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Temores com a Light impactaram 69,5% dos fundos com exposição à empresa

Companhia de energia contratou consultoria para avaliação de estratégias financeiras, gerando preocupações com dívidas.

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O recente anúncio feito pela Light (LIGT3) de que contratou uma consultoria para assessorá-la gerou temores sobre a situação financeira da companhia e rumores de que poderia pedir recuperação judicial. Em meio a isso, 69,5% dos fundos com exposição direta em debêntures emitidas pela empresa tiveram perdas após o comunicado. No caso das debêntures da Light, todas tiveram queda de performance. É o que aponta levantamento feito pela Economatica, a pedido do InvestNews

No dia 31 de janeiro, a Light anunciou a contratação da Laplace Finanças com o objetivo principal de apresentar melhorias em sua estrutura de capital. A notícia gerou preocupação de investidores e impactou ativos da empresa. No dia seguinte, a ação da companhia caiu 10,14%.

Unidade de distribuidora de energia na Itália 21/01/2016 REUTERS/Stefano Rellandini

Já no início de fevereiro, houve o rebaixamento das notas de crédito da Light e suas subsidiárias pelas agências de rating Fitch (de ‘AA- para ‘CCC’), S&P (de ‘brAA+’ para ‘brA-’), Moody’s Global (de ‘Ba3’ para ‘B3’) e Moody’s Local (de AA- para B).

Recuperação judicial a caminho?

Em meio a este cenário, o colunista Lauro Jardim, do jornal “O Globo”, publicou que, com necessidade de financiamento de R$ 3,3 bilhões nos próximos dois anos, “a empresa deve dar entrada com um pedido de recuperação judicial muito em breve”. A Light, por sua vez, negou que estaria em vias de pedir recuperação. Mesmo após a negativa, o papel da companhia fechou o pregão do dia do comunicado com mais uma forte queda, de 13,55%.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) descartou essa possibilidade, afirmando que, até o momento de sua manifestação, verificava-se que a Light tem atendido aos critérios de eficiência na gestão econômico-financeira.

Com isso, a Light, que opera principalmente no segmento de distribuição de energia elétrica, sendo responsável pelo atendimento de toda a região metropolitana do Rio de Janeiro, ganhou os holofotes, impactando seus ativos negociados no mercado, como fundos de investimento e debêntures.

Impactos nos fundos

No levantamento feito pela Economatica, o período de análise considerado foi em 30 de janeiro, véspera do anúncio feito pela companhia da contratação da Laplace, e de 31 de janeiro, após a empresa confirmar a contratação, a 6 de fevereiro, quando ainda foi divulgada notícia que o pedido de recuperação judicial da empresa seria feito em breve.

Observando o desempenho dos 453 fundos totais expostos diretamente em Light no comparativo entre os períodos, 315 deles apresentaram queda na performance, ou seja, 69,5%, – e 42 deles perderam cotistas.

Crédito: Twenty20photos

Ricardo Espindola, gestor de crédito privado da Porto Asset Management, aponta que os principais riscos de fundos expostos a debêntures, como, por exemplo, as da Light, são o de crédito e o de liquidez. 

Espindola explica que fundos que investem em debêntures estão sujeitos à volatilidade em função da marcação a mercado dos ativos, além de risco de perda em casos extremos.

“Quando os investidores têm perdas, muitas vezes sentem-se inseguros e optam por resgatar seus investimentos. Nestes momentos, a liquidez do mercado tende a ficar mais baixa e, muitas vezes, sair não é a melhor opção”, orienta o gestor da Porto.

Debêntures prejudicadas

Observando o desempenho das 11 debêntures emitidas pela Light, todas caíram em performance quando se faz o comparativo do retorno de 31 de janeiro a 6 de fevereiro com 30 de janeiro. Confira:

NomeClasseCódigoRetorno (%)
em 30/1/23
Retorno em %
de 31/1/23
até 6/2/23
Light Serv de Eletr S/AEmis 09/Ser 02LSVE290,06-52,42
Light Serv de Eletr S/AEmis 15/Ser 01LIGHA50,14-41,97
Light Serv de Eletr S/AEmis 16/Ser 02LIGHB60,07-37,81
Light Serv de Eletr S/AEmis 16/Ser 03LIGHC60,04-42,81
Light Serv de Eletr S/AEmis 19/Ser uniLIGHA90,16-40,88
Light Serv de Eletr S/AEmis 20/Ser uniLIGHB00,17-40,14
Light Serv de Eletr S/AEmis 21/Ser uniLIGH1B0,03-42,82
Light Serv de Eletr S/AEmis 22/Ser uniLIGHD2-0,25-33,47
Light Serv de Eletr S/AEmis 23/Ser 01LIGHC30,08-41,66
Light Serv de Eletr S/AEmis 23/Ser 02LIGHD30,24-46,51
Light Serv de Eletr S/AEmis 24/Ser uniLIGHB40,00-38,49
Fonte: Economatica

Paulo Luives, economista da Valor Investimentos, afirma que, nesta modalidade de investimento, há o risco de crédito devido às condições de solvência da companhia, além da marcação a mercado.

Luives explica que, assim como em uma ação, quando a empresa reporta lucro maior ou menor que o esperado, há valorização ou desvalorização do ativo – e com as debêntures é semelhante. 

“Se uma empresa reporta um aumento de endividamento no resultado trimestral, isso vai atingir o valor de negociação da debênture. Eventualmente, o investidor querendo sair antes, fica sujeito às condições de mercado”, explica o economista.

Assim, de acordo com Luives, no caso de empresas como a Light, que reportou busca de melhoria na sua estrutura de capital, a marcação a mercado se torna bem forte, em meio aos receios de endividamento da companhia. “É muito complicado para o investidor pessoa física se expor a este tipo de ativo. Tem que ter um grau de estudo e conhecimento muito grande”, recomenda Luives.

Pedro Servidoni, líder na WIT Invest, destaca que, no caso da Light, trata-se de uma empresa que está sofrendo gravemente no seu balanço. Assim, é um risco maior o investidor comprar agora esse tipo de crédito.

“Precisa tomar cuidado, entender quais são os riscos. A Light depende de uma negociação na concessão para equalizar o seu fundo de caixa. Esse é o risco de investir em debêntures. A empresa pode ter o risco de não honrar os compromissos, por ter que renegociar as dívidas com os credores. Por isso, a importância de olhar caso a caso cada uma das empresas e selecionar bem quais quer investir”, alerta Servidoni.

Por que investidores ficaram preocupados?

As analistas Camila Dolle, Mayara Rodrigues e Natalia Moura, da XP, avaliaram em relatório que, ao contratar uma assessoria financeira, a Light acendeu um alerta para os investidores, uma vez que os receios que já estavam presentes em relação à renovação de sua concessão e desafios de rolagem relacionados tiveram um novo fator.

“Em nossa visão, a reação do mercado pode ter sido acentuada pelos acontecimentos recentes envolvendo a Americanas (AMER3), cujo caso elevou a percepção de risco dos investidores. Vale notar, no entanto, que as situações que levaram as duas empresas a serem mais acompanhadas recentemente não se assemelham de nenhuma maneira”, disseram as analistas.

Segundo Dolle, Rodrigues e Moura, os principais temas de acompanhamento continuam sendo o processo de negociação de renovação antecipada e a rolagem de dívidas da companhia. 

“O consenso no mercado é de que a Light precisa negociar com a Aneel a renovação antecipada da concessão, dando assim maior segurança aos acionistas e credores. No entanto, para que a renovação aconteça, entende-se ser prudente uma revisão no contrato e a criação de metas mais realistas de perdas, dada a área de concessão complexa”, disseram as analistas. 

De olho nos negócios da Light

Torres de transmissão de energia no Brasil. REUTERS/Paulo Whitaker (BRAZIL – Tags: ENERGY)

A analistas da XP explicam que a atuação da Light em termos geográficos é um dos pontos mais relevantes sobre a empresa, pois, devido às complexidades socioeconômicas do Rio de Janeiro, há um alto nível de perdas de energia na área de concessão da Light, que é uma das mais difíceis do país em termos operacionais, resultantes, principalmente, do elevado furto de energia e regiões marcadas por violência urbana.

“A companhia vem testando diferentes modelos de combate às perdas ao longo dos anos, incluindo modernização de medidores e trabalho junto às comunidades. Apesar de ter havido melhora marginal nos indicadores de perdas recentemente, não foi o suficiente para que a Light se adequasse aos padrões exigidos pela agência reguladora, a Aneel”, destacam as analistas da XP.

Dolle, Rodrigues e Moura lembram também que, além das perdas, que prejudicam a receita, houve aprovação por parte da Aneel para que a Light devolvesse créditos fiscais relacionados à cobrança indevida de PIS/COFINS dos consumidores finais.

“A companhia começou a devolver os créditos em 2021: R$ 374,2 milhões no reajuste de 2021 e de R$ 1,05 bilhão no reajuste de 2022. Ao final de dezembro de 2022, houve revisão tarifária extraordinária de -5,89%, relacionadas à devolução. Em 2023, há montante expressivo a ser ressarcido aos clientes. A devolução é realizada através de desconto nas tarifas, o que afeta diretamente o faturamento da Light”, alertam as analistas.

No terceiro trimestre de 2022, a companhia elétrica registrou um lucro líquido consolidado de R$ 7,9 milhões. O montante representa queda de 97,8% em relação ao mesmo intervalo de 2021.

Já a dívida líquida consolidada no final do terceiro trimestre de 2022 era de R$ 8,729 bilhões, 2,3% acima do registrado nos três meses imediatamente anteriores, quando totalizou R$ 8,536 bilhões.

Ponto de atenção

Luives, da Valor Investimentos, defende que o caso da Light, por exemplo, não gera temores sobre investimentos em debêntures em si, mas sinaliza muito o momento atual do mercado de crédito.

O economista explica que após a taxa de juroster saído de 2% para 13,75% ao ano, empresas com dívida pós-fixada viram um aumento substancial na sua estrutura de capital e, consequentemente, se tem em curso uma certa desaceleração econômica.

“Para empresas que não geravam muito caixa e já tinham endividamento elevado, com essa alta de juros, fica mais complicado fazer a rolagem da dívida e manutenção do serviço da dívida. Debênture continua sendo um investimento atrativo, a classe em si, mas é importante ser seletivo, pois o cenário macroeconômico tem sido complicado até para o mercado de crédito”, diz o economista.

Já para Servidoni, o caso da Light afeta toda a classe de ativos por causa do aumento de risco, pelo fato de ser mais uma empresa com algum tipo de problema e se reflete no segmento de atuação da companhia. 

“O investidor começa a olhar de uma forma mais atenta para o setor e também para os ativos de dívidas de empresas, pois é um caso de uma empresas que está tendo dificuldade com esses juros mais altos. E empresas terão que se financiar ou rolar as suas dívidas a um custo mais alto. Isso tende a ser um risco”, defende Servidoni.

Vale a pena investir em debêntures?

Para Luives, esta modalidade de investimento é válida por ser mais uma maneira que o investidor tem para acessar o mercado de crédito.

O economista alerta, no entanto, que, para o investidor que vai fazer alocação direta em debêntures, é importante ter diversificação e não alocar um percentual alto em um ativo específico, pois o risco é muito maior do que o de um fundo exposto a uma debênture.

“O fundo tem um grau alto de diversificação. A preocupação do gestor é pulverizar os ativos, pois, caso ocorra algum problema de crédito, o impacto no patrimônio do fundo vai ser menor”, diz Luives.

Espindola recomenda que, caso o investidor não tenha experiência com avaliação de empresas, a melhor saída é buscar informações, consultar especialistas ou fazer o investimento por meio de fundos. Para isso, o gestor da Porto lista algumas orientações antes de optar por investir em fundos com exposição a debêntures:

  • Ler com atenção todo o material de divulgação do fundo, considerando os detalhes sobre taxas cobradas, cotas, patrimônio, histórico de rentabilidade, etc.
  • Observar qual a categoria do fundo: se ele pertence a renda fixa, DI, multimercado ou outros. Vale verificar também se ele tem alguma ligação com crédito privado, o que possibilita a compra de até 100% da carteira neste segmento.
  •  Olhar o histórico do fundo e do gestor. Para isso, são importantes alguns questionamentos como: se é uma casa que tem experiência em gestão de fundos de crédito; como foi o desempenho o fundo em diversas crises e qual o histórico do fundo em janelas mais longas (acima de 2 anos).

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