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Petrobras completa 70 anos com desafio de tornar-se empresa de energia

Criada em 1953 com lema ‘petróleo é nosso’, estatal agora foca em transição, com slogan ‘Brasil é nossa energia’.

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A Petrobras (PETR3; PETR4) completa nesta terça-feira (3) 70 anos. A empresa foi criada em 3 de outubro de 1953, quando o então presidente Getúlio Vargas decretou a lei nº 2004, que dispunha sobre a política nacional do petróleo

Mais de meio século depois da campanha que ficou famosa pelo lema “O petróleo é nosso”, a estatal enfrenta agora o desafio de deixar de ser uma petrolífera para se tornar uma empresa de energia. Trata-se de um movimento global, liderado pelas potências do petróleo no Golfo Pérsico.

Amostra de diesel R5. (Foto: Divulgação/Agência Petrobras)

Isso porque as maiores produtoras globais de combustíveis fósseis estão cada vez mais se dando conta da necessidade de tornar seus negócios menos poluentes. Para tanto, essas empresas estão investindo em energia limpa, diante do compromisso dos países em reduzir as emissões de carbono até meados do século XXI,  em meio às mudanças climáticas. 

Assim, depois de passar o período entre 2016 e 2022 com foco na exploração e produção de petróleo, a Petrobras definiu, sob nova direção, que a entrada no segmento de energias renováveis é uma questão estratégica. Tanto que, recentemente, a empresa assinou acordos para estudos e projetos na área, entre eles com a Weg (WEGE3). 

O Brasil e a energia

Para celebrar seus 70 anos, a campanha publicitária da Petrobras buscou destacar a importância da empresa em ser protagonista no movimento de transição energética. Com o slogan “O Brasil é a nossa energia”, o material é veiculado desde agosto, sendo que nesta semana do aniversário será divulgado um filme comemorativo.

No release de divulgação da campanha, o presidente da estatal, Jean Paul Prates, afirma que a Petrobras precisa ser uma empresa diversificada e integrada, de modo a garantir a energia que o Brasil precisa para continuar crescendo. Isso porque a energia é fundamental para garantir o desenvolvimento econômico e a retomada da atividade.

“Pode parecer contraditório, mas é fundamental ter energia mais barata para promover a retomada do desenvolvimento e que vai propiciar inclusive o investimento e as iniciativas de industrialização”, comentou o ex-diretor de exploração e produção da Petrobras Guilherme Estrella, em entrevista ao Canal Contramola em março deste ano.

Porém nem todos pensam assim. Alguns especialistas alegam que a Petrobras deveria focar em óleo e gás. Afinal, trata-se do core business da empresa, como defende Adriano Pires, especialista no setor e presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). Também para Ilan Arbetman, da Ativa Investimentos, esta seria a melhor forma de rentabilizar o investidor.  

Por isso, as dúvidas que surgem em relação à decisão da Petrobras em um momento em que o barril do petróleo é negociado nas máximas do ano e caminha para a marca de US$ 100 são baseadas no ponto de vista da alocação financeira de curto prazo. Afinal, as gigantes do Golfo não foram questionadas quando decidiram apostar em energia limpa.

Novas energias

Ao contrário, o rumo tecnológico e estratégico escolhido pelas maiores empresas de energia do mundo foi seguido por suas equivalentes estatais de outros países. É o caso da ADNOC, dos Emirados Árabes Unidos, e da Saudi Aramco, da Arábia Saudita, que se tornaram exemplo no mundo árabe, colosso das reservas naturais de hidrocarbonetos. 

Isso aconteceu porque a abordagem dessas empresas se apoia em dois pilares. O primeiro não é nada ecológico, pois envolve justamente investir pesado para expandir a produção de petróleo e gás natural até o fim desta década. Já o segundo pilar envolve o investimento de parte do lucro nas tecnologias de energia limpa, como o hidrogênio e a amônia “verde”.

REUTERS/Jamil Bittar

A analista da S&P Global, Mariam Al-Shamma, explica que essa estratégia sugere que as gigantes do Golfo não estão ignorando a demanda por petróleo no futuro próximo. Ao mesmo tempo, estão cientes da intenção dos maiores consumidores mundiais, como a China, em limitar e até zerar as emissões de carbono no médio prazo. 

Assim, essas empresas também pretendem ser os produtores mais limpos de combustíveis não-fósseis. “Com isso, os imensos investimentos na produção de energia limpa podem compensar mesmo se a demanda global por petróleo cair nos próximos anos”, explicou Al-Shamma, em relatório publicado no fim de 2022 e citado pela revista The Economist.

Para o chefe de economia climática da Capital Economics, David Oxley, é improvável que o investimento na transição verde cresça de forma rápida nesta década para ajudar a atingir a neutralidade de carbono até 2050. “No entanto, o foco maior em energias renováveis aumentará a participação do investimento no PIB global em até 1% até 2029”, prevê.

Questão de sobrevivência

Portanto, o movimento da Petrobras é uma questão de longevidade, à medida que o mundo caminha em direção ao desenvolvimento sustentável. Esse percurso, aliás, é feito através de veículos elétricos, com a corrida para descarbonizar as economias tendo na indústria automotiva um fator-chave nesse esforço e deixando para trás os motores a combustão. 

“O fato de os VEs serem uma indústria nova, sem um operador global de longa data, ajudou claramente a China a dar um salto neste mercado, em oposição ao progresso muito mais lento dos automóveis movidos por gasolina ou diesel”, afirma a economista-chefe da Ásia Pacífico do Natixis, Alicia Garcia Herrero, em artigo.

Assim, o que a Petrobras a busca ao deixar a marca de que “o petróleo o nosso” e tornar-se a “energia do Brasil” é prolongar seus anos de vida, rumo ao primeiro centenário em um mundo que, talvez, daqui a 30 anos não seja mais dependente do petróleo – mas que, sem dúvida, continuará demandando energia. 

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