos consumidores e que podem ser relançados infinitamente — a On “não tem um histórico de coisas velhas”, disse ele.
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A On começou em 2010 como um experimento, quando o triatleta suíço Olivier Bernhard cortou uma mangueira de jardim e colou os pedaços dela nas solas de seus tênis de corrida para garantir amortecimento extra. Essa ideia acabou se tornando a sola CloudTec da On. Com grandes furos, ela é visualmente diferente das solas dos tênis rivais, qualidade que ajudou os produtos da marca a se destacarem.
‘Você faz, nós pagamos‘
Tendo ganhado fama com sua sola incomum, a On agora se preocupa em mudar a metade de cima dos tênis.
O projeto LightSpray começou em 2019, quando um dos desenvolvedores da empresa viu no Milan Design Show o estudante Johannes Voelchert demonstrando um spray de cola quente que ele havia adaptado de um brinquedo de Halloween. Em vez de esguichar teias de aranha, o dispositivo estava sendo usado para criar formas tridimensionais complexas.
Vendo o potencial, a On contratou Voelchert como estagiário no “espaço de criação” da empresa, onde trabalhou sozinho tentando descobrir se poderia produzir um calçado.
“Dissemos apenas: ‘Você faz, nós pagamos’, e demos a Johannes seu canto no andar de cima e um braço robótico”, contou Ilmarin Heitz, diretor sênior de inovação da On.
Após um ano de pesquisa, a On recrutou uma equipe de desenvolvimento de 20 pessoas, das quais apenas três tinham experiência com design de calçados. O grupo incluía cientistas de materiais, especialistas em modelagem 3D e especialistas em robótica — pessoas com habilidades para desenvolver um novo processo de produção. Voelchert foi de estagiário a líder sênior de Desenho de Tecnologia Inovativa.
O ajuste dos detalhes foi um processo árduo. A parte borrifada do tênis é feita de polímeros sintéticos, que se comportam de maneira diferente dependendo de como são combinados, aquecidos e pulverizados. A equipe tentou centenas de arranjos diferentes antes de encontrar uma fórmula durável, mas que fosse também flexível e confortável.
Para fazer o calçado, um filamento de polímero de 1,6 quilômetro de comprimento é liberado em um molde padrão. Primeiro, ele é colado a uma sola pré-fabricada e depois o material é colocado em camadas até que a parte superior esteja totalmente formada. Cores e logotipos são impressos a laser no tênis.
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Voelchert disse que o processo pode ser refinado ainda mais, reduzindo o tempo de produção de três minutos para dois. A equipe também está trabalhando no aprimoramento da tecnologia para produzir um tênis completo, incluindo a sola.
Embora grandes fábricas consigam produzir calçados convencionais com rapidez, a LightSpray promete simplificar o processo, condensando a cadeia de suprimentos em um único insumo, o polímero, e eliminando a maioria dos trabalhadores humanos. As máquinas poderiam ser distribuídas globalmente, acabando com a prática cara e demorada de enviar produtos fabricados na Ásia.
A On tem apenas duas máquinas LightSpray, mas planeja construir outras para aumentar a produção.
O ‘runch’ diário
A On testou seu novo tênis há alguns meses, enviando um par para a atleta queniana Hellen Obiri antes da Maratona de Boston em abril.
“Eu estava desconfiada, tive muitas dúvidas”, disse Obiri, recordando sua reação ao ver o tênis pela primeira vez. Então, ela bateu seu recorde na primeira sessão de treinamento usando os tênis LightSpray.
Obiri venceu a Maratona de Boston com os tênis, antes de conquistar a medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Paris.
Um lançamento comercial limitado se seguiu e várias centenas de outros pares devem ser lançados este mês. A On não divulgou números de vendas, mas diz que dezenas de milhares de pessoas registraram interesse em comprar os tênis.
Nos primeiros dias da empresa, o fundador da On convidou lojistas para uma corrida para convencê-los de que seus tênis de aparência incomum realmente funcionavam.
Em 2019, o tenista suíço Roger Federer tornou-se um investidor.
A grande chance da On veio durante a pandemia, quando grandes marcas como a Nike abandonaram os varejistas para vender mais produtos por meio de lojas online. A fabricante de tênis correu para preencher o espaço nas prateleiras e comprou a capacidade de produção ociosa à medida que os rivais reduziam sua produção.
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As vendas da empresa aumentaram 47%, para cerca de US$ 2,1 bilhões no ano passado, com o lucro líquido subindo 38%, chegando a cerca de US$ 92 milhões. Dois terços das vendas vêm dos EUA, onde a On foi listada em 2021.
A sede da empresa fica em Zurique. Alguns funcionários vão trabalhar nadando pelo rio Limmat — rebocando suas roupas, telefones e laptops em sacos de proteção — e compartilham diariamente o “runch”, uma corrida na beira do rio seguida de almoço na cantina vegana.
No início deste ano, Kris Hartner, que dirige a Naperville Running, rede de lojas de esportes em Illinois, se tornou uma das primeiras pessoas a colocar as mãos em um par de LightSpray.
Hartner viu centenas de estilos de tênis ao longo dos anos, mas “nunca um assim”, disse ele. “É um ótimo momento para ser um geek de calçados!”
traduzido do inglês por investnews