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Retirada do ovário pode causar demência? Entenda a discussão

A remoção dos ovários com a histerectomia pode aumentar o risco de doença cardíaca, acidente vascular cerebral e demência

Por Sumathi Reddy The wall street Journal
Publicado em
6 min
traduzido do inglês por investnews

Recentemente, uma leitora me fez uma pergunta importante: as mulheres que tiveram os ovários removidos durante uma histerectomia têm maior propensão à demência?

Para essa leitora, como para milhões de americanas mais velhas, a questão ressoou. Várias mulheres em seu círculo desenvolveram demência mais tarde na vida, e o número de pessoas com doença de Alzheimer e outras formas de demência está aumentando.

Embora a menopausa e a saúde da mulher estejam recebendo mais atenção de médicos e pesquisadores depois de serem subestudadas por décadas, a questão da histerectomia permanece particularmente difícil.

Fiz algumas pesquisas e aqui está a má notícia: mulheres com menos de 50 anos cuja histerectomia envolveu a remoção não só do útero, mas também a dos ovários — provocando a menopausa cirúrgica — enfrentam maior risco de inúmeros problemas de saúde, incluindo doenças cardíacas, derrame e demência.

Agora, a boa notícia: mais mulheres estão mantendo os ovários após a histerectomia, revertendo uma prática médica de longa data.

Contudo, alguns médicos e pesquisadores dizem que é provável que haja muitas mulheres passando pela remoção de ovários sem necessidade. Os médicos afirmam que as únicas que devem se submeter a uma ooforectomia são aquelas que apresentam câncer de ovário, ou um alto risco da doença, que afeta cerca de 1% da população feminina. 

Aquelas com dor de endometriose, que não consegue ser controlada de outras maneiras, também podem optar por ter os ovários removidos, mas a opinião dos especialistas fica dividida.

A remoção dos ovários antes da menopausa e antes dos 46 anos pode causar uma aceleração dos processos de envelhecimento em muitos órgãos, como por exemplo, o cérebro, e em muitos tecidos do corpo, como os ossos”, diz o dr. Walter Rocca, professor de epidemiologia e neurologia na Clínica Mayo em Rochester, em Minnesota, e autor de estudos sobre o tema.

Saúde mais precária

Não há estudos recentes nem bancos de dados nacionais sobre a porcentagem de histerectomias que incluíram uma ooforectomia bilateral, remoção de ambos os ovários, de acordo com médicos e com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC). A remoção era uma prática padrão há décadas, até 2008.

Naquele ano, o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG) recomendou a manutenção de ambos os ovários em mulheres na pré-menopausa que apresentassem risco de câncer de ovário. No entanto, a migração da recomendação para a prática clínica é lenta e variada, afirma Rocca. 

“É preciso tempo para que as evidências científicas se traduzam em mudanças na prática clínica”, diz. “Os ginecologistas podem resistir a mudanças na prática por causa de sua formação, suas preferências e crenças, e por causa de incentivos financeiros.”

Um estudo de 2013 na revista “Obstetrics and Gynecology” descobriu que, entre mais de 750 mil mulheres, cerca de 46% removeram os ovários no momento da histerectomia, enquanto 54% não o fizeram. Mesmo as mulheres na pré-menopausa que preservaram os ovários durante a histerectomia correm maior risco de demência e doenças cardíacas, mas esses números são menores, de acordo com vários estudos.

Os riscos para a saúde associados à remoção dos ovários são significativos.

Rocca foi coautor de um estudo da “Jama Network Open” de 2021 que mostrou que mulheres com menos de 46 anos que removeram ambos os ovários com ou sem histerectomia apresentavam um risco aumentado de comprometimento cognitivo leve e um pior desempenho em testes cognitivos 30 anos depois, em comparação com as que não se submeteram ao procedimento.

Outro estudo que Rocca coescreveu descobriu que aquelas que removeram os ovários antes dos 50 anos enfrentaram riscos mais altos de várias condições anos depois, incluindo doenças cardíacas e osteoporose.

Outros estudos associaram os procedimentos a um risco aumentado de demência, doença de Parkinson e envelhecimento acelerado.

Às vezes, as pacientes querem remover os ovários em uma idade mais jovem para tratar sintomas como dor pélvica ou para evitar uma cirurgia subsequente, diz o dr. Daniel Breitkopf, presidente de Ginecologia e Obstetrícia na Clínica Mayo e membro do conselho de administração do ACOG. Ele costuma aconselhar a espera.

“Prefiro fazer uma ooforectomia cinco ou dez anos depois, para termos de cinco a dez anos de benefício desses ovários na saúde”, diz. 

A dra. Rebecca Rogers, presidente do departamento de ginecologia e obstetrícia do Centro Médico Albany e secretária-tesoureira da Sociedade de Cirurgiões Ginecológicos, diz que há algum debate sobre a idade propícia para o procedimento, 50 ou 65 anos.

“Para as pacientes muito jovens, é claro que a remoção dos ovários as leva diretamente para a menopausa e as coloca em risco de todas as coisas que acontecem nesse processo”, afirma ela.

A orientação

Há evidências de que a terapia de reposição de estrogênio pode atenuar os efeitos nocivos da remoção dos ovários e do início prematuro da menopausa, segundo Rocca. Essas evidências, no entanto, não são conclusivas, acrescenta.

Lisa Mosconi, professora associada do departamento de neurologia da Weill Cornell Medicine, onde também é diretora do Programa de Prevenção do Alzheimer e da Women’s Brain Initiative, diz que recebeu muitos e-mails de mulheres alarmadas, porque não sabiam dos riscos potenciais da remoção dos ovários na histerectomia. 

Muitas delas fizeram a cirurgia quando era rotina também retirar os ovários. 

“Há mulheres na faixa dos 60 e 70 anos que estão bastante chocadas, em uma análise retrospectiva”, diz ela. “Por ser uma cirurgia simplificada e por reduzir significativamente o risco de câncer de ovário, muitas delas apenas disseram: ‘Claro!’.”

Escreva para Sumathi Reddy em [email protected]

traduzido do inglês por investnews