EUA rumam para o capitalismo ao estilo chinês
Em nome da segurança nacional, a política vem antes dos lucros
[Publicado originalmente em 21 de março]
Quem decide se o TikTok permanece chinês, se será proibido ou se será vendido? Washington. Quem determina se uma empresa americana ou japonesa pode comprar a United States Steel? Washington. Quem está dando à Intel US$ 8,5 bilhões para fabricar semicondutores nos EUA? Você entendeu a mensagem.
Nos EUA, as decisões de negócios, antes tomadas pela diretoria ou em reuniões de acionistas, dependem cada vez mais da política. O país não está descambando para o socialismo, onde o governo controla os meios de produção; porém, pode estar se inclinando para o capitalismo de Estado, no qual o governo intervém regularmente nos negócios para garantir que atendam ao interesse nacional.
O problema, como exemplificado tanto no TikTok quanto na U.S. Steel, é que o interesse nacional está constantemente sendo redefinido para se adequar às prioridades políticas do dia.
Embora os Estados Unidos nunca tenham sido um paraíso do laissez-faire, mais do que outros países os EUA acreditaram no capitalismo de livre mercado e deixaram que a eficiência e os lucros determinassem a alocação de capital.
Nem Donald Trump nem o presidente Biden acreditam nisso. Ambos estão felizes em usar todas as vantagens do governo federal, sejam impostos, subsídios, regulamentações ou discursos ousados, para moldar as decisões empresariais de acordo com sua própria visão do interesse nacional.
Quando a Câmara dos Representantes votou para forçar a venda ou proibição do TikTok, aplicativo de vídeos de propriedade da ByteDance, com sede em Pequim, o Ministério do Comércio da China exigiu, segundo a agência estatal de notícias Xinhua, que os EUA “respeitem a economia de mercado e o princípio da livre concorrência e proporcionem um ambiente aberto, justo e não discriminatório para empresas de todos os países”.
Ou a ironia desapareceu, ou o Partido Comunista Chinês tem um senso de humor subversivo. Todo seu modelo econômico gira em torno do desrespeito seletivo aos princípios da economia de mercado e da concorrência leal, especialmente através da discriminação sistemática de empresas estrangeiras. O capitalismo de Estado da China moldou o cenário internacional, o que forçou outros, incluindo os EUA, a adotarem suas próprias versões de capitalismo de Estado.
Trump foi um dos primeiros convertidos ao capitalismo de Estado, embora um tipo mais pessoal. Ele pediu a uma empresa que mantivesse uma fábrica aberta em vez de transferi-la para o México. Usou a política comercial para punir concorrentes estrangeiros e favorecer empresas americanas.
A pedido da Boeing, o Departamento de Comércio de Trump impôs tarifas pesadas à canadense Bombardier. Isso forçou a empresa canadense a vender o controle de um novo jato regional, cuja produção acabou sendo transferida do Canadá para o Alabama.
Alegando que os militares dos EUA precisavam de uma fonte doméstica de aço, Trump impôs tarifas sobre as importações do metal de aliados militares. Em 2020, tentou forçar a venda do TikTok para investidores americanos, sem sucesso.
Trump decidiu agora que a propriedade chinesa do TikTok é menos uma ameaça para o público do que o Facebook, que suspendeu a conta do ex-presidente na rede social após o ataque ao Capitólio em seis de janeiro de 2021. No início deste mês, ele se manifestou contra o banimento do TikTok, o que instantaneamente enfraqueceu o apoio republicano a uma venda ou proibição, mesmo tendo suavizado a afirmação mais tarde.
Biden tem uma versão menos pessoal e mais refinada do capitalismo de Estado com dois objetivos declarados: promover a manufatura doméstica e a energia verde e salvaguardar a segurança nacional restringindo a exportação de tecnologia e conhecimento sensíveis.
Na prática, isso acaba sendo a mesma coisa. Quando cada microchip tem uma aplicação militar e civil e os bancos de dados podem se tornar um canal de influência estrangeira, então até mesmo os guindastes estão no jogo.
E quando, na semana passada, Biden declarou sua oposição à proposta de compra da United States Steel, com sede em Pittsburgh, pela gigante siderúrgica japonesa Nippon Steel, mostrou que sua versão do capitalismo de Estado pode ser tão pessoal, política e, em última análise, contraproducente quanto a de Trump.
Biden disse que a U.S. Steel deve permanecer em mãos americanas. Mas por quê?
O dinheiro da Nippon, o relacionamento próximo com as montadoras japonesas e a experiência em fazer o aço fino especializado para motores de veículos elétricos fortaleceriam a U.S. Steel. Um contraponto nipo-americano aos gigantes chineses estaria de acordo com a visão de cooperação entre as democracias de mercado defendida por Biden.
Mas o United Steelworkers (sindicato de metalúrgicos) não acreditou no compromisso da Nippon Steel com suas fábricas sindicalizadas e se declarou contra [a aquisição pelo grupo japonês]. O mesmo aconteceu com senadores dos estados de Ohio e Pensilvânia, além de Trump. Com medo de perder eleitores da Pensilvânia, Biden se juntou a eles. Na quarta-feira, recebeu o apoio do United Steelworkers.
A oposição de Biden aumentou a probabilidade de a U.S. Steel ser comprada por menor preço pela siderúrgica Cleveland-Cliffs, com sede em Ohio, que foi superada no ano passado pela Nippon Steel. Isso minou outra prioridade de Biden, impedindo a concentração de corporações, já que essa combinação dominaria alguns mercados.
Não estamos na China, e nem Trump nem Biden podem simplesmente impor suas preferências às empresas. Mas a expectativa de que tentarão muda o comportamento corporativo.
O investimento não é feito visando um bom retorno, mas a conveniência política. Os executivos evitam dizer qualquer coisa que possa ofender quem está no poder. A linha entre o capitalismo de Estado e o capitalismo de favoritismo fica indefinida quando as empresas buscam derrotar seus concorrentes nos corredores do poder e não do mercado.
Ao perder nas negociações, a Cleveland-Cliffs decidiu acabar com a candidatura da Nippon Steel trabalhando com sindicatos e políticos. Ela também trouxe para seu conselho Ron Bloom, que já havia trabalhado para o United Steelworkers e no governo Obama.
Qualquer comprador do TikTok presumivelmente terá de ser aceitável para um futuro governo Trump. Portanto, não é surpresa que o ex-secretário do Tesouro de Trump, Steven Mnuchin, tenha dito na semana passada que estava planejando uma oferta.
Como escreveu Bill Bishop em sua newsletter sobre a China, “mesmo que tentasse, não conseguiria escrever um enredo melhor para o Ministério da Propaganda”.
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traduzido do inglês por investnews