Economia

Brasil vive 10ª recessão econômica de sua história. O que muda agora?

Especialistas apontam que das recessões já vividas, esta foi a mais abrupta para a economia brasileira. Como vamos sair dessa?

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O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou nesta terça-feira (1) o resultado para o PIB (Produto Interno Bruto) no segundo trimestre de 2020. A economia brasileira encolheu 9,7%, na comparação com o primeiro trimestre deste ano quando também houve retração de 1,5%. No primeiro semestre de 2020, acumulou queda de 5,9%.

Com isso, o Brasil entrou num processo conhecido como recessão técnica, que se caracteriza pelo acumulo de dois trimestres seguidos de desaceleração econômica.

Segundo a pesquisadora do FGV/IBRE, Juliana Trece, esta é a décima recessão econômica pela qual o Brasil já passou. Mas, sem dúvida, foi a queda mais abrupta já sofrida pela economia.

O mais próximo que o Brasil afundou foi a recessão dos anos 1980, quando a economia sofreu uma retração de 8,5%, entre 1981 e 1983. Depois desse período, outro grande baque do PIB brasileiro aconteceu no intervalo de 2014 a 2016, quando a economia retraiu 8%.

Recessão ou depressão?

Antes mesmo de o PIB do segundo trimestre sair, já era mais que esperado que o país voltaria a entrar em recessão técnica. No entanto, com uma queda tão abrupta, não há consenso entre os economistas se a economia permanece em recessão ou entra em depressão econômica.

Saiba mais: Recessão ou depressão: entenda o que cada uma significa

Para o economista e professor da Universidade Mackenzie, Agostinho Celso Pascalicchio, uma recessão implica em baixo crescimento econômico sem destruição da riqueza do país. Já a depressão econômica corroí a riqueza de uma nação e pode durar longos períodos. Alguns dos efeitos sentidos na depressão de uma economia são:

  1. Queda da produção industrial
  2. Aumento exponencial do desemprego
  3. Queda do consumo
  4. Fechamento de empresas

Pascalicchio acredita que, se a economia apresentar queda nos próximos trimestres, somado à piora dos indicadores sociais como desemprego e na capacidade de produção, o Brasil pode realmente estar perto de uma depressão econômica. Para o economista, já existem sinais que apontam para este caminho. Um deles é o desemprego elevado, que afeta 12,8 milhões de brasileiros. Outro é o fechamento de algumas empresas.

Embora o futuro da economia seja incerto, Pascalicchio defende que enquanto não houver uma rápida implantação de políticas de estímulo econômico no Brasil, o risco da depressão é iminente. “Nunca o Brasil esteve tão perto da depressão quanto hoje”, reforça.

Ele acrescenta que medidas como o programa Casa Verde Amarela, anunciado para substituir o Minha Casa, Minha Vida, ou o Renda Brasil, que deve ser implantado no lugar do Bolsa Família, são interessantes mas ainda não têm parâmetros adequados para garantir o crescimento econômico. “Precisamos estimular a construção civil, a distribuição de renda mínima. E isso precisa ser rápido”, explica Pascalicchio .

Embora ache improvável, Juliana Trece não descarta a possibilidade de uma depressão econômica mais para frente. Em sua visão, tudo vai depender do ritmo da retomada do terceiro e quarto trimestre e da redução da taxa de contágio da Covid-19. “Nossa economia voltou aos níveis de 2009, mais de uma década. A grande questão agora é como será a retomada”.

Para o professor de macroeconomia do Fipecafi, Silvio Paixão, o cenário não é tão complexo quanto parece e a recessão técnica é um fenômeno geral em todas as economias afetadas pela pandemia e não é consequência de erros nas políticas econômica e monetária.

Paixão esclarece que a economia brasileira já apresenta dois sintomas de depressão: o aumento do desemprego e a perda do poder de compra. Mas destaca que há uma visão errada na hora de avaliar, por meio de dados, o nível de emprego no Brasil. “É preciso olhar também o conceito de empregabilidade. Afinal, emprego não é apenas registro na carteira, existem muito MEI, PJ e trabalhadores autônomos que também estão trabalhando” explica.

Com base nessa disparidade, na hora de identificar quantos brasileiros desempregados existem, Paixão acredita que o desemprego atual ainda não é um prelúdio de depressão econômica. Ele defende que a queda do poder de compra não aconteceu apenas na pandemia e se trata de um problema que afeta o Brasil desde 2014, com renda per capita insuficiente.

Quais as consequências da crise?

Quais os impactos reais de uma recessão técnica para o bolso do brasileiro? Os especialistas enumeraram as principais consequências imediatas de uma contração do PIB por pelo menos dois trimestres consecutivos:

  • aumento do desemprego
  • diminuição da renda da população
  • queda do consumo
  • redução da atividade industrial
  • retração do setor de serviços

Em um período de recessão técnica, um dos setores que mais sofre é o de serviços, que é responsável por 70% do PIB brasileiro e maior concentrador de empregos. Por este forte impacto, o consumo dos brasileiros também recua.

Como vamos sair dessa?

Apesar da forte queda do PIB no primeiro semestre, Juliana aponta que os indicadores econômicos mostram uma leve recuperação nos meses de julho e agosto. Contudo, essa alta não foi suficiente para zerar as perdas concentradas nos meses de abril e maio.

Para a pesquisadora, o terceiro trimestre deve mostrar um ligeiro crescimento, mas que não se traduz em retomada por que a economia chegou a níveis muito baixos. “No terceiro e quatro trimestre, a economia ainda deve estar travada e, mesmo com o fim da pandemia, o Brasil enfrentará desafios diversos para recuperar a robustez”, explica Juliana.

Especialistas entrevistados pela reportagem enxergam diversas alternativas para o país sair desta recessão, mas todos convergem em um ponto: é preciso que o governo tenha urgência na adoção de medidas.

Para Juliana, o fortalecimento do setor industrial é um ponto-chave para a retomada econômica do Brasil, além de encontrar uma forma de alavancar o setor de serviços. “É importante considerar que os serviços representam um leque muito amplo: é comércio, transporte, alojamento, alimentação, entretenimento, é fundamental encontrar uma forma de estimular o consumo”, defende.

Silvio Paixão acredita que a saída é por meio de estímulos econômicos – que não seriam auxílio ou renda – e sim uma reformulação que se adeque ao novo jeito do consumidor, que poupa mais do que gasta durante a crise. Uma das alternativas para ele seria fazer com que os juros baixos cheguem a ponta do crédito, facilitando que pessoas e empresas negativadas pela crise possam voltar a gerar renda rapidamente. “O sistema financeiro adoeceu, está cobrando de pessoas físicas e jurídicas como se a economia estivesse em um momento saudável”, defende.

Paixão acredita que o Brasil deveria adotar uma espécie de Plano Marshall para a economia, utilizado na Europa após a Segunda Guerra. A comparação do programa Pró-Brasil ao plano pós-guerra já foi severamente criticada pelo ministro da economia, Paulo Guedes.

Já Pascalicchio propõe que o governo utilize uma política monetária mais solta, que facilite a injeção de recursos na economia para poder socorrer diversas empresas, mantendo a inflação baixa. “No curto prazo, flexibilizar a política monetária e no longo prazo fazer um ajuste na política tributária, a dívida pública e as metas industrias do Brasil”, sugere.

Enquanto o desemprego aumenta, Pascalicchio reforça a urgência de uma política de distribuição de renda que facilite o consumo e em consequência a melhoria no setor de serviços. “O Brasil precisa ser mais agressivo no programa Casa Verde Amarela, não apenas no Nordeste, e sim em todo território nacional. E fortalecer o agronegócio”, afirma.

Em quanto tempo a economia se recupera?

As projeções dos especialistas são unanimes: não devemos sair da recessão em 2020 e a economia brasileira não recupera seu brilho nos próximos três anos.

Segundo dados do FGV/IBRE, as recessões mais longas que o Brasil já experimentou na história foram de 11 trimestres, em média dois anos e meio. Um desses períodos foi do terceiro trimestre de 1989 ao quarto trimestre de 1992. E o outro foi do segundo trimestre de 2014 ao quarto trimestre de 2016.

Em contrapartida, após a última recessão forte que o Brasil viveu (2014/2016), tivemos 3 anos de expansão econômica (2017/2019). No entanto, o país não conseguiu recuperar neste período o potencial econômico que tinha antes da crise de 2014.

Com uma recessão mais severa em 2020, Juliana projeta que a retomada será mais longa ainda e dependerá das estratégias do governo para destravar a economia, fortalecer o ambiente de negócios e atrair investimento.

Para Paixão, a recessão técnica deve durar até junho ou julho de 2021. E só após este período, o Brasil deve engatinhar a recuperação econômica. Faltam, segundo os especialistas, medidas consistentes no pacote econômico que garantam uma retomada efetiva.

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