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O que as pesquisas feitas no Google revelam sobre as pessoas? Livro explica

Em ‘Todo mundo mente’, de Seth Stephens-Davidowitz, é discutido sobre o comportamento dos indivíduos em diversos contextos, especialmente na internet.

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Quando li o livro “Todo mundo mente”, de Seth Stephens-Davidowitz, economista formado por Harvard, ex-cientista de dados do Google (GOGL34) e articulista do New York Times, confesso que fui em busca de conhecimentos sobre o que poderia descobrir mais sobre a netnografia, ramo da etnografia que estuda os rastros deixados pelas pessoas nos meios digitais. É fantástico!

Pois bem, o autor, sendo um ex-cientista de dados da Google, fundamenta o contexto do livro com base em suas pesquisas em torno do universo do mundo digital e também das pesquisas de opinião. Para ele, as redes sociais são ambientes “ideais” para seu principal argumento neste livro, que é: todo mundo mente.

Ele nos coloca como fortes aliados do hábito de mentir e, dessa maneira, de quem pode até passar uma ideia de imagem verdadeira.

Um apurado rol de mentiras sociais 

Seth Stephens-Davidowitz atesta que as pessoas mentem sobre tudo, principalmente nas redes sociais, onde há um grande incentivo para transmitir uma boa imagem. Assim acredito que as mídias sociais são como uma casa de espelhos nos parques de diversão, que distorcem a sua imagem real.

Vamos lá o diz o Seth sobre o tema:

  • Mentem sobre a frequência com que vão à academia; 
  • Sobre quanto custou o sapato novo ou se leram determinado livro; 
  • Mentem quando faltam ao trabalho por doenças fictícias; 
  • Dizem que manterão contato e desaparecem; 
  • Falam que o problema não é você, quando é;
  • Declaram um amor que não sentem; 
  • Chegam a proclamar aos quatro ventos sua felicidade, quando estão em frangalhos;
  • Alegam gostar de mulheres quando, de fato, preferem homens. Ou vice-versa;
  • As pessoas mentem para os amigos. Mentem para os chefes. Para os filhos. Para os pais; 
  • Chegam a mentir para os médicos. 

E, com certeza, aí chegamos a um ponto interessante do livro: “mentem para pesquisas de opinião”, afirma Seth Stephens-Davidowitz, com uma clareza fantástica nesse seu livro. 

E por que as pessoas mentem nas pesquisas de opinião e nas mídias sociais?

Tendo sob argumento que, cerca de um terço do tempo, as pessoas mentem na vida real, esse hábito é transferido para as pesquisas, menos um pouco do que nas redes sociais. 

Como dito anteriormente, na mídia social, assim como em pesquisas, não há incentivo para se dizer a verdade. É como se ali existisse um “universo” paralelo.

O poder do efeito ‘desejabilidade social’ 

Muitas pessoas omitem seus comportamentos e pensamentos desagradáveis em pesquisas de opinião ou em “focus group”, isso porque “todos querem passar uma boa imagem, mesmo quando o anonimato é garantido”, reforça o autor. Para esse comportamento, chama-se “propensão de desejabilidade social”, assinala Stephens-Davidowitz. 

Em outras palavras, nas mídias sociais a presença online não é anônima.  “Você tenta agradar um público e dizer a seus amigos, familiares, colegas, conhecidos e estranhos quem você gostaria de ser”, assinala o autor.

Portanto, atesta Seth: “nunca compare o que dizem as pessoas nas mídias sociais”. E alerta para não cair nesta terrível armadilha de falsas percepções. Ou melhor: “nunca compare suas buscas no Google com os posts nas redes sociais”, pois os resultados são díspares e levam a equívocos fantásticos.

Compare sim, sugere o autor, por exemplo, a forma com que as pessoas descrevem seus perfis na mídia social e o que realmente escrevem nas buscas anônimas do Google! As buscas revelam o que realmente você quer saber e não o que você quer dizer.

Os segredos ocultos na caixinha mágica do Google 

Netnografia é o ramo da etnografia que estuda os rastros deixados pelas pessoas nos meios digitais. Esse é um assunto que me fascina, desde 2008, quando publiquei um primeiro post sobre o assunto no Blog Acheme7 juntamente com o Jornalista Manoel Fernandes.

Seth é um especialista em dados de internet. “Todos os dias, sigo os rastros digitais deixados pelas pessoas enquanto navegam na web. A partir dos botões ou teclas que clicam ou digitam, tento entender o que realmente querem, o que realmente fazem e quem realmente são”. 

Assim, entendo que o autor é um verdadeiro netnografo. Um expert de saber identificar o segredo revelado de onde não se mente.

A caixinha mágica é a busca do Google 

Uma das ferramentas citadas pelo autor é o Google Trends, um registro sistemático das buscas do Google, lançado com pouco alarde em 2009, que informa aos usuários com que frequência qualquer palavra ou frase foi pesquisada em locais diversos, em diferentes momentos. As buscas por informações são, por si só, informação. Dados preciosos.

Dessa forma, pense, neste momento, que você está lendo essa resenha, na sua própria experiência usando o Google. Aposto que você já deve ter digitado coisas na caixa de busca que revelam um comportamento ou pensamento que hesitaria em admitir em uma situação nas mídias sociais ou numa roda de amigos ou familiares. Isso é constatado cientificamente pela análise da netnografia.

Um verdadeiro soro e confessionário da verdade digital 

Economistas e outros cientistas sociais estão sempre à caça por novas fontes de dados. Neste sentido, o autor é direto e afirma: “estou agora convencido de que as buscas no Google são o conjunto de dados mais importantes jamais coletados sobre a psicologia do comportamento”.

As pessoas não apenas fazem suas buscas, como também usam a busca no Google para desabafar: “odeio meu chefe”, “estou bêbado”, “meu pai me bateu”. 

O ato cotidiano de digitar uma palavra ou frase em uma pequena caixa branca retangular deixa um pequeno rastro de verdade. Diria, mágico!

Uma compreensão melhor das pesquisas eleitorais 

As ideias descritas no livro de Seth Stephens-Davidowitz nos trazem uma outra visão sobre as pesquisas eleitorais e creio muito úteis no atual momento político no Brasil. Quanto mais estudava, diz o autor, “mais descobria que as buscas no  Google detêm muitas informações que são ignoradas pelas pesquisas e que são úteis para compreender, dentre muitos e muitos assuntos, as pesquisas eleitorais”. 

As  buscas no Google por “como votar” ou “onde votar” semanas antes de uma eleição podem prever com precisão quais partes do país terão grande comparecimento às urnas.

Saiba um detalhe que leva a nova forma de previsão eleitoral 

Em um dos capítulos, o autor indica que uma pessoa é significativamente mais propensa a digitar primeiro o nome do candidato que apoia em uma busca, ao invés de incluir os nomes dos eventuais concorrentes. E mais: a ordem em que os candidatos são pesquisados também parece conter informações que as pesquisas ignoram. Pense nisso!

Mais uma descoberta poderosa: o grotesco e o inusitado 

Um exemplo sutil e, aparentemente, grotesco, o autor cita em um dos capítulos do livro. Ele comprova que temas “aparentemente” somente digitados na caixinha mágica de busca do Google não seriam revelados nas mídias sociais nem tão pouco nas pesquisas de opinião. 

No livro, Seth cita alguns exemplos revelados no Google Trends (a caixa mágica de buscas), inexistentes nas mídias sociais ou pesquisas:

  • Os  homens são obcecados por pesquisas no Google pelo tamanho de seus pênis; 
  • Mulheres fazem quase o mesmo número de buscas expressando preocupação sobre as próprias genitais que os homens. No entanto, a maior preocupação expressada pelas mulheres é o odor — e como podem melhorá-lo. 

A simbologia do texto

Outra temática polêmica citada por Seth foi com base em estudos realizados pelos economistas Matt Gentzkow e Jesse Shapiro. Os estudiosos notaram algo interessante: dois jornais empregavam linguagens visivelmente diferentes para relatar a mesma história

O Washington Times, que tem a reputação de ser conservador, escreveu a seguinte manchete: “Homossexuais ‘se casam’ em Massachusetts”. Já o Washington Post, que tem a reputação de ser liberal, relatou uma vitória para os “casais do mesmo sexo”.

Ora, o que isso pode nos mostrar em termos de netnografia? O  uso de texto como dados nos dá percepções inéditas sobre o que o público quer de verdade, que pode ser diferente do que autores ou produtores pensam que ele quer. 

Aqui entra outra percepção fantástica evidenciada no livro. Serão as notícias positivas que vendem jornais ou programas? 

Para Seth e sua análise sobre os dados na web: “quanto mais positivo o conteúdo, maior a probabilidade de viralizar”. Note que isso parece contradizer com a sabedoria jornalística tradicional de que as pessoas são atraídas por histórias violentas e trágicas. 

É bem verdade que a mídia de notícias oferece uma profusão de histórias sombrias ao público. Há algo de verdadeiro no ditado jornalístico que diz: “se sangra, anda”, acrescenta Seth, nesse trecho.

Porém, o estudo dos professores da Wharton indica o contrário: que as pessoas preferem histórias mais alegres e positivas. Pode até sugerir um novo ditado: “se é feliz, é compartilhado”, essa nova verdade nas mídias digitais. 

O case Netflix: o que falo não é o que faço

Um exemplo atual e da ordem do dia. A Netflix (NFLX34) permitia que os usuários criassem uma lista de filmes a que queriam assistir no futuro, mas que não tinham tempo no momento.

Dessa forma, quando tivessem mais tempo, a Netflix lhes recordaria sobre aqueles filmes. Assim diziam seus usuários. 

Entretanto, a Netflix percebeu algo estranho nos dados. Os usuários enchiam suas listas com inúmeros filmes. Mas dias depois, quando eram notificados, raramente clicavam no link. Qual era o problema? 

As pessoas mentiam para si mesmas reiteradamente. Diante dessa disparidade, a Netflix parou de perguntar aos usuários o que queriam assistir no futuro e começou a criar um modelo baseado em milhões de cliques e visualizações de clientes semelhantes. Ou seja, a caixinha mágica do Google voltou!

A empresa começou a oferecer aos usuários listas de filmes sugeridos com base não no que alegavam gostar, mas no que os dados disseram que gostariam de assistir. O que fazia. 

O resultado foi imediato: os clientes visitaram o site da Netflix com mais frequência e assistiram a mais filmes. 

Faça a leitura fascinante deste livro que tem me influenciado nas decisões estratégicas que venho tomando recentemente nas empresas que dirijo.

Agora olho mais o que fazem do que dizem que fazem! 

*Aloisio Sotero é Mentor em Finanças e Matemática  Comercial. Estrategista em  Modelos de Negócios. Vice-diretor da Faculdade Central do Recife e membro associado do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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