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Magalu se inspira em Jeff Bezos em serviço de nuvem e relega modelo chinês

Varejista repete aposta da Amazon e deixa dúvidas sobre ‘super app’ com lançamento do Magalu Cloud.

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O Magazine Luiza (MGLU3) lançou esta semana seu próprio serviço de nuvem pública, o Magalu Cloud, que promete ser uma solução econômica para a digitalização de negócios, visando reduzir custos das empresas, em especial pequenas e médias (PMEs). Apesar da iniciativa inovadora para uma varejista brasileira, não é exatamente algo inédito no setor.

Aliás, há quem diga que a ideia, anunciada em evento na sede da empresa em São Paulo, foi inspirada na investida do bilionário Jeff Bezos anos atrás. Quem aqui se lembra da reação adversa do mercado financeiro à aposta arriscada da Amazon (AMZO34) em criar a AWS (Amazon Web Service), o serviço de cloud da gigante do comércio eletrônico?    

“CEO Jeff Bezos quer administrar seus negócios com a tecnologia web dele. Wall Street gostaria que ele se preocupasse apenas em ‘cuidar da lojinha’”, dizia reportagem de capa da edição de 13 de novembro de 2006 da revista Business Week

Reprodução

Quase 20 anos depois, pode-se dizer que foi essa aposta ousada de Bezos que fez a Amazon ser hoje considerada uma das ‘7 Magníficas’ de Nova York. Trata-se do nome dado ao seleto grupo de empresas norte-americanas de tecnologia que, juntas, representam quase 30% do valor de mercado do índice S&P 500.

Será que vai?

Com base nesse prognóstico, o risco é de os especialistas errarem novamente na avaliação, agora sobre a plataforma da Magalu, repetindo o erro da matéria escrita por Robert D. Hof. Embora qualquer semelhança com o serviço web da Amazon não seja mera coincidência, cabem algumas ressalvas.

Para o time do setor de consumo do Itaú BBA, a operação em nuvem do Magazine Luiza tem um potencial impulsionador para melhorar a rentabilidade da empresa, especialmente se conseguir lançar de fato a solução no mercado. Entre os desafios, portanto, está justamente superar a barreira de entrada, “atraindo, retendo e desenvolvendo talentos”.

Em uma postagem na rede social LinkedIn, o sócio da StarSe, Piero Franceschi, afirma que a principal dúvida é se esse movimento de entrada da varejista brasileira no mercado de nuvem é “ambidestria ou bipolaridade”. Ou seja, por um lado, ele avalia que se o Magazine Luiza não “tirasse um coelho novo da cartola”, a empresa iria continuar sofrendo.

https://www.linkedin.com/posts/piero-franceschi-xba-78892916_ser%C3%A1-que-vai-a-essa-altura-voc%C3%AA-j%C3%A1-deve-activity-7140304497955725312-muWZ?utm_source=share&utm_medium=member_desktop

Isso porque a empresa precisava buscar saída diante do cenário de juros ainda elevados no Brasil, retração nas vendas do varejo devido ao baixo consumo em meio ao endividamento da população, além da concorrência acirrada diante do domínio estrangeiro no e-commerce nacional. Tudo isso mantém as margens financeiras e operacionais pressionadas.

Por outro lado, Franceschi indaga se a investida com o Magalu Cloud não representaria uma falta de foco. Afinal, até então, a varejista vinha concentrando recursos e tecnologia no Super App, no qual a proposta é inspirada no modelo chinês, em especial na Alibaba, para oferecer as melhores ofertas e produtos, de forma rápida. 

China x EUA

As varejistas asiáticas exportaram para o Brasil esse modelo de e-commerce para dominar o mercado de comércio eletrônico no país. Em linhas gerais, tal proposta é oferecer uma variedade de produtos, que podem ser encontrados a preços baixos, e com entregas rápidas. Porém, acima de tudo, o diferencial dos marketplaces chineses está na experiência do usuário. 

Isso porque esses sites de compras acabaram se transformando em redes sociais próprias, nas quais os vendedores fazem vendas ao vivo durante uma live commerce e os consumidores são incentivados a postarem conteúdo próprio através de mini vlogs e vídeos curtos. Ou seja, criou-se uma cultura de streaming para apresentar as novidades. 

André Fatala, vice-presidente de tecnologia do Magalu, durante lançamento do Magalu Cloud. Foto: Olavo Martins Jr/Divulgação/Magalu

Enquanto isso, no Brasil, as plataformas tradicionais ainda seguem um modelo de vendas online menos interativo e, consequentemente, mais limitado. Portanto, estão firmes no conceito de e-commerce, que permite compra e venda pela internet em uma loja virtual, geralmente própria da marca, mas sem expandir para o modelo de um shopping virtual, onde várias lojas vendem produtos no mesmo lugar, em uma proposta mais participativa. 

Daí, então, o sócio da StarSe, pergunta, na rede social: “Não seria melhor focar toda a energia em consolidar a estratégia do ‘super app’ e fazer valer todo o ecossistema que montaram?”

Para o especialista, o principal risco é de a empresa investir em uma “frente nova e dar errado”. “Mais tempo e recursos desperdiçados?”, indaga. Segundo Franceschi, a inspiração em Jeff Bezos pode até representar uma tentativa do Magazine Luiza de repetir “parte daquele ‘ato salvador’”. 

Porém, ele lembra que o mercado de comércio eletrônico é muito mais competitivo atualmente. Por isso, a grande questão que a empresa brasileira tenta solucionar neste momento parece ser escolher a inspiração central e mover com mais assertividade. Trata-se, portanto, de uma decisão estratégica.

“Ou é o modelo chinês Alibaba super app ou então é o modelo da Mega Corp Ambidestra descentralizada Amazon. As duas coisas ao mesmo tempo, ninguém fez…Ainda mais carregando o ‘passivo’ de centenas de lojas físicas”.

Piero Franceschi, sócio da StarSe, em rede social.

Segundo dados apresentados pela McKinsey durante o evento do Magazine Luiza, o mercado de cloud deve atingir R$ 5 trilhões em 2025. Apenas no Brasil, o montante deve alcançar R$ 91 bilhões daqui a dois anos.

Ainda segundo a consultoria, Amazon e Microsoft são líderes nas três modalidades da atividade em nuvem: infraestrutura de máquinas virtuais, plataformas que permitem que pessoas usem seus aplicativos e os softwares como serviços. No Brasil, as duas gigantes, que operam há anos no país, oferecem valores em tabelas dolarizadas.

E é exatamente aí que o Magazine Luiza quer competir. “Com custos de equipamentos em moeda local e uma infraestrutura que cobre a maioria das necessidades das empresas, a empresa diz ser capaz de oferecer serviços 30% a 70% mais baratos que o oferecido no Brasil por players internacionais”, comenta o Itaú BBA, em relatório. 

A ver, então, se a empresa vai contrariar as previsões pessimistas após o lançamento da solução no mercado.

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