Economia

‘Pibinho’ de 2019: reformas lentas e crédito caro frustraram crescimento maior

Expansão foi a menor dos últimos três anos, enquanto bancos já reduziram projeções para 2020.

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O primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro desapontou aqueles que sonhavam com um crescimento econômico forte: o Produto Bruto Interno (PIB) cresceu 1,1% em 2019. Ganhou o apelido de “Pibinho”, por ter avançado menos que em 2017 e 2018 – anos da gestão do então presidente Michel Temer. O resultado foi o menor dos últimos três anos e frustrou expectativas de bancos e consultorias, que um ano atrás esperavam crescimento de 2%. O que deu errado?

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Para Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset, o crescimento de apenas 1,1% mostra que o governo perdeu muito tempo resolvendo questões políticas, o que frustrou muitos investidores que esperavam pelas reformas. “A aprovação da Previdência melhorou o cenário, mas com os problemas cambiais, o crescimento da economia ficou travado”, explica.

Walter Franco, professor de economia do Ibmec, afirma que o PIB de 2019 comprova que chegou a hora de o governo ganhar velocidade na aprovação das reformas, atração de investimento estrangeiro e investimentos na indústria. “Este crescimento de 1,1% aponta para pautas prioritárias que ainda não foram exploradas”, diz.

Ele chama atenção para o fraco desempenho dos setores da economia em 2019, que não superaram o crescimento de 2%. A exceção foi o avanço de 2,2% nos investimentos das empresas (FBCF), que impulsionam o capital produtivo. “Se apenas um setor cresce acima de 2%, precisamos medidas urgentes e um plano sólido de metas”, destaca.

Segundo o IBGE, do lado da oferta a indústria cresceu 0,5%, o agronegócio (1,3%) e os serviços (1,3%). Do lado da demanda, o consumo das famílias avançou 1,8%. Caíram os gastos do governo (-0,4%), importações (-1,1%) e exportações (-2,5%).  

Raio-X

Na economia brasileira, o principal fator de crescimento do PIB é o consumo das famílias, que teve seu pior resultado desde 2016, avançando apenas 1,8%. Vieira atribui este desempenho ao impacto dos indicadores de confiança no consumo e aponta que os juros baixos ainda não chegaram ao bolso do consumidor.

“Temos iniciativas para reduzir o spread bancário, aumentar a concorrência, mas os efeitos não foram sentidos pela população”, explica. Mesmo com a injeção de recursos no último trimestre [saques das contas do FGTS], o economista afirma que os recursos e o tempo foram insuficientes para auxiliar no crescimento efetivo do PIB. “Um trimestre não foi suficiente para virar o jogo. Os efeitos destas medidas seriam sentidos em 2020, mas com o coronavírus é inviável”.

Já Franco defende que o crescimento fraco no consumo familiar foi consequência de quatro fatores: a renda dos brasileiros não aumentou; a inflação é superior ao custo de vida e ao poder de compra das famílias; o endividamento ainda é alto e a queda dos juros não chegou aos lares brasileiros.

Ainda do lado da demanda, os gastos do governo fecharam em queda de 0,4%. Para os economistas esta queda significa que o governo está sem dinheiro para gastar ou investir, por causa dos custos elevados com aposentadorias, salários de funcionários públicos. “Este resultado coloca a reforma administrativa em pauta”, afirma Franco.

Vieira defende a necessidade de reformas e acrescenta que o Brasil precisa também encontrar saídas para o crescimento econômico no setor privado. “Para ter uma recuperação rápida, não podemos deixar tudo na mão do governo”.

Sensação térmica

Enquanto o setor de serviços puxou a alta do PIB, com crescimento de 1,3%, a indústria teve um tímido avanço de 0,5%. Para Franco, do Ibmec, a fraqueza do PIB é fruto de estratégias que não contemplaram o crescimento da indústria, entre elas a geração de empregos no serviços. “O Brasil passa por um problema sistêmico, em que a indústria sempre é deixada em segundo plano”.

André Rebelo, assessor para assuntos estratégicos da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), discorda e defende que a indústria brasileira está crescendo. Para ele, o baixo crescimento está relacionado aos impactos negativos na indústria automobilística no último trimestre de 2019.

Para Rebelo, os dados do PIB para o setor industrial são uma espécie de “sensação térmica”, onde o dado é pior do que a realidade. “A economia está crescendo, temos redução da taxa de juros, crescimento da indústria de construção civil, estamos bem melhor do que 0,5%”.  A Fiesp projeta um crescimento da indústria de 2% para 2020.

Revisões para baixo em 2020

Com o resultado do PIB de 2019 e o coronavírus no radar, o mercado começou a rever as expectativas de crescimento da economia para 2020. O banco Citi, que esperava um crescimento de 2%, reduziu a projeção do PIB em 2020 para 1,6%. Já o Santander mudou a sua estimativa para 1,7%.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, também destacou que o PIB de 2019 somado ao coronavírus aceleram no curto prazo a queda projeção de crescimento para este ano.

Segundo ele, a aprovação das reformas e uma boa gestão do governo podem mudar este cenário. Vieira lembra que é momento de manter a calma para evitar especulação. “O excesso de dúvidas e informação é o que muitas vezes joga o PIB para baixo”, defende o economista, que manteve sua estimativa para o PIB em 2,2%.

Apesar das revisões para baixo, o analista de investimentos da Easynvest. José Falcão, acredita que o cenário interno continua construtivo em 2020. “Todo ano teremos fatos que vão mudar as projeções e apesar dos impactos da crise relacionada ao coronavírus, os juros baixos, com o provável corte da Selic, devem dar algum fôlego para a economia brasileira”, diz.

Falcão acrescenta que há um cenário de expansão de crédito e gradual retomada do mercado de trabalho. “As reformas estruturais, apesar de conturbadas, continuam na pauta do Congresso, como a reforma tributária e administrativa, além do ajuste fiscal que será impactado pela reforma da Previdência e outras medidas de controle de gastos”, diz.

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