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Mais baratas, marcas próprias de supermercado podem beneficiar empresas na bolsa

Com inflação elevada, compra destes produtos cresceu; economia pode ser de até 40%.

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Em meio à inflação elevada no país, consumidores estão comprando cada vez mais produtos de marca própria nos supermercados, com preços mais acessíveis. Neste cenário, gigantes do varejo alimentar passaram a investir mais nestes itens, buscando a fidelização de clientes. Para especialistas consultados pelo InvestNews, este movimento pode beneficiar ações do setor, além de tornar as empresas mais competitivas.

Com o poder de compra cada vez menor, famílias gastaram 4,5% mais no mês de junho em relação a janeiro para levar 9% menos de produtos nos supermercados, segundo levantamento feito pela consultoria Horus com o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE). O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registra alta de 11,89% no acumulado de 12 meses até junho.

Com isso, a procura de brasileiros por produtos de marca própria cresceu. Segundo levantamento da consultoria GS Ciência do Consumo, o gasto médio de brasileiros com este segmento de produto foi 22,5% maior em janeiro de 2022, em relação a janeiro de 2019, período pré-pandemia.

Com preços, em média, até 30% mais baratos, redes de supermercados estão vendendo mais destes itens. No Carrefour Brasil (CRFB3), por exemplo, produtos de marca própria representaram um recorde de 19,7% das vendas líquidas totais de alimentos da companhia no primeiro trimestre de 2022. Já as marcas exclusivas do GPA (PCAR3) fecharam os primeiros três meses deste ano com 21,5% de participação nas vendas do GPA Brasil.

Regis Chinchila, analista da Terra Investimentos, explica que a medida é uma boa alternativa por parte dessas companhias de capital aberto para a sustentação de seus faturamentos em momentos econômicos como o atual, podendo, consequentemente, trazer ganhos e eles se refletirem no desempenho das ações.

De acordo com Fulvio Cristofoli, coordenador dos cursos de pós-graduação em gestão estratégica empresarial e gestão estratégica da Universidade Presbiteriana Mackenzie, para alguns varejistas, o lançamento de marca própria é resultado de uma estratégia de negócio essencial, no sentido de inovar e criar diferenciais e, consequentemente, fidelizar seus consumidores de forma a superarem seus concorrentes e para se manterem competitivas no mercado.

Marcas próprias nas prateleiras de cada empresa

GPA (Grupo Pão de Açúcar)

Produtos de marca própria do GPA. Crédito: Divulgação/GPA

Com seis marcas exclusivas em um portfólio de mais 5.600 produtos, que se dividem nos segmentos de higiene e limpeza, produtos para casa entre outros, o GPA pretende lançar 150 destes itens neste ano.

Segundo Eduardo Finelli, diretor de marcas exclusivas do GPA, o objetivo da companhia é oferecer uma alternativa de compra de mercadorias com qualidade e preços competitivos no segmento de cada um delas, o que acaba contribuindo para a fidelização destes clientes. 

“Com produtos de marca própria, a taxa de recompra é de 61,5%. Em 2021, pelo menos um desses produtos fez parte da lista de compras dos consumidores fiéis às marcas Pão de Açúcar e Mercado Extra”, disse Finelli em entrevista ao InvestNews.

O executivo explica ainda que outro ponto importante na estratégia de posicionamento dos produtos de marcas exclusivas do GPA é que a oferta e o sortimento são definidos de acordo com o posicionamento de marca dos diferentes modelos de negócio do GPA, bem como o acompanhamento do comportamento de compra dos consumidores.

Carrefour

Produtos de marca exclusiva em loja da Carrefour. Crédito: Divulgação/Carrefour

Atualmente, o Carrefour conta com 3.200 produtos de marcas próprias, em sua maioria no segmento alimentar, com vendas que representam um quinto do faturamento da companhia. 

Allan Gate, diretor de marcas próprias do Carrefour, explica que o principal objetivo da empresa com estes produtos é a diferenciação em relação à concorrência, através da qualidade e custo baixo, e fidelização do cliente. 

“Todos os produtos que a gente lança, olhamos a qualidade do líder da categoria. O preço de venda para o consumidor tem que fazer a relação custo-benefício para, de fato, fazer essa troca. Mas só será uma troca quando o consumidor comprar pelo preço e entender que a qualidade recebida é tão boa ou melhor que o líder”, explicou Gate em entrevista ao InvestNews.

Os lançamentos destes itens pelo Carrefour têm sido de cerca de 450 por ano, com produtos que chegam a custar de 25% a 30% menos que os de marcas líderes de venda.

De acordo com Gate, a intenção da empresa é aumentar a “família” de produtos de marcas próprias e fazer com que o consumidor compre esses itens em todas as categorias, independentemente da renda.

O executivo afirma ainda que os clientes do Carrefour com maior gasto médio nas lojas possuem maior percentual de marcas próprias da empresa em sua cesta. “Fica claro que a marca própria fideliza. O cliente que gasta muito mais nela, a gente vê que ele gasta seis vezes mais, em média, do que aquele que não consome marca própria”, diz Gate.

Preços mais baratos, fôlego para as empresas

Cristofoli explica que, geralmente, as marcas próprias são de 5% a 40% mais baratas que as marcas tradicionalmente conhecidas. De acordo com o coordenador dos cursos de pós-graduação em gestão estratégica empresarial e gestão estratégica do Mackenzie, os principais motivos para são os possíveis baixos custos comerciais, pois os produtos são confeccionados e vendidos entre o detentor da marca própria e os fornecedores.

A outra economia, segundo o professor, está no marketing, uma vez que as marcas líderes de mercado investem até 30%, o que não ocorre com marcas próprias.

Matheus Jaconeli, analista da Nova Futura Investimentos, explica que, dentro do varejo, o setor já é o que possui menor elasticidade em fornecer produtos com menor preço. Assim, com as marcas próprias, pode atrair consumidores devido à alta da inflação.

Segundo Jaconeli, produtos que o consumidor evitaria comprar por causa da pressão na renda disponível já entra na possibilidade dele, uma vez que a marca própria atuará como um bem substituto, a um custo mais baixo, sendo uma alternativa para empresa de manutenção ou redução de impactos na receita e, consequentemente, nas suas margens.

Importância dos produtos de marcas próprias

Cristofoli explica que a presença de marcas próprias por parte do varejo já era uma tendência percebida no mercado mesmo antes do aumento da inflação ou até mesmo antes da pandemia e que não se trata de um movimento passageiro.

Segundo ele, no contexto comercial, uma marca própria tem o objetivo principal de promover e consolidar um produto em específico, de modo que o consumidor possa reconhecê-lo diante dos seus concorrentes, levando ao aumento da lucratividade por parte da empresa.

“Trata-se de uma estratégia corporativa e, entre os diversos fatores que justificam o investimento em uma marca própria, o principal deles está relacionado à rentabilidade, pois ela tende a aumentar, devido a inexistência de intermediários no processo de compra dos produtos”, destaca o coordenador dos cursos de pós-graduação em gestão estratégica empresarial e gestão estratégica do Mackenzie.

Cristofoli aponta também que, apesar de produtos de marcas próprias serem tidos como de menor qualidade, a importância da qualidade não pode ser apenas vista como um diferencial, mas, sim, como uma das únicas formas de se manter competitivo no mercado.

“Diante de um mundo globalizado, onde as barreiras socioeconômicas estão diminuindo a cada ano, clientes estão buscando produtos e serviços com qualidade e as empresas têm que se adequar, eliminando atividades que não agregam valor, oferecendo produtos com qualidade e preço reduzido”, defende.

Para o coordenador dos cursos de pós-graduação em gestão estratégica empresarial e gestão estratégica do Mackenzie, um desafio atual do varejo é a sustentabilidade, ou seja, desenvolver produtos que, além de diferenciados, estejam alinhados com a preservação do meio ambiente e responsabilidade social.

Chinchila afirma que empresas que não adotam essa possibilidade de negócio sofrem com a perda de competitividade. Segundo o analista da Terra Investimentos, é plausível que aqueles que queiram se manter competitivos sigam o mesmo caminho.

Impactos para as ações e desafios

Regis Chinchila, analista da Terra Investimentos, explica que a redução de custos proveniente desse modelo de negócio permite oferecer produtos com menores preços, podendo se traduzir em resultados melhores e uma fatia de mercado maior, duas métricas de grande importância para o desempenho de uma empresa da bolsa e, consequentemente, seus ativos.

Jaconelli também defende que a disponibilidade de produtos de marcas próprias pelo varejo alimentar pode chegar a se refletir no desempenho das ações pois, segundo ele, nas prévias operacionais, as expectativas serão positivas em termos e isso será atrelado ao preço do ativo. 

“A inflação mais elevada afetará consideravelmente tais companhias e, em momento desafiador em termos de crescimento e inflação, podem perder mercado para os concorrentes”, diz o analista da Nova Futura Investimentos.

Todavia, segundo Jaconelli, a inflação é um limitador de ganhos, dado que ela é uma variável que pressiona as margens das companhias.

Rodrigo Crespi, analista da Guide Investimentos, também faz um alerta de que, apesar do avanço, ainda trata-se de um mercado incipiente em nível nacional, com potencial para crescer e ser explorado. Para o analista, as empresas ainda precisam fazer a parte educacional de suas marcas próprias, já que esses produtos, há alguns anos, eram vistos com qualidade inferior.

“Falta essa parte educacional, para mostrar que o produto consegue ter uma qualidade similar aos de marca de terceiros, mas com preço mais acessível”, aponta o analista da Guide Investimentos.

Fidelização de clientes além do preço

O Dia, rede de supermercados focada em preços mais acessíveis, começou a investir em 2019 em nomes divertidos para seus produtos como forma de construção do novo posicionamento da marca própria e passou a usar identificações como My Oh Nese!, Pó Pô Pó, Takum Sede, Vem quente que tô Fermento, Arroz Sim, Feijão Também, Mó de Broa, Amigo de Milho, Tô Pets, Me Polpa, Rock na Aveia, Alibabei, Alegrão, Mil e Uma Nuts, Adios Mofito, Me Chama pro Churras, entre outras.

“Queríamos que nossas embalagens transmitissem a transformação do nosso projeto, focado em muito mais qualidade e preço competitivo para as marcas próprias. O humor, a irreverência e os memes já fazem parte do dia a dia e do comportamento brasileiro, por isso, imaginamos que esses nomes se encaixariam perfeitamente no nosso mercado”, informou o Dia ao InvestNews.

Segundo a rede de supermercados, a escolha dos nomes influenciou no aumento de venda dos produtos, pois nomes irreverentes cumprem o papel de aproximar os consumidores dos produtos e gerar experimentação.

“No varejo, a embalagem é o primeiro ponto de contato com o consumidor e é ali, na gôndola, que, em uma fração de segundos, temos que nos destacar e ganhar atenção do consumidor. Após esta conquista, a qualidade e o preço acabam fidelizando o cliente”, explica o Dia.

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